quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pelo viés da Ilustração

     Uma forma para entender o Direito, que funciona, ocorre pela metáfora, que é o uso de uma palavra, expressão ou ideia em sentido diferente do próprio, por analogia ou semelhança. Assim, quem poderá ajudar? O poeta, o astrônomo ou o confeiteiro? Vamos lá:

01. "Amor é fogo que arde sem se ver". (Camões). O termo fogo mantém seu sentido próprio - desenvolvimento simultâneo de calor e luz, que é produto da combustão de materiais inflamáveis, como, por exemplo, o carvão - e possui sentidos figurados - fervor, paixão, excitação, sofrimento, etc.

02. No sistema solar, o Sol exerce influência sobre os demais astros e estes, influenciados, exercerão, igualmente, influência sobre o Sol. Basta supor que um planeta deixasse de existir e certamente o Sol ressentiria essa ausência.

03. Na confecção de um bolo de boa qualidade são necessários, além da habilidade do confeiteiro, ingredientes, também, de boa qualidade (trigo, sal, açúcar, ovos, manteiga, fermento, calor adequado, etc.). Se um desses ingredientes estiver corrompido, a qualidade do bolo terá sido afetada.

04. No caso do Direito, que também tem seus 'ingredientes' (Norma Jurídica, Justiça, Paz, Ordem, Certeza, Segurança, Liberdade, Equidade, etc.), se um ou alguns desses 'ingredientes' estiver corrompido, a qualidade do Direito pode estar comprometida, porque a ideia Direito implica várias outras. A norma ou regra escrita ou não (a fila, por exemplo), que estabelece critérios, deve ser necessária, útil, proporcional, adequada e isso é verificável em si mesma, independente do Direito. Caso essas qualidades estiveram corrompidas ou ausentes, o Direito sofrerá o impacto e a norma será inconstitucional., assim considerando a norma como conjunto (desde a maior até a menor).

05. Pois bem: a) Kelsen, na terceira idade, retificou, em parte, seu pensamento, acolhendo as teses neo-Kantianas, de H. Vaihinger, principalmente a que define as categorias como expedientes para a formulação rigorosa do discurso. Nesse sentido passou e entender a 'norma fundamental', fundamento último do direito positivo, como ficção e não como hipótese, como até então fora entendida; b) Kant, na consideração dos mundos do ser e dever ser, um contraposto ao outro, ou seja: o mundo dos fins, do valioso, e portanto da vontade, que entre os dois não há ponte de passagem; c) Hegel, todavia, buscou, pela dialética, unir e a identificar o ideal e a realidade, incluída a história, donde ter dito "Todo o racional é real, e tudo o que é real é racional"; c) e Aristóteles, na Metafísica, seguindo o princípio holístico, que " O todo é maior do que a simples soma das partes.". 

Logo, diante dessa sequência de raciocínio, dialeticamente considerado, se pode inferir, com segurança, que a norma fundamental ou grande norma kelseniana é o Direito.




terça-feira, 27 de agosto de 2013

O Falso conflito entre o Direito e a Lei

     Não pode haver conflito entre o Direito e a Lei por uma impossibilidade lógica. É que o conceito de Direito reina absoluto, não admite oposição. Não pode haver conflito onde não possa haver comparação. Talvez, a confusão reine em decorrência de se tratar Direito e Lei  como se sinônimos fossem. Entretanto, o Direito supõe o a Lei (norma, regra, melhor diríamos). Essa ideia ou conceito, é daquelas poucas, como, por exemplo, a é de Pai. Alguém poderia argumentar que pai tem seu oposto que seria mãe. Entretanto, isso não procede por mãe não ser posto de pai. Mãe é complemento de pai. Explica-se: a mãe unida ao pai leva à geração do filho. Outro poderia argumentar: filho é oposto de pai. Igualmente não procede porque o filho é uma derivação do pai e da mãe. Por outro lado, filho é sempre filho de pai e pai sempre será filho de alguém e filho sempre poderá ser pai de alguém. Para que possa haver conflito ou oposição é necessário que se possa fazer comparação. Entre Direito e norma não pode haver comparação porque o Direito implica a norma. Alguém, ainda, poderia argumentar dizendo: o fogo é oposto a água, ao que diríamos não, por ser impossível a comparação. É que o fogo possui características diferentes da água. O fogo, possui como características o calor e a expansão; enquanto a água possui características como o frio e a retração. Logo, não há como fazer comparação entre ambos. Entre esses conceitos todos há compatibilidade, não conflito ou oposição. É sabido, em lógica, que duas proposições são compatíveis quando podem ser simultaneamente verdadeiras. Por exemplo: Se "há números pares" e "há números impares"  são compatíveis; porém, se "todos os números são pares" e "nenhum número é par" são incompatíveis.

     Já advertido, em 1901, quando surgiu a "teoria do abuso do direito", sustentada por Porcherot (L´abus de Droit), definindo-o como o uso do direito dentro dos limites legais, entretanto, desviado de sua finalidade, sem levar em conta a critica de Planiol, condenando a nova teoria que em uma linguagem insuficientemente estudada, vinha ganhando adeptos, quando, a sua "fórmula, uso abusivo dos direitos, constitui uma logomaquia, porque, se exerço o próprio direito, o ato é lícito", e, sendo lícito, não pode ser abusivo, que supõe inexistência de direito. É preciso, advertiu, ainda, "não nos deixar ser enganado pelas palavras: o direito cessa onde o abuso começa, não podendo haver uso abusivo do direito pela razão irrefutável de um só e mesmo ato não poder ser, ao mesmo tempo, conforme o direito e contrário ao direito". Cada ato, cada obra, conforme o setor a que pertença, tem forma própria de justificação. O direito não foge a essa regra. Logo, se há abuso, aí já não há Direito.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

DIREITO, CULTURA E HERMENÊUTICA

     Em Paulo Dourado de Gusmão (Filosofia do Direito, Rio de Janeiro, Forense, 1994, p. 116/7), o tema está apresentado assim: "Entendido o Direito como pertencendo ao reino da Cultura, não é passível de explicação, própria do reino da Natureza. Dilthey, com razão, disse compreendermos as obras do espírito, enquanto explicamos a Natureza. Não explicamos uma sinfonia, um poema, mas os compreendemos, da mesma forma que compreendemos pelo sentido nelas oculto. Conhecimento pelo sentido oculto no objeto cultural denomina-se compreensão, que o jurista chama de interpretação.

     Mas, várias formas têm sido dada à compreensão desde que Dilthey a idealizou. Deve-se a Spranger, a nosso ver, as melhores reflexões a respeito desse modo de recriar espiritualmente o objeto cultural.

     Para nós, compreensão consiste em apreender o que se encontre por trás da aparência ou da exteriorização de sentidos em variadas formas de expressão cultural (comunicação verbal, lei, obra de arte, poema, romance, obra cinematográfica, etc.). No Direito, como fenômeno cultural, como objeto cultural que é, não cabe a explicação, mas a compreensão, ou seja, a interpretação. Mesmo quando o Juiz ou o advogado tentam explicar uma conduta, por exemplo um crime, para absolver ou condenar o acusado, não a explicam como fenômeno natural, mas como conduta carregada de sentido: no sentido agarra-se, com todos os seus argumentos jurídicos, o advogado para absolver ou reduzir a pena, da mesma forma o Promotor, para condenar, e o Juiz, para dosar a pena, quando cabível a condenação, ou, caso contrário, quando for o caso. Compreender pelo sentido, para o advogado, é justificar, enquanto para o Promotor, para condenar, e para o Juiz, admitir o dolo ou a culpa. Ambas não são explicações no sentido próprio, mas formas de compreensão, bem próximas da "compreensão genética" de Jasper. Não se conclua daí a impossibilidade de ao Direito aplicar-se a explicação, por ser cabível quando considerado como fato social, estudado nesse caso com o método sociológico, inclusive estatisticamente.". Daí decorre a disciplina acadêmica hermenêutica.