quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Da Reserva Legal, Da Legalidade, Da Juridicidade

     Às vezes, usam-se esses três conceitos sem dar conta das diferenças que os marcam. Segundo José Afonso da Silva (Curso de Direito Constitucional Positivo, 22ª ed., São Paulo, Malheiros, 2000, p. 421), a despeito do que sustenta parcela da doutrina, a melhor técnica difere o princípio da legalidade do princípio da reserva legal: O primeiro significa a submissão e o respeito à lei, ou a atuação dentro da esfera estabelecida pelo legislador. O segundo consiste em estatuir que a regulamentação de determinadas matérias há de fazer-se necessariamente por lei. Assim, ele busca a solução, com base no Direito Constitucional Positivo, à vista do poder que a Constituição outorga ao Legislativo. Afirma ele, que quando essa outorga consiste no poder amplo e geral sobre qualquer espécie de relações (...), tem-se o princípio da legalidade. (...) quando a Constituição reserva conteúdo específico, caso a caso, à lei, encontramo-nos diante do princípio da reserva legal (ob. cit. p. 421). Dai, lícito inferir que o princípio da legalidade (CF, art. 5º, II), estabelece que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer em virtude de lei, as obrigações dos cidadãos só podem ser criadas por espécies normativas produzidas em conformidade com o devido processo legislativo. Já o princípio da reserva legal ocorre quando uma norma constitucional atribui determinada matéria exclusivamente à lei formal (ou a atos equiparados, na interpretação firmada na praxe), subtraindo-a, com isso, à disciplina de outras fontes, àquelas subordinadas (ob. cit. p. 421). Há, ainda, duas espécies de reserva legal: a absoluta e a relativa. Absoluta quando a disciplina de determinada matéria é reservada, pela Constituição, à lei. Dai, excluir-se qualquer outra fonte infralegal. Relativa quando a disciplina de determinada matéria é, em parte, admissível a outra fonte diversa da lei, sob a condição de que esta indique as bases em que deva produzir-se validamente. São os casos nos quais a Constituição prevê a prática de ato infralegal sobre determinada matéria, impondo obediência a requisitos ou condições reservadas à lei, cujo exemplo pode ser: é facultado ao Executivo a edição de decretos que alterem as alíquotas dos impostos sobre importação (...) atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei (ob. cit. p. 422, 423). Quando ao princípio da juridicidade, este é abrangente no tocante às fontes do Direito. Considera a lei, a doutrina, a jurisprudência, os contratos, os usos e costumes, a equidade eos princípios gerais do Direito. Na dicção de Eduardo C. B. Bittar (Curso de Ética Jurídica, 5ª ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 448), "(...) a ciência jurídica é um saber que se volta para a compreensão do fenômeno jurídico, que possui imbricação direta com causas sociais.". Daí que na doutrina de Diogo de Figueiredo Moreira Netto (Curso de Direito Administrativo, 15ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2010) e Gustavo Binenboim (Uma Teoria do Direito Administrativo, 2ª ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2008), o princípio da juridicidade, como já o denominava Adolf Merkel em 1927, engloba, assim, três expressões distintas: o princípio da legalidade, o da legitimidade e o da moralidade, para alterar-se como o mais importante dos princípios instrumentais, informando, entre muitas teorias de primacial relevância na dogmática jurídica, a das relações jurídicas, a das nulidades e a do controle da juridicidade. O princípio da juridicidade corresponde ao que se enunciava como um "princípio da legalidade", se tomado em sentido amplo, ou seja, não se o restringindo à mera submissão à lei, como produto das fontes legislativas, mas de reverência a toda a ordem jurídica. Ainda, vale tratar a diferença entre legitimidade e legalidade, de vez que, em regra, não se faz a distinção.Parte da doutrina utiliza os conceitos presunção de legalidade e presunção de legitimidade de forma indistinta. Enquanto a legalidade se prende à conformação do ato praticado pela Administração com a lei, verificando-se aquela atuação possui previsão expressa anterior em lei, a legitimidade se dá quando a atuação encontra respaldo popular, ou seja, quando efetivamente se atende aos anseios da coletividade, ou seja: "(...) a vontade juridicamente positivada pelo Estado é o campo da legalidade, enquanto a vontade democraticamente expressa pela sociedade, indiferentemente positivada ou não, situa-se no campo mais vasto da legitimidade.". 
     Disso tudo, fica a importância da observação da semântica [a arte da significação; estudo das mudanças ou translações sofridas, no tempo e no espaço, pela significação das palavras; (...)].  É que o Direito, Ciência que é, prima pelo exato emprego das palavras em sentido próprio. Não é de bom tom usar as palavras como fossem. O ideal e recomendável é usá-las em seus exatos sentidos e conceitos, sob pena de desvirtuamento do próprio Direito. Isso ninguém almeja.