sexta-feira, 25 de abril de 2014

Níveis de Fala

     Referindo-se à conhecida distinção entre "língua" e "palavra", de Ferdinand Saussure, Alf Ross, pontua ser a língua um fenômeno social, ao passo que a palavra é um fenômeno individual. Daí, passa a utilizar os termos "linguagem" e "discurso", sendo que por "discurso" diz dever-se entender qualquer uso da linguagem, tanto se se trata de uma sequência de sons (fonemas) ou como texto, isto é, como uma sequência de caracteres. Nesse particular, recorda os três tradicionais campos de estudo da linguagem: o sintático, o semântico e o pragmático, conforme anotações de Adrian Sgarbi (in Clássicos da Teoria do Direito, Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2009, 2ª ed., p. 68). Paulo de Barros Carvalho (Repertório IOB de Jurisprudência, 1ª quinzeza de junho de 1996 - nº 11/96, p. 265), descrevera que: "Decompondo-se o fenômeno do conhecimento, encontra a linguagem, sem o que o conhecimento não se fixa nem se transmite. Já existe um quantum de conhecimento na percepção, mas ele se realiza mesmo, na sua plenitude, no plano proposicional e, portanto, com a intervenção da linguagem. "Conhecer", ainda que experimente mais de uma acepção, significa "saber proposições sobre". Conheço determinado objeto na medida em que posso expedir enunciados sobre ele, de tal medida que o conhecimento se apresenta pela linguagem, mediante proposições descritivas ou indicativas. Por outro lado, a cada momento se confirma a natureza da linguagem como constitutiva de nossa realidade. Já L.WITTGENSTEIN afirmava, (...), que: "os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo", que dito de outro modo, pode significar: meu mundo vai até onde for minha linguagem.". 

     Pois bem! Tem-se que a fala está caracterizada em três níveis: o da alta linguagem ou linguagem padrão, o da média e o da baixa, os quais estão relacionados aos níveis dos saberes, onde estes, o primeiro seria o do "não sei que não sei", o segundo o do "sei que não sei" e o terceiro, o do "sei que sei", em que este tende à perfeição. Sendo assim, tem-se que a linguagem de primeiro nível, trata de idéias; a de segundo, trata de eventos e fatos e a de terceiro, trata de pessoas. De modo que, a de primeiro nível é salutar: acrescenta; a de segundo e de terceiro, nada acrescentam em matéria de crescimento, com um detalhe, a de terceiro nível é aquela que costuma causar confusão e desentendimento entre os homens, a qual, na medida do possível, deve ser sempre evitada.

quinta-feira, 17 de abril de 2014

Política: Raciocinar e Decidir

     Luís Roberto Barroso, na década de 90, escreveu: "Em meio aos escombros, existe no Brasil toda uma geração de pessoas engajadas, que sonharam o sonho socialista, que acreditavam estar comprometidas com a causa da humanidade e se supunham passageiras do futuro. Compreensivelmente abalada, esta geração vive uma crise de valores e de referencial. De fato, onde se sonhou a solidariedade, venceu a competição. Onde se pensou a apropriação coletiva, prevaleceu o lucro. Quem imaginou a progressiva universalização de países, confronta-se com embates nacionalistas e étnicos. Mais surpreendente que tudo: os que viveram o sonho socialista não viam a hora de acordar e se livrar dele (...). É indiscutível: nós perdemos e eles venceram. (...) Há um ponto ótimo de equilíbrio entre o mercado e a política.". (Migalhas-3350).

     Pois bem, faz-se necessário dissolver uma resistência reinante com relação à Política. É que queiramos ou não ela é essencial, pelo menos enquanto durar esse conceito de civilização em que estamos engajados desde os tempos antigos. Se há problemas, temos de buscar a solução. Aliás, problemas os há em todos os domínios: na Matemática, na Medicina, na Biologia, no Direito, etc. É que a vida real tem o poder de nos forçar a fazer escolhas. Se não nos submetemos a essa pressão, podemos tornar-nos tão indecisos como Elliot. Ela é tão essencial que desde a antiguidade até nossos dias, homens de peso (de Sócrates a Agamben = poetas, filósofos, teólogos, juristas, estrategistas, etc.) vêm se ocupando dela, a ponto de Kelsen ter descrito que: "O Direito não pode ser separado da política, pois é essencialmente um instrumento da política. Tanto sua criação como sua aplicação são funções políticas, é dizer, funções determinadas por juízos de valor". Com efeito, ainda assim, destacara Kelsen, já na primeira versão do livro Teoria Pura do Direito, ano de 1934: "A Teoria Pura do Direito é teoria do direito positivo, portanto, da realidade jurídica; ela transpõe o princípio da lógica transcendental de Kant vendo no dever, no Sollen, uma categoria lógica das ciências sociais normativas em geral e da ciência do Direito em particular.

     Logo, a consequência do afastamento ou do vazio deixado à tratar da Política, pode dar ensejo que pessoas menos preparadas ou embusteiras venham a ocupar o vazio deixado por aqueles que pensam em poder construir algo elevado. Com efeito, há consenso de que a natureza não trabalha com a ideia de vazio, ou seja: onde pode surgir um vazio, imediatamente será preenchido por alguma força e se nós não escolhermos a força à ali incidir, qualquer uma fará o serviço.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Pesquisador: Do Jurista ao Operador do Direito

     A máxima "Cherchez la femme" (sentido: busque a raiz do problema) guia o detetive e o motivo hipotético assim colocado é elemento importante para configurar o caso contra o suspeito. Sem embargo, nem todas as razões que nos conduzem a formular uma hipótese têm, obrigatoriamente, relevância para a aceitabilidade da hipótese. Com efeito, Sherlock Holmes compreendeu muito bem esse princípio, repetindo insistentemente que após eliminarmos todas as possibilidades menos uma, essa uma, por improvável que seja, deve corresponder à verdade. Seu gênio estava em perceber possibilidades que escapavam a pessoas menos perspicazes como Watson e os inspetores da Scotland Yard. Aqui, como em outros domínios, depende de como haja sido estruturado o problema. Assim, toda teoria desempenha, em parte, o papel de guia de pesquisas; a teoria orienta a coleta de dados e sua posterior análise, mostrando-nos de antemão a que devem os dados ajustar e o que devemos com eles fazer depois de os termos recolhidos. Nunca será demais acentuar que a palavra "dado" é palavra incompleta como também o é, por exemplo, a expressão "posterior a"; só há dados para esta ou aquela hipótese. Portanto, sem uma teoria, embora provisória e formulada em termos vagos, não há mais que uma miscelânea de observações, sem significação por si mesmas, nem significação frente à totalidade do fato de que foram arbitrária ou acidentalmente colhidas. Frequentemente, as hipóteses com que trabalhamos só se mostram nas regiões crepusculares do espírito, onde suas linhas incertas se confundem com o fundo sombrio. Daí a dificuldade para o não iniciado a compreender as decisões judiciais. É que muitas vezes, escapam exatamente aquela pista que conduziria ao resultado exato. E uma vez tomada a pista falsa esta, muitas das vezes, conduz a que cada vez mais se afaste do real. Entretanto, há a advertência de Occam no sentido de que não se deve multiplicar as variáveis para além da necessidade, donde o conselho metodológico quanto à norma de simplicidade seja o de Whitehead: "procure a simplicidade e desconfie dela", desde que a norma de coerência mais largamente aplicada seja uma norma intrínseca à própria teoria: a da simplicidade. De modo que, em todos os estágios da investigação se faz o que se pode com os recursos de que dispõe, ou seja: não há milagres.

sexta-feira, 4 de abril de 2014

Maneiras do Conhecimento e a Interpretação

     "Um homem propõe-se a tarefa de desenhar o mundo. Ao longo dos anos, povoa um espaço com imagens de províncias, de reinos, montanhas, baías, navios, ilhas, peixes, moradas, instrumentos, astros, cavalos e pessoas. Pouco antes de morrer, descobre que esse paciente labirinto de linhas traça a imagem de seu rosto." (Borges, "Epílogo", em O Fazedor). 

    De modo geral, tem-se que o conhecimento se amplia de duas maneiras: por extensão e por compreensão. O crescimento por por extensão consiste em transportar uma explicação relativamente completa de um dado aspecto (do conhecimento ou qualquer coisa) para seus vizinhos. No crescimento por compreensão, uma explicação parcial de toda uma região é progressivamente melhorada. Com efeito, Marcelo Dascal (Interpretação e compreensão. São Leopoldo-RS, Editora Unisinos, 2006, p. 5) expressara: "Desde que foi separada de seus primos na árvore evolucionária, a nossa espécie busca pelo significado. A criança se maravilha ao reconhecer - por trás do mero estímulo - um rosto familiar; o adolescente padece em sua busca de um padrão capaz de definir a sua auto-identidade; o adulto está sempre buscando o sentido da vida; e, na velhice, tenta-se compreender a morte desesperadamente. Ao longo desses esforços, temos a sorte (se nos comparamos a outros animais) de poder compartilhar a experiência articulada dos nossos semelhantes por meio de formas de comunicação sofisticadas. No entanto, infelizmente, logo aprendemos que os meios de comunicação, também podem ocultar o significado e impedir a compreensão. Isso acontece porque jamais podemos ter certeza de que um sorriso indica satisfação, que um "sim" representa consentimento ou que uma afirmação revela a opinião daquele que a proferiu. Para averiguar qual o significado de tais exemplos de comportamento comunicativo, temos de nos submeter a um elaborado processo de interpretação, considerando não apenas essa fração de comportamento, mas praticamente tudo o que sabemos sobre uma determinada pessoa, sobre a situação exata na qual o comportamento tem lugar, sobre as normas sociais que regulam determinadas formas de comportamento - em suma, praticamente sobre o "mundo" inteiro que supostamente compartilhamos com o nosso interlocutor. Perante a complexidade desse processo interpretativo, é quase um milagre que possamos nos compreender uns aos outros mais do que sermos incompreendidos. A tarefa de uma teoria da compreensão e interpretação é tentar esclarecer os princípios por meio dos quais alcançamos esse milagre diário". Portanto, é possível que as duas formas de crescimento manifestem-se em qualquer avanço teórico e se apresentem tanto nas teorias concatenadas como nas hierárquicas. Sendo que, uma nova teoria representa aumento de conhecimento, mas transforma, também, o que era sabido, contribuindo para esclarecer, dar significados novos e confirmar o já conhecido.