sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Níveis do Conhecimento

     Tem-se, de certo modo, que o conhecimento está distribuído em três níveis. No primeiro, está ode não saber que não sabe; no segundo, o de saber que não sabe; no terceiro, o de saber que sabe. O do primeiro nível, o da ignorância, da escuridão. Neste, encontra-se a maioria da população. E é aqui a maioria da ações são praticadas e que em decorrência da presunção que impera, quase todas elas acabam por apresentar resultados inesperados, os chamados erros. É que o pensamento ao mesmo tempo em que é uma ferramenta fundamental para que se possa tomar alguma decisão, ele se reveste de uma certa armadilha, contra a qual é fundamental muito cuidado. Com efeito, no pensamento, que via de regra é uma abstração, as coisas dão certo antes de se praticar uma ação qualquer; contudo, depois de praticada a ação, num tempo menor ou mais longínquo, verifica-se que não deu o resultado esperado. Com relação ao segundo nível que é o do despertar, encontra-se uma parcela pequena da população. Este nível já é bom. Porque, aqui a pessoa pensa e longe da presunção de saber o que não sabe toma os devidos cuidados. Ela usa a ferramente do pensamento com as devidas cautelas. Aqui os resultados esperados apresentam um grau de acerto elevado. Quanto ao último nível, é aquele para o qual tende o homem. É o nível da luz, da perfeição.Quem eventualmente atingir este nível contrai a obrigação de ensinar os demais. Daí a palavra mestre, aquele detentor da luz em oposição a aluno, aquele desprovido dela. Há, neste sentido, aqueles que entendem que neste nível ocorreu a santidade; outros sustentam haver a sabedoria. Contudo, o que seria sabedoria? Onde pode ser encontrada? Pode-se estudar a respeito em numerosas publicações. Entretanto, a explicação só pode ser entrada no próprio íntimo e para poder encontrá-la, tem-se de primeiro libertar-se de certas paixões, como a cobiça e a inveja. Assim, a tranquilidade após essa libertação - ainda que só momentânea - produz os vislumbres da sabedoria não alcançáveis de qualquer outra maneira. De modo que eles nos habilitam a ver a vacuidade e a fundamental insatisfação de uma vida devotada primordialmente à procura de fins materiais, desprezando o espiritual. É que tem-se que a tarefa do homem sábio também é entender os grandes ritmos do Universo e engendrar neles. Com efeito, os chineses recorriam a um discurso que trata dos padrões universais e necessários de mudanças, a que toda a natureza inevitavelmente obedece e a que o homem se ajustará livremente em virtude do discernimento adquirido seja pela sabedoria seja pelo sofrimento e os gregos, por seu lado, cultivavam a ideia expressa: "Conhece a ti mesmo que conhecerás aos deuses e ao universo", conforme consta da inscrição afixada no alto do templo de Delfos. Disto tudo se pode inferir a diferença que há entre conhecimento, que vence (é provisório e expressado pela ciência e pela tecnologia) e sabedoria, que é perene. Daí, por mais tentador que seja comparar os oráculos antigos com o moderno computador, só é possível uma comparação por contraste. É que os primeiros tratam de qualidades, enquanto o último, com quantidades.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Cartas a um Jovem Poeta

     No transcorrer da exibição do filme 2011: "WE - O Romance do Século" (Anos 30. O Duque de Windsor, Eduardo VIII (James d'Arcy), é o primeiro na lista de sucessão da coroa britânica. Ele conhece e se apaixona por Wallis Simpson (Andrea Riseborough), uma americana casada. Quando Eduardo assume o trono passa a sofrer pressão para que não se case com Wallis, devido ao fato de ela não ser inglesa e ter dois divórcios no currículo. Para ficar com seu grande amor, ele renuncia ao trono, que passa a ser ocupado por seu irmão Bertie (Laurence Fox). Em 1998, Wally Winthrop (Abbie Cornish) é obcecada pela história de amor entre Eduardo e Walls. Ela trabalha na representação de um grande leilão de objetos do casal e costuma fantasiar como seria a vida deles. Entretanto, na vida real Wally enfrenta vários problemas no casamento com William (Richard Coyle), há uma cena que aparece a imagem do livro de Rainer Marie Rilke (Cartas a um Jovem Poeta), no qual consta que: "as coisas em geral não são fáceis de apreender e dizer como normalmente nos querem levar a acreditar; a maioria dos acontecimentos é indizível." Esse livro traz questões interessantes as quais visam iluminar os caminhos do interior, lições que orientam a própria existência humana, escolha da profissão; deixa claro que há questões para as quais as respostas são encontradas dentro de cada um e, portanto, não podem ser ditadas por mais ninguém; sugere ao apaixonado pela literatura que entre em contato consigo mesmo e se questione sobre as razões que o levam a criar; diz que é fundamental descobrir se é apenas um impulso momentâneo e superficial, ou se o desejo de escrever está alicerçado em bases mais profundas; que é indispensável que qualquer aspirante, não só ao ofício literário, mas a qualquer outro campo do conhecimento, esteja convicto do quanto é significativo para sua vida percorrer um determinado caminho. Ele propõe uma analogia com a própria respiração, pois como ninguém poder viver sem respirar, da mesma forma, é imprescindível perceber se é possível continuar a viver sem a realização desse anseio. O autor segue adiante e vai mais fundo. Ele deixa claro ao seu correspondente e, por extensão, ao leitor, que ele precisa estar pronto a tocar o fundo do seu ser e indagar se há mesmo uma compulsão que o move e o obriga a compor seus textos e que se sua resposta for realmente afirmativa, sua existência deve realmente ser edificada sobre esta exigência interior. Colhe-se: "Deve ser necessário um poderoso bloqueio mental para chegar alguém ao termo de uma vida mais ou menos longa sem ter aprendido algo de próprio da ciência e da arte de viver, e é de se imaginar quantos grãos se sabedoria da vida hão de se ter perdido, inaproveitáveis para a maioria, aproveitados exclusivamente por algumas criaturas às quais não terá sido dada ocasião em que pudessem fazer do que sabiam um legado útil a seus semelhantes. Quantas vezes nos ocorre, a este ou àquele propósito, uma frase ou atitude que guardamos de um nosso tio ou avô, como sinal de singular sabedoria em certas circunstâncias? - Ora, os filósofos e os poetas (um bom  filósofo não ser também poeta é tão difícil quanto um bom poeta não ser também filósofo) são como que bem avisados tios e avós de todos nós, felizmente dotados de uma sensibilidade e uma inteligência mais apuradas, exercitadas além de tudo.". Com efeito: nada do que já foi construído, ergueu-se sem que alguém tenha sonhado com isso, alguém tenha acreditado que isso fosse possível e que alguém tenha querido que isso acontecesse. Então, é bom que se siga tranquilamente entre a inquietude e a pressa, lembrando-se de que há sempre paz no silêncio e sabendo que o mundo é bonito, sendo prudente e fazendo tudo para ser feliz.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Papel e Importância da Petição Inicial

     Geralmente, o homem não dá atenção às técnicas de que se vale para solucionar problemas, a não ser que os métodos habituais venham a revelar-se insatisfatórios face a questões novas. Na história da Ciência, pelo menos, preocupação maior com problemas de ordem metodológica emerge, frequentemente, do fato de formas costumeiras de análise mostrarem-se inadequadas ou de apresentarem imperfeições aos modos tradicionais de apreciar a evidência e de interpretar as conclusões da investigação, devendo considerar que o vocábulo "método" não é sinônimo do vocábulo "técnica" e que método científico é a lógica geral. Assim, as técnicas, via de regra, variam de acordo com o assunto de que se trata e podem alterar-se rapidamente com o progresso tecnológico.

     Particularmente, a demanda desencadeia o processo, pelo qual se elabora o provimento jurisdicional sobre a pretensão posta pelo autor. Com efeito, entende-se que o processo é o continente; a lide, o conteúdo cuja solução se opera com a aplicação da norma jurídica. Sendo assim, a jurisdição, função soberana do Estado, é prestada diante de regular estímulo e, nesse contexto, avulta a importância da petição inicial, posto que todo o ordenamento jurídico-processual, que vai do exercício de ação até a entrega da prestação jurisdicional, tem neste ato sua causa eficiente e seu condutor delimitativo. E além da importância resultante de sua qualidade de ato desencadeador de toda atuação processual, a petição inicial notabiliza-se pelo fato de restringir e amoldar toda a matéria substancial a ser discutida e decidida. Ainda, a petição inicial vincula tanto o artefato de contestação do réu como a sentença do juiz, ou seja: os seus termos delimitam a lide sobre a qual recairá todo o desenvolvimento do processo. Por isso mesmo, petição inicial e sentença são os atos extremos do processo.

     Esse breve esboço é, de certo modo, notável à demonstração do fundamental relevo da petição inicial e disso deflui que sua formulação deve ser feita de modo a permitir um propício debate da causa e uma pertinente incidência decisória, como já notara Vicente Greco Filho: "no direito processual tudo implica, tudo decorre de certas linhas mestras que informam desde a propositura da demanda aos procedimentos especiais, destes aos recursos e, inevitavelmente, à execução. É que a ciência do processo, dentre as ciências jurídicas, é a mais lógica, no sentido silogístico do termo." (Dir. Proc. Civil Bras., v. 2, 1984, p. 49).

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Cristianismo: uma revolução profunda

     Segundo Fustel de Coulanges, em A Cidade Antiga: "A vitória do cristianismo assinala o fim da sociedade antiga. A nova religião termina a transformação social que vimos iniciar-se seis ou sete séculos antes do seu advento. Nos cinco séculos que precederam o cristianismo já não se manifestava tão estreita a união entre a religião, de um lado, e o direito e a política, de outro. Essa espécie de divórcio provinha do desgaste da antiga religião; se o direito e a política começavam a ser algo independentes, era porque os homens não tinham crenças; se a sociedade não se governava mais pela religião, resultava sobretudo de a religião não ter mais forças. Ora, chegou um dia em que o sentimento religioso retomou vida e adquiriu vigor, e então, sob forma cristã, a crença reconquistou o comando sobre a alma. (...).

     Para sabermos como os princípios e as regras essenciais da política foram então modificados, basta lembrarmo-nos de que a antiga sociedade fora constituída por uma nova religião, cujo principal dogma era que cada deus protegia exclusivamente uma família ou uma cidade, só existindo para elas. Essa religião gerara o direito: es relações entre os homens, a propriedade, a herança, o processo, tudo fora regulado, não por princípios de equidade natural, mas pelos dogmas dessa religião, só atendendo as necessidades de seu culto. Fora ainda essa religião que estabelecera um governo entre os homens: o do pai na família, o do rei ou do magistrado na cidade. Tudo procedera da religião, isto é, da opinião que o homem formara da divindade. Religião, direito, governo, confundiam-se, não eram mais que uma só coisa vista sob três aspectos diferentes

     Com o cristianismo, não só o sentimento religioso se reavivou, mas tomou ainda expressão mais elevada e menos material. Enquanto outrora se haviam forjado deuses da alma humana ou das grandes forças físicas, começou-se agora a conceber Deus como sendo, por sua essência, verdadeiramente estranho à natureza humana, de um lado, e ao mundo, de outro. O divino foi devidamente colocado fora e acima da natureza visível. Enquanto que outrora cada homem fizera o seu deus, havendo tantos deuses quantas as famílias e as cidades, Deus apresenta-se agora como um ser único, infinito, universal, único a dar vida aos mundos, o único a dever preencher a necessidade de adoração inata que há no homem. O cristianismo trouxe ainda outras inovações. Deixou de ser a religião doméstica de determinada família, a religião nacional de uma cidade ou de um povo. O cristianismo não pertencia nem a uma casta, nem a uma corporação. Desde o início, chamou a si toda a humanidade. Jesus ensinava aos seus discípulos: "Ide e ensinai a todos os povos"; o temor aos deuses foi substituído pelo amor de Deus.". Isso tende a provar que as mudanças, pelo entendimento, são lentas e só ocorrem quando há uma base para tanto. Portanto, os heroísmos estão, desse modo, descartados.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Celebrar ou Comemorar

         Na construção das frases, conforme se adote o adjetivo antes ou depois do substantivo, o significado se altera. Por exemplo: feliz ano novo e feliz novo ano, não dizem a mesma coisa. Com efeito, feliz ano novo, quer significar um ano novo igual ao anterior; quando se diz feliz novo ano, quer isto significar um ano diferente do anterior ou: comprei um automóvel novo  (das mesmas características do anterior; comprei um novo automóvel  (de características diferentes do anterior). Isto é um fato.
       Já em comemorar e celebrar outras sutilezas devem ser notadas. Segundo os dicionários, celebrar quer significar a prática de um ato com solenidade, enquanto comemorar (Do latim: "cum + memori" = lembrar-se com; co-memorar) quer significar trazer à memória, fazer recordar, lembrar. Desse modo, é a solenidade pela qual os membros de uma comunidade celebram (relembram) juntos a recordação de uma pessoa, de um fato ou de uma data. De certo modo, muitas famílias têm as comemorações das suas datas mais significativas: o nascimento, o noivado, o casamento, os aniversários. Em geral, as comemorações se realizam por meio festivos, como banquetes ou refeições mais lautas, às vezes com discursos ou brindes, trocas de lembranças, com desfiles e demonstrações, etc.. O importante, todavia, é que a comemoração não se reduza a um pretexto para gozar desses aspectos festivos, com quase total esquecimento ou indiferença daquilo ou daqueles que são comemorados. Diante disso, parece mais apropriado dizer que comemora o natal e celebra o novo ano, em decorrência, evidentemente, do fator memória. Todavia, nada impede se que se adote um termo pelo outro, como comumente acontece.