domingo, 25 de setembro de 2016

Como fazer nossas dissertações?

     Em "Um Método Dissertativo", Emília Amaral e Severino Antônio questionam e esclarecem: "Como fazer nossas dissertações? Como expor com clareza nosso ponto de vista? Como argumentar coerentemente e validamente? Como organizar a estrutura lógica de nosso texto-introdução, desenvolvimento e conclusão?
     Agora, faremos a sugestão de um método dissertativo. Um processo que você pode usar como infra-estrutura base para montar o rascunho de sua redação. Depois, haverá muitas outras experiências para você desenvolver os vários processos de escrita dissertativa e, assim, escolher os que deseja, os que tiverem resultado mais criativo. Vamos partir de um exemplo, um tema proposto no vestibular da CESCEM-SP: Nenhum homem é uma ilha.
     Primeiro, você sabe, precisamos entender o tema. Ilha, naturalmente, está em sentido figurado, significando solidão, isolamento.
      Vamos sugerir alguns passos para a elaboração do rascunho de sua redação.
1. transforme o tema em uma pergunta: Nenhum homem é uma ilha?
2. procure responder essa pergunta, de um modo simples e claro, concordando ou discordando (ou, ainda, concordando em parte e discordando em parte): essa resposta é o seu ponto de vista;
3. pergunte a você mesmo, o porquê de sua resposta, uma causa, um motivo, uma razão para justificar sua posição: aí estará o seu argumento principal;
4. agora, procure descobrir outros motivos que ajudem a defender o seu ponto de vista, a fundamentar sua posição. Estes serão argumentos auxiliares;
5. em seguida, procure algum fato que sirva de exemplo para reforçar a sua posição. Esse fato-exemplo pode vir de sua memória visual, das coisas que você ouviu, do que você leu etc. Pode ser um fato da vida política, econômica, social. Pode ser um fato histórico etc. Ele precisa ser bastante expressivo e coerente com o seu ponto de vista. O fato-exemplo, geralmente, dá força e clareza à nossa argumentação. Esclarece a nossa opinião. Fortalece os nossos argumentos. Além disso, pessoaliza o nosso texto, diferencia o nosso texto: como ele nasce da experiência de vida, ele dá uma marca pessoal à dissertação.
6. A partir desses elementos, procure juntá-los num texto, que é o rascunho de sua redação. Por enquanto, você pode agrupá-los na sequência que foi sugerida:
= interrogar o tema;
= responder, com a opinião;
= apresentar o argumento básico;
= apresentar argumentos auxiliares;
= apresentar fato-exemplo.
Observação. Existem pessoas que gostam de escrever diretamente o rascunho, sem fazer planejamento prévio. Para essas pessoas, o planejamento pode reprimir o fluxo das ideias. Se você gosta, se é seu jeito, faça diretamente o seu rascunho e, em seguida, experimente o método que estamos sugerindo, passo a passo: você vai descobrindo, vai reconhecendo no rascunho os elementos que estão sendo abordados pelas etapas do processo. O que não estiver presente no seu texto, você vai, então, acrescentando. Esse exercício aumentará a sua capacidade de mudar o seu rascunho, amadurecendo o seu texto, tornando-o mais completo e mais expressivo.". 
    Certa feita, Clarice Lispector teria expressado: "Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro por que exatamente eu o disse, e com sinceridade. Hoje repito: é uma maldição, mas uma maldição que salva. Não estou me referindo muito a escrever para jornal. Mas escrever aquilo que eventualmente pode se transformar num conto ou num romance. É uma maldição porque obriga e arrasta como um vício penoso do qual é quase impossível se livrar, nada o substitui. E é uma salvação. Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se entende a menos que se escreva. Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não abençoada... Lembro-me agora com saudade da dor de escrever livros.".
     "No texto de Clarice Lispector, percebemos que há uma abordagem sobre o processo de escrever: uma maldição, mas uma maldição que salva. Porque a maldição de escrever, ao mesmo tempo, é vista pela escritora como algo que salva, ilumina, que a acaba, paradoxalmente, "abençoando"? Observe que a resposta se inicia a partir de Salva a alma presa ..., cabendo, assim, desde este momento do texto, a expressão porque. A expressão então pode ser associada à ultima frase, na qual Clarice explica as consequências da maldição salvadora de escrever.".

domingo, 18 de setembro de 2016

Homem: Quem é Ele?

"Se és capaz de manter a tua calma quando
Todo mundo ao redor já a perdeu e te culpa;
De crer em ti, quando estão todos duvidando
E para estes no entanto, achar uma desculpa;
Se és capaz de desejar sem te deseperares;
Ou, enganado, não mentir ao mentiroso; 
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares;
e não parecer bom demais nem pretensioso.

Se és capaz de pensar - sem que a isso só te atires;
De sonhar - sem fazer dos sonhos teus senhores;
Se, encontrando a derrota e o triunfo, conseguires
Tratar da mesma forma a esses dois impostores
Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas
Em armadilhas as verdades que disseste,
E, as coisas porque desta vida, estraçalhadas,
E refazê-las com bem pouco que te reste;

Se és capaz de arriscar uma única parada
Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,
E perdes, e ao perder, sem nunca dizer nada,
Resignado, tonar ao ponto de partida;
De forçar coração, nervos, músculos, tudo,
A dar, seja o que for, que neles ainda existe
E a persistir assim quando exausto, contudo,
Resta a vontade em ti, que ainda ordena: persiste!

Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes,
E, entre reis, não perder a naturalidade;
E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,
Se a todos podes, ser de alguma utilidade,
E se és capaz de dar, segundo por segundo
Ao minuto fatal todo valor e brilho:
Tua é a terra com tudo o que existe no mundo
E - o que é muito mais - és um HOMEM, meu filho!". (IF DE KIPLING - tradução de Guilherme de Almeida).

domingo, 11 de setembro de 2016

Esquemas Mentais

     Colhe-se do pensamento sufista: "O espírito dorme na pedra, respira nas plantas, move-se nos animais e pensa no homem". Assim, Teilhard de Chardin escrevera que a consciência humana tem raízes que remontam até os primórdios daquilo que chamamos de matéria puramente bruta e inerte. Com maior amplitude, encontra-se no livro persa 'Mathanawi' do autor Jalalu'I-Din Rumi (1207-1273 d.C), o seguinte pensamento: "Morri mineral, converti-me em planta. Morri planta e nasci animal. Morri animal e me converti em homem. Por que, pois, hei de temer a alguém?". E mais: "Tempos houve em que o ser humano levava uma vida em estado selvagem. Não havia nem recompensa nem castigo para o mal ou o bem que praticava. Então, os homens imaginaram leis para infligir castigo ao pecador, a fim de, destarte, a justiça poder exercer domínio igual sobre todos e não permitir a violência. Era castigado, quem pecava. Mas, as leis tão-somente atingiam a violência aberta, manifesta, não, porém, os crimes ocultos. Então, alguém, mais inteligente, engendrou o medo dos deuses, para que os homens temessem não apenas as consequências dos seus feitos visíveis, mas, igualmente, das palavras e, até, dos pensamentos mais íntimos, mais secretos. Nascera a religião. Esse homem, mais inteligente, ensinava que existe um ser sobrenatural, imortal, capaz de perceber tudo quanto é feito, dito ou pensado. A ficção foi recebida com alegria e prazer. A residência dos deuses foi posta no céu de onde provêm as bênçãos e os castigos, tais como chuvas, trovões e relâmpagos. O homem que descobriu este expediente cercou a humanidade com uma atmosfera de medo. Convenceu-os, assim, a aceitar a raça dos deuses" (Benjamin Farrington - A doutrina de Epicuro, Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1967).
     Parece que, desde sempre, o homem buscou saber de si e do exterior. Sabe-se ou supõe saber que os registros das indagações deram-se com os poetas, depois com profetas, depois com os filósofos, depois com cientistas. Também, percebe-se, que desde sempre, existiram e continuam a existir os mitos. O mito - do grego "mythos" = discurso, narrativa, boato, legenda, fábula, apólogo. Originariamente, o termo significava uma narrativa fantasiosa da genealogia e dos feitos das divindades do politeísmo registrados nas teogonias. Como narrações imaginosas, distinguiam-se dos escritos propriamente históricos, pelo fato de não se enquadrarem dentro das coordenadas do espaço e to tempo histórico - revela-se um esquema mental restritivo. Ele conduz ao maniqueísmo (doutrina fundada por Mani no século III, na Pérsia, e segundo a qual o Universo é a criação de dois princípios que se combatem: o bem ou Deus, e o mal ou o Diabo; por extensão, toda doutrina fundada nos dois princípios opostos do bem e do mal). Por exemplo, por esse esquema mental mitológico, ainda atualmente, existe a ideia de que a sabedoria é atributo dos idosos. Isso, contudo, não se verifica. Tanto o idoso poderá tornar-se sábio como o jovem. As pesquisas apontam que há jovens com sabedoria e idosos que não passaram da idade mental típica da infância. Com efeito: "[...] a sabedoria não tem preferências pelo poder, pela riqueza ou pela idade juvenil ou senil. O que importa é a capacidade de discernir o momento oportuno e a ação certa para atingir com eficiência.[...] Toda vida humana é uma espécie de culto exterior ao deus que ela adora em seu interior." (Ivo Storniolo - Trabalho e Felicidade, Paulus, 2002, p. 69 e 72). Como dizia alguém, a vida é um grande problema, por sua vez dividido em muitos pequenos ou grandes problemas. De modo que viver é resolver problemas, e viver bem é ser capaz de resolver o problema que se encontrar pela frente. Quanto a isso, devemos substituir a palavra problema por desafio. É que problema nunca se resolve e desafio se supera. Tocando em frente, portanto. Conforme Erich Fromm, há milhares de anos foi dito a uma pequena tribo: "Coloquei diante de vós a vida e a morte, a graça e a maldição - escolhestes a vida.". Esta é também a nossa, escolha.