segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Livro: o que é?

     Segundo Alaôr Caffé Alves (Dialética e Direito, Barueri, SP, Manole, 2010, p.20), "[...] a linguagem não expressa essências preexistentes, metafísicas, mas contribui para a formação dos sentidos linguísticos, em razão do uso que dela se faz em uma comunidade linguística.". Nesse sentido, espera-se que todo aquele que desempenha alguma atividade domine os conceitos das ferramentas, utensílios e suportes da própria atividade. É assim que José Afonso da Silva (Teoria do Conhecimento, São Paulo, Malheiros Editores, 2014, p.27/9), inicia a divulgação do resultado da pesquisa encetada. "l.l. A questão. 1. Tenho em mãos cinco objetos em forma daquilo que o conhecimento denomina "livro". Esses "livros" estão encadernados sob os títulos: (l) Constituição da República Federativa do Brasil; [...]. Os títulos, nas respectivas Línguas, correspondem, na tradução portuguesa, ao de uma constituição do respectivo Estado: Constituição da República Federativa do Brasil, [...]. Assim se poderia repetir com vários outros "livros" com o mesmo formato: [...] - volumes que se compram nas livrarias, como se compra qualquer livro. 2. O primeiro problema que se nos antepõe é o de distinguir entre constituição e livro. A questão é que o livro tem sua própria constituição - ou seja: o livro é constituído de certa maneira. Isso até ajuda, porque compreende o livro - e aqui o artigo definido revela o sentido geral do termo: livro, como um objeto de conhecimento. E é evidente que o sentido comum de "livro", que os dicionários dão, não serve para fazer a distinção que procuramos. De fato, os dicionários comuns conceituam "livro" como a reunião de folhas ou cadernos, soltos, cosidos (costurados) ou por qualquer outra forma presos por um dos lados e enfeixados ou montados em capa flexível ou rígida (...). Essa noção se aplica aos volumes de constituição que tenho em mãos, que se apresentam exatamente daquele modo. Outra noção é a de que o livro é obra literária em prosa ou verso com a precisa extensão para formar um volume (...). Aqui já encontramos um elemento capaz de mostrar que os referidos volumes com nome de "constituição" certamente não são de obra literária. Mas também se pode argumentar que há livros que não são de obra literária: as obras científicas, incluindo as obras jurídicas. O grande problema desse tipo de noção conceitual é que fica sempre uma petição de princípio: o livro é uma obra - o que põe a questão de que, para saber o que é livro, é preciso primeiramente saber o que é obra. "Obra" é o resultado do obrar, do fazer, do realizar. Então, pode-se aceitar a ideia de que obra é o resultado permanente do trabalho ou da ação humana, ou, simplesmente, é uma produção do espírito. A isso se chama de obra de engenho. O livro é uma obra de engenho que tem como conteúdo o resultado de uma pesquisa do novo nas várias ciências e artes e se apresenta em forma de texto escrito em folhas envoltas em capas. Ora, qualquer pesquisa do novo só será considerada livro se tiver essas características. Não antes disso. O livro, portanto, nasce com a conjugação de certo conteúdo com aquela forma. Aqueles volumes de que falamos no início não têm essas características. Embora se apresentem em forma de livro, não tem conteúdo de livro, porque não constituem o resultado de uma pesquisa científica nem artística. 3. Isso nada nos diz sobre a constituição. Só nos diz que ela não se confunde com esse objeto chamado livro. Nem sequer nos informa que a constituição possa ser objeto de conhecimento, não sabemos se é possível conhecê-la.1.2. Dúvida e redução fenomenológica. 4. A dúvida com que o tópico anterior foi terminado talvez possa ser satisfeita com a afirmativa de que o fato mesmo de falar em constituição pressupõe sua existência e indica a consciência desse objeto. Temos a intencionalidade desse objeto (...). Mas essa mesma intencionalidade é problemática, porque esse objeto nunca é dado materialmente à nossa intuição. "Intuição", ainda no sentido fenomenológico, de ter o objeto presente para nós. Em que sentido temos, pois, consciência do objeto "constituição" se ele não se presenta a nós? Temos aí, então, uma intencionalidade vazia, que é aquela que se dá com a "ausência" do objeto. [...]". E quando se fala em forma, neste ambiente, esclarece Alaôr Caffé Alves (ob. cit. p.24): "Nem essa forma - forma não é desenho, não é fôrma, é relação, é inter-relação de elementos, é estruturalidade dinâmica - subsistiria como tel sem o apoio de outros processos reais.". Isto basta: o livro é denso e sofisticado. Ele continua apresentando o resultado da pesquisa nas 1054 páginas que o compõem. Vale a pena o estudo por parte dos Teseus que de contínuo necessitam do fio de Ariadne, que lhes propicie a saída do labirinto das leis e dos conceitos, devotados nas mesmas artes de Têmis - saibam ou possam avaliar o quanto de energias foram exauridas na própria elaboração.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Astúcia não é Inteligência

      "A esperteza quando cresce em demasia vira bicho e acaba por devorar o esperto." (Autor Desconhecido). Assim é que segundo Augusto Cury, devemos buscar ampliar nossa inteligência e proteger nosso emocional. Daí vem que, segundo Epicuro, a sabedoria consiste em desvendar e desencantar as forças naturais, para viver uma serena harmonia com a ordem cósmica.Não há segredo, segundo ele, no cosmos se soubermos nos servir das luzes da inteligência, para ir ao fundo daquilo que as sensações nos mostram. E que é bem esse o objetivo da ética epicúria: ensinar-nos a cuidar de nossa vida como de um belo jardim. Justamente por construir o bem maior de que dispomos, a vida merece que desfrutemos das satisfações fundamentais: a paz de espírito, a amizade, o gosto dos prazeres verdadeiros. Talvez seja por isso que "A Egípcia" tenha explorado o tema da seguinte forma: "Enquanto nos deixamos dominar pela astúcia não podemos agir inteligentemente. A astúcia é uma capacidade inferior, quase animal, limitada, restrita, material, formalista e egoísta. A inteligência é superior, nos faz capazes de raciocinar com lógica e bom senso, de prever as consequências de um ato e de uma atitude, de compreender os legítimos interesses e direitos alheios. A inteligência não força, não se impõe, não exige, não explora a ignorância alheia, não mente, não abusa das fraquezas do seu próximo. Sabe que não deve fazer aos outros o que não deseja para si mesma. Sabe defender sua liberdade, mas respeita a liberdade do seu próximo. Não é exclusivista porque compreende o espírito de  cooperação e os interesses da coletividade. Sabe que acima dos interesses individuais há interesses mais altos, os da coletividade em que vive e do mundo. Sabe que não deve isolar-se para não se anular. Não perde tempo com coisas inúteis, pois compreende o valor do tempo. Não sustenta caprichos e tolices, está sempre disposta a voltar atrás, a reconhecer que se enganou. Não se ilude e nunca procura enganar os outros. Sustenta a verdade com todas as suas forças porque sabe que só a verdade é real e prevalecerá sempre. Sabe que não há nenhuma garantia para quem se apoia naquilo que é falso. Só a inteligência é capaz de criar um ideal superior e de dedicar-se à sua realização. Vive no presente e projeta-se no futuro. Sabe libertar-se do passado e não carrega ou não se sobrecarrega de pesos mortos. Só a inteligência pode compreender o simbolismo e os mistérios do amor e do altruísmo: "Só ela pode cultivar o mais precioso dos sentimentos: o amor", diz Max Heidel. Essas possibilidades dependem da inteligência. E com ela que tudo isso pode ser realizado para se viver bem.". Assim é dizer que a sabedoria que abre a porta da felicidade, exatamente por não constituir um dom da natureza, nem menos ainda da graça divina, só pode ser atingida por um esforço perseverante. O acesso é facultado a todos durante a caminhada que pode ser longa ou não.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Deus, os animais e a gratidão

     1º) "Aqueles que esperam, se apoiam, confiam, contam com o Senhor renovam suas forças; sobem com asas como águia. Correm e não se cansam, caminham e não se fatigam." (Isaías 40:31); 2º) "Ele faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre justos e injustos." (Mateus 5, 43-48); 3º) "formou o Senhor Deus ao homem do pó da terra e soprou nas narinas o fôlego de vida, e o homem passou a ser alma vivente" (Gênesis 2:7). Logo, o conceito de alma é o homem vivo.
     Com base nessas premissas é possível compreender que Deus é um nome, (""O nome "Deus" parece derivar do grego "Théos", o qual por sua vez vem de "Théastai", que significa ver, considerar" - Santo Tomás), por sinal, inefável! Não é uma entidade. É Essência. É imanência: "Ele está no meio de nós." É uma substância amorfa, viva e inteligente de onde tudo - tudo mesmo -, nasce ou se origina. É Creação: fundamento do fundamento. E o homem é uma entidade, um ser dentre todos os demais animais. Assim como a indagação "Que é Deus? Há a indagação: Homem quem é Ele? Desse modo é que Battista Mondin (O Homem. Quem é Ele? - Elementos de Antropologia Filosófica), para este ser, mediante reflexão, fixara: "A expressão "homo somaticus", hoje, é um tanto quanto rara; era, no entanto, comum nos tempos de São Paulo e Filão Alexandrino. Esses e outros autores daquele período distinguem no homem dois elementos: um psíquico e outro somático, sendo que um diz respeito à alma, o outro ao corpo. Nós nos serviremos das expressões "homo sapiens", "homo religiosus", etc., para denominar as dimensões da vida, do conhecimento, da religiosidade, etc. Por consequência, nos valeremos da expressão "homo somaticus" para identificar a dimensão corpórea do homem. Existe uma reflexão filosófica sobre o corpo humano em quase toda parte da história do pensamento. [...] O corpo é obviamente uma realidade física, material. Significa isso, porventura, que o método acertado para o seu estudo é o experimental, que é propriamente o método de que se vale o cientista no estudo das coisas materiais? [...] Portanto, pode efetuar-se uma dupla investigação sobre o corpo, científica e fenomenológica. Nós, naturalmente, nos dedicaremos neste estudo à segunda, sem, no entanto, ignorar totalmente a primeira, a qual, embora não podendo dar-nos uma resposta conclusiva com relação ao problema da somaticidade humana, pode, por outro lado, fornecer-nos informações importantes e significativas. Por isso, antes de procedermos à análise filosófica da corporalidade humana, interroguemos a ciência para que ela diga o que é este complexo físico tão importante que é o corpo humano e como ele se distingue do de outros animais.". Por causa disso - do homem e dos outros animais -, tem-se que, talvez apenas o homem cultive ou deva cultivar a gratidão e qual a importância dela. Neste viés, segundo Wallace Delois Wattles (1860-1911), em livro dedicado aos professores, "pois eles têm nas mãos o nosso futuro, as crianças", anotara: "O homem pode alcançar harmonia completa com a Substância Informe, conservando uma gratidão viva e sincera pelas bênçãos que lhe concede. A gratidão faz com que a mente do homem se una à inteligência da Substância, de modo que os pensamentos dele sejam recebidos pela Informe. O homem só pode se manter no plano criativo unido-se à Inteligência Informe por meio de um sentimento profundo e constante de gratidão. O homem deve formar uma imagem clara e precisa das coisas que deseja ter, fazer ou ser, e deve manter essa imagem em seu pensamento, sendo ao mesmo tempo profundamente agradecido ao Supremo pela realização de todos os seus desejos. [...] É extremamente importante a contemplação da imagem mental, aliada à fé inabalável e à gratidão sincera. Este é o processo pelo qual a imagem é enviada à Informe, e que ativa as forças criativas. A energia criativa funciona por meio dos canais estabelecidos do crescimento natural e da ordem industrial e social. Tudo o que está incluído nessa imagem mental certamente será trazido para o homem que segue as instruções e cuja fé jamais vacila. O que ele deseja será dado por intermédio da indústria e do comércio.". E nesse tipo de pesquisa, deixou assentado Huberto Rohden (Deus. Colóquio com o grande anônimo de mil nomes sobre as angústias do homem e os enigmas do universo): "A substituição da tradicional palavra latina crear neologismo moderno criar é aceitável em nível de cultura primária, porque favorece a alfabetização e dispensa esforço mental - mas não é aceitável em nível de cultura superior, porque deturpa o pensamento. Crear é a manifestação da Essência em forma de existência - criar é a transição de uma existência para outra existência. O Poder Infinito é o creador do Universo - um fazendeiro é um criador de gado. Há entre os homens gênios creadores, embora não sejam talvez criadores. A conhecida lei de Lavoisier dis que "na natureza nada se crea, nada se aniquila, tudo se transforma", se grafarmos "nada se crea", esta lei está correta, mas se escrevermos "nada se cria", ela resulta totalmente falsa. Por isso, preferimos a verdade e clareza do pensamento a quaisquer convenções acadêmicas.". Disso tudo e por causa disso, quando se faz a compreensão de "Está no meio de nós", tudo fica mais confortável. Assim é  possível adotar uma visão, dentre tantas possíveis e legítimas até, que o importante é a harmonia com essa Substância Informe, Amorfa e Inteligente, com destaque na sintonia, conexão e sincronicidade. Até a Física nos ajuda nisso.

sábado, 12 de dezembro de 2015

Monografia Jurídica e os TCCs no Direito

     1) "Calma! É aos poucos que a vida vai dando certo." (Marília de Castilho Mello - Revista Circuito); 2) "Seja paciente com as coisas não resolvidas em seu coração." (Rainer Maria Rilke); 3) "É graça divina começar bem. Graça maior persistir na caminhada certa. Mas graça das graças é não desistir nunca." (Dom Helder Câmara). Essas três ideias reunidas nos levarão ao porto seguro - ao sucesso!
     Em Consultor Jurídico, de 10/12/2015, o Professor Lenio Luiz Streck, sob o título "TCCs no Direito: como não se deve escrevê-los - retratos da crise", com propriedade, sobre fato que relata, registra preocupações com relação ao ensino jurídico no país. Escrevera: "[...] Poderíamos falar de vários problemas... Não sei por onde começar. O primeiro problema reside no prazo de quatro dias em que o TCC foi feito. O segundo são as fontes. Matérias esparsas, certamente com critérios distintos de pesquisa, que demonstram uma suposta realidade, servem de lastro suficiente para uma monografia jurídica? Existem discussões importantes do/no Direito sobre o problema da violência, mas que, pelo visto, foram deixadas de lado. Ademais, até mesmo sob o aspecto sociológico, as matérias jornalísticas devem ser vistas com muita cautela, o que certamente não aconteceu. E por fim, isto é suficiente para dizer que existem ou não o tal "Direitos dos Manos"? A Constituição tem direitos em excesso? Se pegarmos o autor que ela referiu, parace que sim. Mas, de que modo isso entre em TCC?". 
    De fato, há desafios enormes no ensino brasileiro. Mesmo assim, nada que os professores, empenhados verdadeiramente no próprio mister, não possam equacionar. Cabe a eles, sem tergiversação, a tarefa de melhor as condições atuais. O professor é livre.Há são muitas desculpas, algumas justas até. Ainda assim é possível melhorar a cada dia. É que desafios são parte de todas as atividades. E o professor tem de ter consciência é dele a tarefa de promover a transformação, reunindo, para isso, todas as forças. As questões postas pelo Professor Lenio Luiz Streck são intensas e interessantes desde a origem.
     Para uma modesta contribuição sobre o tema, apontamos dois livros obrigatórios para o bom desempenho nesse domínio. O primeiro deles (A MONOGRAFIA JURÍDICA), do Professor Eduardo de Oliveira Leite. Dele colhemos relato do próprio autor: "Apresentação à terceira edição. Quando apresentei a primeira edição deste livro, em 1985, não podia imaginar a repercussão que o meu trabalho provocaria nos cursos de pós-graduação em geral. A monografia fora idealizada, estruturada e escrita com vistas a auxiliar os alunos dos Cursos Jurídicos, mas, muito além do que era possível prever, atingiu todo o alunado da pós-graduação brasileira, em prova manifesta que minha intenção de apoiar o corpo discente se tornava realidade através de um trabalho concebido como "guia" aos alunos que não dispõem de professor orientador. Ao contrário dos alunos europeus, ou norte-americanos, muito melhor aquinhoados em matéria de orientação, o alunado brasileiro se ressente da ausência do professor orientador, tão imprescindível e fundamental na determinação do caminho sólido e seguro na investigação científica. Ciente dessa realidade e perfeitamente consciente do que significa a orientação na realização da monografia jurídica, quer a dissertação de mestrado, quer a tese doutoral, sempre imaginava escrever um manual que preenchesse a citada lacuna, dando condições aos alunos de realizarem a difícil tarefa representada pela monografia de fim de curso. Por isso afirmei, na primeira edição, que a idéia deste trabalho nasceu em Paris, quando ainda aluno do curso de doutorado em Direito. Posteriormente, a condição de pesquisador aliada à de professor universitário reforçaram aquela idéia embrionária, que foi tomando forma, se agigantando, e redundou na publicação do livro. De qualquer maneira foi em Paris, na qualidade de aluno, que compreendi, de forma reveladora e decisiva, a importância de que se reveste a metodologia na realização de qualquer trabalho intelectual. Também lá, magnificamente motivado por notável corpo docente, comecei a me apaixonar pela metodologia que me revelou esferas intelectuais até então desconhecidas. O espírito cartesiano, aliado ao racionalismo francês, auxiliou-me a encontrar o caminho que conduz infalivelmente à Ciência. Ainda que Antonio Damásio, através do seu Erro de Descartes, tenha tentado desmistificar a importância da racionalidade, substituindo-a pela emoção e pelos sentimentos, é evidente que a objetividade científica exige rigorismo, logicidade e disciplina, tão próprias e próximas da razão. Se os sentimentos encaminham-se na direção correta, levando-nos para o lugar apropriado do espaço de tomada de decisão onde podemos tirar partido dos instrumentos da lógica, é porque, inicialmente, a razão geradora do trabalho intelectual criou condições suficientemente aptas a superar a mera objetividade, ascendendo às esferas mais elevadas da subjetividade e da emoção. Portanto - e a experiência de duas décadas de docência aí está para endossar o que se afirma -, a metodologia científica é o pressuposto de todas a atividade do pesquisador, e sem ela o risco de não se chegar a bom resultado é muito grande. Descoberto esse caminho, que me leva à constante aquisição de novos conhecimentos e à certeza de que, embora limitados como humanos, somos infinitos pelo intelecto, senti uma grande necessidade de partilhar com os meus pares as mesmas sensações que eu mesmo vivia. Julguei fundamental comunicar a todos que optaram pelo difícil, mas gratificante, mundo das idéias "...todo o pouco que eu descobrira e convidar os bons espíritos que procurassem ir além, contribuindo cada qual segundo sua inclinação o seu poder para as experiências que seria necessário fazer" (Descartes). Compartilhar. Talvez nessa palavra mágica resida toda a essência e significado de minha atividade docente, quer na graduação, quer na pós-graduação. Compartilhar ensinando; compartilhar indicando caminhos e  mostrando rumos; compartilhar orientando metas, descobrindo vocações e definindo carreiras. Maravilhosa e inefável profissão que é este de ensinar. De dividir e se dividir ininterruptamente em milhares de outros seres humanos que nos escutam, que nos imitam e que se desdobram em miríades de luz e conhecimento como os reflexos ilimitados de um espelho infinito. O livro, além da aula, ainda que diálogo mudo, perpetua o ato didático, no silêncio das bibliotecas, na cumplicidade da reflexão, no ato indizível da descoberta, do acesso à razão e da apreensão das idéias. Com esse objetivo escrevi A Monografia Jurídica a meus alunos - com os quais tive o privilégio de passar os melhores momentos de minha vida - em comunhão de razão e sensibilidade, de dúvidas e certezas, de descobertas de verdades e limitação de incertezas; todos meus alunos, de ontem, de hoje e de sempre, estão presentes nas páginas deste trabalho, como razão motivadora e primeira da sua existência. Este livro é dedicado a todos os pesquisadores em Direito que, através da pós-graduação, procuram, de forma perseverante e honesta, crescer como intelectuais e cientistas do Direito. Foi escrito, organizado e planejado com o objetivo específico que norteia nossas aulas: lembrar constantemente que a Ciência exige perseverança, paciência e rigorosa disciplina. A experiência nos tem comprovado quão valioso se revela um estudo sistematizado, organizado e, sobretudo, disciplinado. A importância do método foi a perspectiva que direcionou a elaboração deste guia de pesquisa jurídica com vistas à realização da dissertação de mestrado e da tese de doutorado. Procurou-se demonstrar que a monografia, em si, é irrealizável se desligada de toda uma experiência intelectual largamente acumulada. Assim, ninguém pesquisa sem antes dominar a leitura; ninguém conclui sem antes cotejar informações, avaliando-as e hierarquizando-as; ninguém determina um tema sem dispor de vasto material intelectivo. A pesquisa, a prospecção, a noção de plano e suas implicações, a redação, não são momentos isolados e estanques, mas, ao contrário, fases seqüenciais que precisam ser devidamente avaliadas e consideradas pelo pesquisador. Cada uma delas demanda tempo, reflexão, pensamento, concentração, enfim, trabalho lento, árduo por vezes, "grande tensão e forte paixão", como diria Pavlov. Por outro lado, realçou-se, através da argumentação teórica e de exemplos concretos, que o domínio de certas técnicas (resumos, fichários etc) corresponde ao nada quando dissociado de um rigoroso controle da lógica, meio seguro de se buscar a Verdade. A pesquisa científica só pode transformar-se em monografia quando conforme às exigências lógicas do raciocínio. A metodologia interfere como agente disciplinador do trabalho intelectual, garantido-lhe máxima produtividade e a decisiva criatividade tão ausente de nossos cursos jurídicos. Examinando as principais etapas da concepção da monografia - desde o momento em que se toma a decisão de realizar tal trabalho até a sustentação diante da banca examinadora -, o livro foi concebido como um guia de apoio metodológico a todas as dúvidas e vacilações que acompanham, inevitavelmente, o estudante na pós-graduação. Com a ajuda e participação de numerosas informações surgidas no meio acadêmico foi possível imaginar as diversas situações vividas por um autor, determinando as principais etapas de evolução do trabalho, suas dificuldades e prováveis soluções. Todas as exposições técnicas vêm acompanhadas de sugestões práticas e exemplos colhidos na ciência jurídica. O processo pode manifestar-se difícil numa primeira abordagem, mas, tão logo o estudante se familiarize com a sistemática empregada, poderá adaptá-la à sua própria realidade temática. [...].  Maringá, primavera de 1996 - O AUTOR". (Um registro: fui aluno desse Professor a quem nutro em estima elevada).
     O segundo livro de exploração obrigatória para o bom desempenho nesse domínio é de Eduardo Carlos Bianca Bittar (LINGUAGEM JURÍDICA), conforme a sentença: "Sabendo-se que é impossível pensar o Direito sem a linguagem, esta obra traz suas contribuições teóricas e práticas para a abordagem dessa relevante parte do fenômeno jurídico.", dissera em "Apresentação. A importância do estudo da linguagem jurídica pelo operador do direito não precisa ser justificada. Do trato diário com os problemas de linguagem, com as questões hermenêuticas, com a vivência em torno de ambiguidades de sentido, na conjugação de informações advindas de canais de comunicação os mais diversos, na produção de textos jurídicos é que advém a plena consciência da dimensão e da importância do estudo e do conhecimento do fenômeno da linguagem como realidade ligada à jurídica. Estudar a linguagem jurídica sob a vertente semiótica é, na verdade, estudar um viés que, não obstante sua já secular existência, tem-se afigurado dia a dia mais uma matriz teórica de referência para os estudos de linguagem. A semiótica ocupa, portanto, um espaço teórico anteriormente dominado por ramos científicos estanques do conhecimento humano, tendo-se reforçado em sua amplitude objetiva e em sua proposta de investigação na exata medida da constante mutação dos saberes humanos. É certo que o evolver histórico desta ciência apresenta percalços e entraves, e nem sequer se pode dizer pacífica a discussão acerca das origens deste estudo ou muito menos pacífica a metodologia de que se utiliza ou o objeto que recobre, e isto, pois, manifesta-se atualmente ainda no processo de formação de seus umbrais. Nem mesmo sua nomenclatura científica se encontra fora de debate, visto se encontrar esse aspecto do problema na exata dimensão da definição do que seja a própria semiótica. Isso torna ainda mais relevante a pesquisa e o detalhamento desta para o âmbito do Direito. Sob o título de Linguagem Jurídica, propõe-se propriamente uma reavaliação do Direito, numa perspectiva teórico-semiótica, procedendo-se a um perscrutamento da juridicidade, o conjunto das práticas jurídicas de discurso. Trata-se de aplicar sobre o mundus iuris a metodologia de pensamento própria da ciência do sentido, a semiótica. Neste processo de investigação, dados históricos serão de extrema importância, noções teóricas serão grande valia, tudo até que se possa apresentar com solidez o objeto destas perquirições no campo jurídico: o conceito de juridicidade. Assim, qual seja o papel e o campo de desenvolvimento de uma Semiótica Jurídica, é o que se está a procurar e a definir. Destarte, é mister que a pesquisa não somente se detenha nas entranhas do movimento semiótico, mas se distenda também por sobre as saliências do Direito. O Direito, dimensão heterodoxa de conhecimentos e práticas humanas, com seus multifários espectros e formas de apresentação, naturalmente, e à primeira vista, manifesta-se como uma conformação homogênea, sólida, compacta, de todo clara aos olhos de seu intérprete. Porém, sua primeira apresentação assim feita, logo surgem indícios suficientes de sua heterogeneidade, devida fundamentalmente ao fato de que o discurso jurídico, deve-se dizê-lo desde já, é um discurso da culturalidade humana; a aparência de homogeneidade secreta uma constelação de problemas  sócio-axiológicos. O Direito é praticado por meio da comunicação, pois pressupõe a interação de agentes, a vida em sociedade e a necessidade deregulamentação de condutas num espaço determinado. Assim, passa a se justificar esta abordagem zetética da temática, e isto dentro de um contexto semiótico bem situado, procedendo-se ao tratamento mais aprofundado de uma miríade de conceitos aqui apreendidos na perspectiva da linguagem, ou do Direito como universo de prática e manifestação da significação. O Direito como prática de linguagem, ou de linguagens, na forja social, nada mais é que instrumento de intervenção do homem sobre o homem, e assim se apresenta, assim se manifesta, assim se faz, carregando consigo um caudal de consequências que devem ser avaliadas e re-avaliadas constantemente com apurada prudência. O direcionamento das pesquisas encontra, portanto, um texto central sobre o qual se baseiam as suas premissas de trabalho: investigar a ordem de produção da chamada juricidade, conjunto de práticas textuais de linguagem do Direito. Isso importa um buscar as origens do fenômeno, seu crescimento e manifestação, os efeitos que produziu, bem como seu desaparecimento. Dinâmica e estática aqui estão em questão. Para que este estudo, projetado com tais dimensões, seja suficientemente bem orientado, é mister que esteja bem engajado em seu contexto, ou seja, o contexto dos acontecimentos jurídicos. Deverá, portanto, possuir perspectivas concretas, situando a juridicidade em meio aos demais fenômenos sócio-histórico-culturais, procurando, sobretudo, detectar os meios pelos quais se torna possível investigar o surgimento do discurso jurídico em seu contexto fenomênico e situacional. Nesse sentido, a juridicidade é vista como um sistema entre sistemas, como um produto social entre produtos sociais, ou, mais ainda, como uma palavra entre entre outras, e o que pode definir como estrutura complexa é exatamente o fato de que é uma dentre as várias possíveis e existentes formas de ser da realidade social. Assim, a ênfase recairá na proposta de se enveredar na viva e dinâmica comunicação existente entre a juridicidade e os outros sistemas sociais. Neste ponto é que se procurará reforçar a idéia de que o sistema jurídico compartilha com o espaço dos signos, e de outros diversos componentes da culturalidade valorativa, um tópos comum, qual seja, o da linguagem, ou, em outras palavras, o Direito, enquanto retículo sócio-cultural e produto da comunhão de diversos valores sociais (organização, política, convívio, obediência, sobrevivência, trabalho...), tem como uma de suas perspectivas a linguagem. É a linguagem, assim, uma de suas características. Justificar o estudo da problemática semiótica no contexto da juridicidade é muito mais remontar ao próprio caráter dialético pelo qual se manifesta o discurso jurídico, enquanto manipulado por sujeitos semióticos determinados, ou determináveis, que atuam dinamizando o sistema normativo e atualizando a vivência implicacional que se destaca da necessidade de regência da vida e da conduta sociais, e muito menos submetê-los a um juízo minimizante de sua complexidade. Retome-se essa idéia, neste contexto fundamental: estudar o Direito em seu movimento de sentido, como linguagem, não significa reduzí-lo a mera realidade de signos. Não é o objeto de pesquisa que deve ajustar-se ao método, mas sim o método que deve adequar-se ao objeto. O projeto de reconhecimento de uma significância semiótica no seio da juridicidade só vem a acentuar a falência de um modelo científico de tendências estáticas, primando, pelo contrário, pela acentuação dos diversos aspectos com os quais se pode visualizar uma realidade ou uma faticidade. Se a complexidade e a heterogeneidade fenomênicas reclamam o alargamento dos horizontes epistemológicos-científicos, com isso, também, se alargam as perspectivas e os aspectos de abordagem sob os quais se pode analisar essa mesma realidade. Assim é que re-escrever semioticamente o Direito é mais que propor uma discursividade acerca da literalidade de palavras e signos em que se expressa a textualidade jurídica, seja normativa, seja burocrática, seja decisória, seja doutrinária. Textos entre textos, os códigos, as compilações, as recolhas normativas, os trabalhos de exegese legislativa, as decisões jurisprudenciais representam unidades dotadas de vida própria, a vida dos textos. Estes formam um repertório de elementos jurídicos sujeitos a uma re-apreciação crítica, tudo nos exatos termos de uma proposta semiótica; detecta-se, pois, o fenômeno textualidade como nuclear para a manifestação e existência da juridicidade. Propõe-se, portanto, um esboço crítico de apreciação do Direito manifestado, mas em seu aspecto semiótico integral, ou seja, como pragmática textual, como semântica textual e como sintática textual, sendo cada uma destas instâncias compreendida não como repertório formal de relações científico-teoréticas, mas antes como elemento ou subsídio para a assunção de uma postura didascálica perante a complexidade comunicativa que se destaca do seio da juridicidade. A essa juridicidade, entendida como manifestação fenomênica do Direito em todos os aspectos, abrangidas sua axiologia, sua teleologia, sua deonticidade, bem como sua diacronicidade e sua sincronicidade sistêmica, não se pode referir sem que antes se tratem alguns importantes  aspectos do problema metológico. Uma proposta semiótica, principalmente de uma semiótica textual, faz transparecer a necessidade de definir a juridicidade como o complexo cultural apreendido sob a ordem de idéias que se vinculam ao poder de expressão do animal simbolicus. Assim é que a manifestação articulada da linguagem revela a participação dos problemas sentáticos, semânticos e pragmáticos àqueles que manipulam a juridicidade recorrendo aos elementos estruturais de universos de discurso precisos e determinados, em uso na sociedade, para a composição de discursos particulares acerca da textualidade preexistente nas manifestações jurídicas de sentido. Percebe-se que, onde há textos e sujeitos envolvidos, dessa interação só pode resultar uma complexa atividade de constante construção do sentido jurídico. Os sujeitos textuais que interagem juridicamente são responsáveis pela formação da juridicidade; esta inexiste abstraída a intersubjetividade, o que garante uma dinâmica ímpar nos movimentos textuais, de modo que verificar que há dinâmica nas instâncias e instituições jurídicas é, antes de tudo, verificar que, ao mesmo tempo em que algo permanece, algo muda. Mas nada surge ou desaparece ex nihilo, e sim dentro de condutas semióticas determináveis, o que garante resultados de análise surpreendentes. No contexto de mutações que re-absorvem as experiências sociais anteriores e as reelaboram num perene continuum, percebe-se um sistema que se move e que iter-age física e ideiologicamente com outros possíveis sistemas sociais. É assim que, tomada a juridicidade como algo imerso numa teia social e cultural mais ampla, pretende-se apresentar uma proposta de análise teórico-jurídica, proposta esta que não peque por estabelecer dimensões estritamente apartadas da fenomênica em que se manifesta o Direito, mas que postule a apresentação dos principais aspectos que permitem entender o Direito como retículo sócio-cultural. Da noção de retículo cultural é que se pode partir para a afirmação de que o próprio termo "Direito" pode ser objeto de confirmação no seio de uma teoria semiótica, tendo-se em vista que pode ser entendido como um signo; fala-se do que seja o Direito, explica-se o que seja o Direito, propõem-se respostas para a questão básica de qual seja a natureza do Direito. De fato, muito já se disse a esse respeito, o que só vem a denunciar que o termo "Direito" possui uma dimensão de signo. E isso na medida em que seu campo semântico se ordena de acordo com a multiplicidade de denotações que encontra no campo social (existe um conceito coloquial do que seja o Direito, outro judicial, outro acadêmico, outro econômico...) no qual está imerso, o que indica que a própria operosidade do Direito encontra-se comprometida com sua faceta sígnica; em outras palavras, o próprio rendimento do sistema jurídico é avaliado a partir do conceito de "Direito" que se retém (sistema de opressão, sistemas de controle, sistemas ideológico de classes, sistema puramente formal...). O signo para o termo "Direito" é um estar para um outro algo que não a sua própria natureza terminológica (o Direito não existe concretamente como objeto do mundo disponível aos sentidos), o que consente que se diga, portanto, que onde se lê "Direito", ou quando se diz "Direito", reclamam-se também termos ordem, poder, violência simbólica, poder persuasivo, valor, normatividade, regras de conduta, coercitividade, eficácia, decidibilidade, sistematicidade... É assim que se pode, prima facie, apresentar o "Direito" como esse amálgama de denotações semânticas que incorporam valores sociais diversos. É com esse complexo de elementos que se pretende lidar deste momento em diante, através desta pesquisa, pois a escolha do método e a opção teórica se fazem no exato sentido da consecução de um objetivo, aqui já claramente delineado. Parte-se, pois, para o alcance deste, de modo a pesquisar propriamente aquilo que se pode nomear juridicidade, ou seja, o Direito tomado como sistema de significação, a significação jurídica, e expresso por meio de aparições de sentido, práticas judiciárias, condutas de agentes, decisões sociais, etc., que se verificam por seus textos. É nesse sentido e com esse intento que se inscrevem nesta pesquisa as palavras que seguem.".(ano 2001). 
     Retomando as três ideias iniciais é possível dizer que para a realização de um trabalho de TCC ou outro qualquer é preciso, da parte de quem se propõe a fazê-lo, paciência, dedicação, estudo, pesquisa, busca constante e contar com ajuda de muitas pessoas. No caso específico, a ajuda maior, digamos assim, ela virá dos professores empenhados em seguir ideais como as do Professor Eduardo de Oliveira Leite e do Professor Eduardo Carlos Bianca Bittar, aqui nomeados como padrão à quem deseja participar da atividade de ser Professor. A tarefa é árdua. Mesmo assim compensa.

sábado, 5 de dezembro de 2015

Epicuro: O Filósofo da Alegria

     Se é lícito entender que a Ética é a busca, o estudo, a pesquisa pelo conhecimento do meio adequado para atingir a meta em plena liberdade e esse é o meu conceito. Também será possível supor que Epicuro trilhou essa estrada pelo viés da Alegria.
     Reinholdo Aloysio Ullmann, sob o título acima, como resultado da própria pesquisa, fixara: "Epicuro nasceu, no ano 341 a.C., em Samos, e não em Atenas, como alguns autores consignam. Morreu em Atenas, em 270 a.C. Parte de sua juventude passou-a na terra natal, onde se familiarizou com o pensamento de Platão (427-347 a.C.). Iniciou seus estudos de filosofia aos treze anos de idade e sempre a teve em grande conta, segundo depreendemos de suas palavras: "Ninguém, quando jovem, deixe de filosofar nem, quando velho, se canse filosofando. Pois ninguém é jovem demais nem demasiado velho, para fazer algo em favor de sua saúde espiritual. Quem julgasse ser muito cedo ou nimiamente tarde para dedicar-se à filosofia, seria semelhante àquele que afirma que a hora exata de sua felicidade ainda não chegou ou que já se escoou. Portanto, a filosofia cabe tanto ao jovem quando ao velho" (Carta a Meneceu). Avaliando o trabalho de desse autor, o Professor Thadeu Weber escrevera: "Trata-se de uma obra de grande atualidade e que vem preencher uma lacuna, existente nos manuais de história da filosofia. Sua leitura é muito agradável e de um extremo rigor científico. Caracteriza o contexto histórico de Epicuro e, com objetividade, desmistifica equívocos cometidos através da história, quanto a interpretações errôneas das atividades do 'mestre do Jardim' e de suas comunidades. Chama a atenção para importantes repercussões do epicurismo na atualidade. Ullmann desenvolve os aspectos centrais do pensamento de Epicuro em três partes: Canônica, Física e Ética. A Ética é o tema central para o qual converge toda a doutrina de Epicuro, segundo o autor. Trata, essencialmente, da questão do 'prazer'. Tem como objetivo fundamental tornar os homens felizes, através do afastamento de todo temor, dentro do assim chamado 'quadrifármaco'. A felicidade e a alegria são também temas amplamente desenvolvidos. Oportunas colocações faz o autor, quando evidencia a influência de Epicuro na história. Discute interpretações, tendências, repercussões e corrige equívocos. Mostra a atualidade da filosofia do prazer e da alegria, no sentido de ser um ideal de vida proposto por Epicuro.". Também, o Professor Jayme Paviani o avalia no mesmo sentido: "A obra de R. A. ULLMANN - Epicuro, o Filósofo da alegria -, é uma exposição erudita, sistemática e especializada do pensamento epicurista a partir de suas origens clássicas, isto é, do filósofo de Samos, nascido no ano 341 a.C. Além de rica em informações, a obra elucida temas polêmicos até hoje. Com sua publicação, a bibliografia filosófica ganha qualidade especialmente sob o aspecto acadêmico-pedagógico. Abre no-vos horizontes históricos para uma melhor compreensão do comportamento moral e filosófico do homem ocidental. A releitura feita pelo Prof. ULLMANN das idéias de Epicuro, realizada com discernimento crítico, enriquece os conhecimentos e contribui no sentido de refletir sobre a experiência do homem nesses mais de 2.000 anos que nos separam e ligam às raízes de nossa cultura". E o Prof. Urbano Zilles sintetiza: "Em suma, a releitura de Epicuro, feita por Ullmann, representa uma contribuição real e original para o estudo dos grandes problemas humanos hoje.".
     Com isso damos por encerrada a breve apresentação do livro. Também entendemos ter instigado o leitor na busca de maiores subsídios sobre o pensamento de Epicuro, além de termos apresentado uma provocação para o estudo, a busca, a pesquisa em torno do prazer. Entendemos ser a felicidade a consciência de si mesmo (algo interior: potências e limites) e o prazer ser aquilo relacionado ao conforto das coisas materiais (algo exterior), cujo equilíbrio na busca e na prática de ambos ser o ideal para uma vida boa.
 

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Sobre a Justeza dos Nomes - Palavra e Linguagem

     Sob esse título, Maik Dias Mende desenvolvera um texto, em que busca uma análise hermenêutica do diálogo platônico Crátilo que idealiza uma tentativa ontológica a luz da dialética socrática para estabelecer a formação dos nomes e as respectivas denominações das coisas, também o valor e veracidade do discurso, tendo em vista, que o discurso é incapaz de inferir a essência das coisas, mas apenas subjugar uma predefinição da sua existência. Assim começa: "A se tratar do que é "verdade e falsidade" dentro da linguagem vemos opostos e profundos desencontros, pois o jogo de percepção particular impede o desenvolvimento do todo, isso da seguinte maneira; a verdade de um só não é a verdade da coisa em si, pois compreende sobre verdade o conjunto de afirmações universais. No diálogo Crátilo, a justeza dos nomes é buscada a partir da compreensão do seu valor semântico, etimológico e relação do objeto em si. Hermógenes dá inicio interrogando Sócrates por não compreender de Crátilo a afirmação do seu nome não ser posto corretamente a sua pessoa, as aporias socráticas quer trazer a luz da compreensão essa "angústia" de Hermógenes. A tese discutida por Hermógenes é por convenção, aderimos os nomes aos objetos porque entendemos que seja o melhor, não necessariamente poderia determinar o que é a coisa, mas a parte da visão do sujeito sobre ela, assim outro poderia dar uma nova nomenclatura pela sua experiência.Veremos que Sócrates pensará a justeza dos nomes com sua "essência natural" o próprio nome dá subsídios para ser definido, as letras com seu valor semântico deve estar harmoniosamente juntas para definir e dizer sobre a coisa, embora concluirá posteriormente que o discurso é incapaz de dizer sobre a totalidade das coisas existentes e ideais. Em pesquisa realizada, Eduardo C. B. Bittar (Linguagem Jurídica, Saraiva, 2001, p.44) sustenta que: "O Direito, frequentemente, embate-se não só com a sua estrutura mutante, mas também com o fato de que a realidade é por si pluri-discursiva e polissêmica. A culturalidade, em uma análise de cunho jurídico, é e será sempre o supedâneo de toda abordagem, visto que se trata aqui de aprender o fenômeno jurídico em sua produção, em sua estrutura regular de apresentação entre os fatos culturais. Os signos são, também, fatos culturais. Na missão de circunscrever um corpus deve-se, sobretudo, determinar com precisão a parte de um fenômeno que será estudada por meio de uma metodologia qualquer.". Eros Grau sustenta: [...] os conceitos jurídicos não são referidos a objetos, mas sim a significações, não são conceitos essencialistas [...]" (Crítica da discricionariedade e restauração da legalidade, p. 313). Para Landowski, o jurídico é mais do que se imagina a seu respeito. Ricoeur (Interpretação e ideologias, 1990, p. 53) fixa a escrita torna o texto autônomo relativamente à intenção do autor;  o que o texto significa, não coincide mais com aquilo que o autor quis dizer. Diante disso tudo, justo afirmar que transformamos uma coisa em um objeto (nominamos a coisa) quando colocamos essa coisa diante de nós a uma certa distância, sem uma posição prévia de aceitar, negar, duvidar, etc., analisando, porém, as características dessa coisa e justificando porque ela deva ser tida como tal. Aí estará firmado um conceito possível.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Matriz do Sistema Jurídico Brasileiro e as Noções de Justiça



01.   “O que hoje vigora, abrolhou dos germes existentes no passado: o Direito não se inventa; é um produto lento da evolução.” (Carlos Maximiliano); 02. “O Direito não é um fim mas um meio. Na escala de valores não figura o direito. Aparece, em contrário, a justiça, que é um fim em si mesma e a respeito da qual o direito é apenas um meio de acesso. A luta, deve, pois, ser pela justiça.” (Eduardo J. Couture); 03. “§ Único: Que a lei não seja instrumento de opressão, mas garantia de paz entre os homens.” (Charles Chaplin); 04. “Contar é muito dificultoso. Não pelos anos que já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas – de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. O que eu falei de exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que nem não. São tantas horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos, tudo miúdo recruzado. [...] A vida inventa! A gente principia as coisas, no não saber por que, e desde aí perde o poder de continuação – porque a vida é mutirão de todos, por todos remexida e temperada.” (Guimarães Rosa); 05. “Neste rés-do-chão da vida de todos os dias, a rotina prevalece: semeia-se o trigo como sempre se semeou, planta-se o mais como sempre se plantou, alisa-se o solo do arrozal como sempre se alisou [...] É o limite que se estabelece para cada época (mesmo para a nossa) entre o possível e o impossível.” (Fernand Braudel); 06. “Se a filosofia nos parece perder sua importância nos dias de hoje, na época de catástrofes espirituais e materiais que se abre para nós sobre o mundo futuro, sua causa se acha em nossa insuficiência para com ela.  A filosofia é a tal ponto o próprio da condição humana que terá de encontrar uma forma nova.”(Karl Jaspers); 07. “O homem, portanto, se distingue das demais espécies existentes porque nem tudo o que faz surge de sua estrutura genética, nem se desenvolve automaticamente em sua relação com a natureza, nem se transmite à sua descendência através dos gens. É o único animal que necessita de aprendizado para uma série de atividades que lhe são próprias.” (Maria Cristina Castilho Costa).
02.   No discurso de France Farago (A Justiça), está descrito: “Quando nos questionamos sobre a justiça, o que inicialmente impressiona é a anterioridade e a universalidade de sua petição: sempre presente sob o aspecto de esperança frustrada, exigência revigorada por uma constatação de injustiça, denunciada como escândalo que clama por julgamento. A exigência normativa que sua ideia implica sempre precede o ultimato pela intenção de enunciar a mais íntima essência. A justiça corresponde de fato a uma das mais antigas aspirações em todas as sociedades, não importa qual seja a forma de sua organização, de seu sistema.”. Assim é que o sistema jurídico brasileiro está fundado no sistema greco-romano-germânico-judaico-cristão e recebeu influência do Direito da Europa Continental. Isso é importante porque para a compreensão do nosso sistema é pressuposto entender aquele. E isso se faz mediante a pesquisa da história do direito. Dessa forma, é útil saber que o direito grego tinha em vista a coletividade. A pólis é que era importante. A ênfase era o direito público. Enquanto o direito romano, tinha em vista a individualidade. Neste a ênfase era o direito privado. O princípio norteador do direito romano caracterizou-se ao :”Dar a cada um o que lhe é devido”. Nessa linha, está Proudhon, “a justiça, sob diversos nomes, governa o mundo, natureza e humanidade, ciência e consciência, lógica e moral, economia política, política, história, literatura e arte. A justiça é o que há de mais primitivo na alma humana, de mais fundamental na sociedade, de mais sagrado entre as nações e o que as massas reclamam hoje com mais ardor.”. E Chaim Perelman, lista alguns exemplos: “1º) À cada qual a mesma coisa. Segundo essa concepção, todos os seres considerados devem ser tratados da mesma forma, sem levar em conta nenhuma das particularidades que os distinguem. 2º) À cada qual segundo seus méritos. Eis uma concepção de justiça que já exige a igualdade de todos, mas um tratamento proporcional a uma qualidade intrínseca, ao mérito da pessoa humana. 3º) À cada qual segundo suas obras. Essa concepção da justiça tampouco requer um tratamento igual, mas um tratamento proporcional. Só que o critério já não é moral, pois já não leva em conta a intenção, nem os sacrifícios realizados, mas unicamente o resultado da ação. 4º) À cada qual segundo suas necessidades. Essa fórmula da justiça, em vez de levar em conta méritos do homem ou de sua produção, tenta sobretudo diminuir os sofrimentos que resultam da impossibilidade em que ele se encontra de satisfazer suas necessidades essenciais. É nisso que essa fórmula da justiça se aproxima mais de nossa concepção de caridade. 5º) À cada qual segundo sua posição. Eis uma fórmula aristotélica da justiça. Consiste ela em tratar os seres não conforme critérios intrínsecos ao indivíduo, mas conforme pertença a uma outra determinada categoria de seres. [...] As mesmas regras de justiça não se aplicam a seres pertencentes a categorias por demais diferentes. 6º) À cada qual segundo o que a lei lhe atribui. Essa fórmula é a paráfrase do celébre ‘cuique suum’ dos romanos. Ser justo é atribuir a cada qual o que lhe cabe, cumpre, para evitar um círculo vicioso, poder determinar o que cabe a cada homem.”. Já Tourtoulon, tratando da justiça formal, a isso tudo, procura estabelecer um nexo entre as diversas concepções da justiça valendo-se da noção de limite.
03.   Por todas essas aspirações e tendências, é possível sustentar que varia a incorporação de um ramo num campo ou outro, de acordo com as funções que o estado assume, em determinadas épocas ou em certos momentos. Daí seu aspecto visível desde o direito romano, de certo artificialismo, irredutível a escalas lógicas. Além disso, a própria autonomia dos compartimentos jurídicos está em constante mutação. Disciplinas novas se especializam do corpo geral, formando ramo próprio, de acordo com as exigências sociais. A flutuação das novas disciplinas corresponde à incerteza da classificação no campo público ou privado, sem que a delimitação dos setores suscite consequências juridicamente relevantes.
(Aula de Ética – Faculdade Estácio de Curitiba – 13/11/2015 – Professor Rubens de Almeida).

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

O MEDO À LIBERDADE

O MEDO À LIBERDADE (Erich Fromm - Escrito em 1941 – 2ª Guerra).

0l. “A maneira de ajudar os outros é provar-lhes que eles são capazes de pensar.” (Dom Hélder Câmara); 02. “Se eu não for por mim mesmo, quem será por mim? Se eu for apenas por mim, que serei eu? Se não agora – quando?” (Ditado Talmúdico – Mishnah, Abot); 03. “Não te criamos celestial nem terrestre, nem mortal nem imortal, mas de modo que pudesses ser livre de acordo com tua própria vontade e para tua própria honra, para seres teu próprio criador e construtor. A ti, somente, demos crescimento e desenvolvimento, dependentes de tua própria livre vontade. Trazes em ti os germes de uma universal.” 03. “Nada é, pois, imutável, a não ser os direitos inerentes e inalienáveis do homem.” (Thomas Jafferson).

     Nesse livro, fixa o autor: “A História moderna da Europa e da América gira em torno do esforço para livrar o homem das peias políticas, econômicas e espirituais que o têm mantido acorrentado. As batalhas pela liberdade foram sustentadas pelos oprimidos, pelos que queriam novas liberdades, contra os que tinham privilégios a defender. Enquanto uma classe lutava por se libertar da dominação, ela própria acreditava estar lutando pela liberdade humana e, assim era capaz de apelar para um ideal – o anseio de liberdade que existe arraigado em todos os oprimidos. Na longa e praticamente contínua batalha pela liberdade, contudo, as classes que lutavam contra a opressão em determinada fase, uma vez obtida a vitória, enfileiravam-se ao lado dos inimigos da liberdade para defender novos privilégios. [...]].

     Desde os tempos de estudante das Universidades de Heidelberg e Munique, Erich Fromm mantém-se fiel à grande tradição humanística da filosofia clássica alemã, a cujo patrimônio acrescentou a dimensão psicanalítica. As preocupações kantianas sobre a melhor forma de convivência social – do KANT que dizia que nada há de mais belo além do céu estrelado sobre nós e a lei moral dentre de nós – são as preocupações de FROMM, em cuja obra o traço ético é relevante – tão relevante que sendo obra de um psicanalista, ela é, simultaneamente, obra de um crítico social e de um expoente da antropologia filosófica.

     Testemunho do caos social e do totalitarismo, ERICH FROMM orientou as suas atividades científicas para o estudo dos fatores que promovem o aviltamento da condição humana: o levantamento das causas psicológicas que permitem o advento de sociedades adversas ao Homem. Mas não procede, nessa análise – e este é um dos seus grandes méritos – à supervalorização dos dados psicológicos. Mostra que, se os processos mentais realizam-se no indivíduo não serão, porém, compreendidos senão a partir da investigação da cultura – da realidade social que os deflagra. Com admirável clareza, ERICH FROMM promove a dissecação de todas as forças sociais e psicossociais que permitem a eclosão do totalitarismo. Procede ao mesmo tempo à análise das estruturas psicológicas do autoritarismo, cujo pressuposto é o de que o homem, não sendo intrinsecamente bom,  precisa de quem o tutele: de um Führer. Sob essa tutela, o indivíduo passa a sentir-se livre em sentido negativo. A liberdade adquire, então, o significado de destruição da personalidade. É a esse complexo de sentimentos e atitutes que FROMM designa como O Medo à Liberdade – a mais grave das enfermidades de que padece o mundo contemporâneo.

     Na sua radiografia de uma situação que é de conforto entre o que o homem pode ser, segundo a visão humanística, e as forças que o induzem ao cultivo dos instintos masoquistas, ERICH FROMM não se restringe ao diagnóstico do nosso tempo. Mostra como na reconquista do sentido humanístico da vida está o caminho que nos afasta do medo à liberdade. Este livro é um ato de fé na grandeza inata do homem.
(Aula de Ética – Faculdade Estácio de Curitiba – 06/11/2015 – Professor Rubens de Almeida – publicada em www.comoaprenderodireito.blogspot.com.br).
    

domingo, 1 de novembro de 2015

Democracia, Educação e Cidadania

     A obrigatoriedade do ensino de Filosofia na educação brasileira é recente e se deve ao entendimento de que se trata de uma disciplina necessária ao que preconizam os artigos terceiro e quarto da LDB-9394/96, que afirmam ser atribuição desse domínio a formação para o exercício da cidadania. Nesse sentido temos o dito de Sandro Chignola (Professor de Filosofia Política no Departamento de Filosofia, Sociologia, Pedagogia e Psicologia Aplicada na Universidade de Padova - Itália), em entrevista especial concedida ao IHU: "É preciso reinventar a democracia do século XXI". Pontua ele: "A despolitização não é o destino do mundo", diz o professor. "Trata-se de pensar e de praticar a ação política à altura dos desafios que temos à nossa frente.". Ao responder a indagação: quais os impactos que os dispositivos de poder vêm provocando nas formas de governo da vida humana? Responde: "tudo o que conecta tecnologia e vida, obtendo daí uma fantasmagoria de identidade do consumo... Celulares, computadores, cigarros... Tudo é um dispositivo.". Diz também: "os dispositivos de acumulação do capitalismo contemporâneo", os quais "trabalham diretamente em termos extrativos sobre a vida". Entre eles, destaca a "especulação financeira", que "extrai valor dos fundos de pensões", "a máquina das patentes", que "persegue o genoma", "a vida inteira dos sujeitos", que "é posta como valor". Ela acrescenta: "O que me parece decisivo, na fase da reação capitalista posterior aos anos 1980, é o esgotamento da distinção clássica entre tempo de trabalho e tempo de vida. E as novas instituições de governo neoliberal (a produção do homem endividado de que fala Maurizio Lazzarato; a crise econômica; governo das migrações; por exemplo) parecem-me exibir um traço único. Mas, de novo, nessa direção, têm mais razão aqueles que dizem que o modelo do governo da vida é mais a social-democracia norte-europeia (e a sua perversão neoliberal) que o 'campo' - campo de concentração, centro de detenção para clandestinos, zona de proteção nos aeroportos - de que fala Agamben". Para ele, a política contemporânea é compreendida como uma consequência da "cisão" entre "ser e agir" e, portanto, não se fundamenta no ser. A política, pontua, é, desse ponto de vista, "pura operatividade, eficácia, mero funcionamento de dispositivos de regulação". Essa tese, assevera, "pode ser um modo de ler o capitalismo contemporâneo ao lado do direito", à medida que "cada vez mais, a produção de regras não depende de modo algum das soberanias nacionais. Há uma crescente autopoiese jurídica, como há muito tempo defende Günther Teubner. O direito não traduz nem expressa direitos: funciona como máquina oikonomika, puramente tecnológica, para administrar e reproduzir as trocas globais". E acrescenta: "O que acabou, me parece, é a operatividade dos Estados nacionais e das categorias políticas a eles ligadas: representação democrática, partidos, centralidade dos parlamentos nacionais, territorialidade do direito, etc". Bem assim, o que está acontecendo é revelador de que a Política e o Direito estão distanciados da comum condição humana. Pois, essa leitura do que seja o ideal exercício da individualidade - feita em outro domínio e que pode ser aqui aproveitada - foi feita por John Stuart Mill (On liberty), ao procurar consignar seu protesto contra as arbitrariedades do século XIX. São passagens: "A natureza humana não é uma máquina a ser construída a molde e programada para fazer exatamente aquilo para o que tenha sido prescrita; é, na verdade, uma árvore que precisa crescer e desenvolver-se em todas as suas dimensões, de acordo com a tendência das forças que, intrínsecas a si, fazem-lhe um ser vivente.". De modo que é lícito concluir que o que está acontecendo, em nosso país, contraria a comum condição humana, por exemplo: a atual taxa de juros, bem como a carga tributária, aqui praticadas. Assim, a vida, a democracia, a educação e a cidadania requerem um acertamento dessas e outras questões gravíssimas, sob pena de não o fazendo a escravidão perpetuar-se. Só que cabe a nós essa tarefa. Ninguém virá nos salvar.

domingo, 25 de outubro de 2015

Cidadania e Fontes do Direito

     Fonte é um local de passagem de algo que já existe. Mesmo assim, há um sólido discurso (figurado) que trata das fontes do Direito, tais como: a lei, a doutrina, os costumes, os contratos, a jurisprudência, a analogia, os princípios gerais do Direito. Em geral, um abastecimento natural de água, em contraste com com poços e cisternas, usualmente cavados. Essa expressão também usada com referência à origem de algo que não a água. Destacando a importância do uso em sentido próprio da língua, há de se apresentar dois termos hebraicos para "fonte; manancial" que são: á-yin (literalmente: olho) e o aparentado ma'.yán. O correspondente termo grego é pe-gé. Visto que os mananciais eram às vezes limpos e aprofundados, isto talvez explique por que "fonte" e "poço" às vezes são usados intercambiavelmente para o mesmo abastecimento de água. Assim é que, num nível mais aprofundado também, das fontes de Direito, aquelas tidas como tal, podem sofrer um questionamento pertinente, dado que o aprofundamento das ideias é salutar. Vem daí, um convite à cidadania, expressado por José Geraldo de Souza Júnior, em entrevista concedida ao IHU, em 16-10-2015, sobre o livro (O Direito Achado na Rua - concepção e prática: Rio de Janeiro - Lumen Juris - 2015), ele pontua que "o importante a considerar" na perspectiva do Direito Achado na Rua é que ele se refere "à atitude de reconhecimento que valoriza o protagonismo instituinte da cidadania ativa e dos movimentos sociais no processo legítimo de criação autônoma de direitos". De acordo com ele, O Direito Achado na Rua busca compreender e refletir sobre a atuação jurídica dos movimentos sociais à medida que eles "determinam o espaço político no qual se desenvolvem as práticas sociais que enunciam direitos, a partir mesmo de sua constituição extralegal, como direitos humanos instituintes; definem a natureza jurídica de um sujeito coletivo capaz de elaborar um projeto político de transformação social e elaborar a sua representação teórica como sujeito coletivo de direito; permitem enquadrar os dados derivados destas práticas sociais criadoras de direitos e estabelecer novas categorias jurídicas para as relações solidárias de uma sociedade em que sejam superadas as condições de espoliação e de opressão, e na qual o direito possa realizar-se como um projeto de legítima organização social da liberdade". Indagado sobre o processo de formulação desse direito, ele responde: "Reitero o que tenho afirmado, enquanto atitude de reconhecimento do processo ativo de cidadania que, lembra Marilena Chauí, se traduz, exatamente, enquanto possibilidade de inscrever no social, sujeitos que criam direitos, legislados ou não. Por isso essa autora indica ser a democracia invenção, exatamente por ser a possibilidade de criação permanente de direitos. Observe que a Constituinte de 1988 exacerbou esse princípio, fixando o sentido participativo e direto do processo político de exercício do poder e de criação de direitos, ao assentar, no final do artigo 5º da Constituição produzida ao longo do processo de 1988, que o elenco de direitos nela declarados não excluiria "outros Direitos", que derivassem do regime que ela adotou (o democrático) e dos princípios que ela estabeleceu (os direitos humanos). Logo se vê que os direitos não são quantidades que se estoquem em prateleiras legislativas, são antes relações, não limitadas senão pela temporalidade reveladora de novas juridicidades, no percurso ampliável de humanização de homens e de mulheres... ao infinito, enquanto direitos achados na rua (na esfera pública) legitimados (pelos procedimentos próprios do sistema democrático de organização social).". Nesse contexto, a cidadania deve ser tida como meta. E como meta, cuja expressão já conceituada e trabalhada por Eduardo J. Couture (O decálogo, foi publicado em folheto, editado em 1949): "Meta nas acepções grega e latina do vocábulo é tanto o termo de uma corrida como o que fica para além dele". Firme nesse conceito primoroso, avante em busca pela cidadania seja a meta.