domingo, 26 de novembro de 2017

Fragmentos para uma aula de Direito

Acadêmicos de Direito! Rumo ao Sucesso!



Tu és eternamente responsável por quem cativas.” (O Pequeno Príncipe).

“Navegar é preciso; viver não é preciso.” (Pompeu – 106 – 48 a.C.).

“Para nós, advogados, que significa pedir justiça?” (Goffredo da Silva Telles Junior).

Ninguém acreditou nos fenícios quando eles afirmaram – 2000 anos antes de os Portugueses chegarem a África Ocidental -. Foram objeto de troça quando insistiram que, o Sol do meio-dia ficava ao norte. Todos os homens do mundo antigo sabiam que o Sol se encontrava sempre e invariavelmente na parte Sul do firmamento. Mesmo Heródoto, o grande historiador grego que escreveu a história dos Fenícios, 150 anos mais tarde, considerou esse relato um logro. No entanto, os Fenícios, povo aventuroso, realizaram de feto a viagem que descreveram. E a prova mais convincente de que o fizeram para os historiadores contemporâneos é exatamente a mesma afirmação que convenceu o mundo antigo da falsidade do relato: a referência de que viam o Sol à sua direita quando navegavam em direção a Oeste, contornando o Cabo da Boa Esperança. E diziam os Fenícios: o importante não é viver; o importante e navegar.

Nossa história é semelhante a dos Fenícios. Pois, quando do início do curso, havia os que não acreditavam na sua conclusão. A esses, provamos o contrário e aqui estamos como prova material da efetiva possibilidade inicialmente intuída. Alguém já sustentara que: “O Homem é dotado de inteligência e força de vontade. A inteligência é muito importante, pois nos dá a capacidade de escolher o que, para nós, é melhor. Mesmo assim é a força de vontade que nos faz caminhar, que faz vencer! Com ela, sentimos sempre a emoção de tentar acertar e errar e depois acertar. Somente desta forma conseguiremos vencer os desafios.

Nada de ilusão, será um dos nossos lemas. Ao iniciar a militância forense, recém saído (a) dos bancos acadêmicos, o ou a advogado (a) noviço (a) se depara com percalços e regras não escritas cuja existência não foi objeto de estudo no curso de ciências jurídicas. Enquanto não conscientiza, assimila e ultrapassa essas “esfinges”, corre o risco de assemelhar-se à figura da “barata tonta” com que Pitigrilli ironiza os advogados, debatendo-se desnorteado para resolver problemas processuais que os livros didáticos não mencionam, nem solucionam. Quando depois, consegue contornar as dificuldades, persiste ao lado da satisfação profissional pelos sucessos alcançados o travo amargo da lembrança das injustiças a que precisou se submeter, das humilhações que absorveu para solucionar os problemas legais do cliente. Assim, o livro de J. F. Oliosi da Silveira, advogado experiente e militante, longe de ser uma coletânea de queixumes dos causídicos, representa exposição de síntese das falhas da organização judiciária, de vez que os óbices que dificultam a atuação profissional do advogado resultam em última análise no desvirtuamento da finalidade primordial do 3º Poder da República, que é indubitavelmente a distribuição da Justiça aos cidadãos que a ele recorrem. Apesar dessas aporias, nada nos deterá. Assim é que, quando Eduardo Couture, escrevera “Os Mandamentos do Advogado”, no 10º - AMA A TUA PROFISSÃO, ele termina o texto - e nós vamos segui-lo – com a expressão dos versos de Wilhelm Meister, no poema imortal:
Se bem-vindo, jovem noviço!
Sê bem-vindo ao sacrifício!”, de nossa parte, sem sacrifício, evidentemente!

Antes de objetivarmos o estudo da atividade profissional do advogado, entendemos, de passagem, fazer uma necessária distinção entre ele e o bacharel, tema este que foi motivo de concurso por ocasião das comemorações do ano Sesquicentenário dos Cursos Jurídicos no Brasil, instituído pelo Egrégio Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

Antes, ainda, vale a pena ressaltar que o bacharel tem inúmeras possibilidades de exercício profissional. Segundo a literatura, há mais de 50 possibilidades. Há muitas possibilidades ainda inexploradas no Brasil. Por exemplo: o Direito e a arte; o romance jurídico etc.. Nos Estados Unidos, o Direito e a arte está bem desenvolvido. Lá existem mais de 50 filmes nesse domínio e a literatura, em cada estado, é imensa. Outro detalhe importante diz respeito a ingratidão (uma armadilha). Se o advogado não considerar que esse vício integra a profissão ele poderá ficar aborrecido com a profissão, enquanto que o problema não é com a profissão e sim com os usuários da arte. Logo, a questão é do outro, não do profissional.

Conceito – Distinção – Prerrogativas

Ao menos avisado pode parecer, em primeira vista, que os vocábulos “advogado” e “bacharel” são sinônimos. Não o são, de forma alguma. Bacharel, do francês, “bachelier”, em sentido lato, como usado, originariamente, em Portugal, distingue o indivíduo que cursou a Universidade, em qualquer especialidade. Outrora, no Brasil, o termo era usado para todo aquele que tivesse concluído o curso médio, ginasial. Com o passar do tempo foi se limitando aos cursos de Direito, Filosofia, Ciências e Letras. Na sua origem, a palavra francesa “bachelier” teria se formado do Latim “bacca lauri”, que significava “coroado de louros, com bagas” (Caldas Aulet, v. I, p. 478/9). Em sentido restrito, o vocábulo bacharel é usado, apenas para aqueles que concluem o curso de Direito. Não é aplicável a outras especialidades, como Engenharia, Medicina, Agronomia, Veterinária, por exemplo. O bacharel que, aprovado no exame de ordem, se inscreve na Ordem dos Advogados do Brasil, passa a denominar-se advogado, isto é, aquele que tem o direito de advogar, que significa, em termos mais amplos, a capacidade de ingressar em juízo. Etimologicamente, a palavra é derivada do Latim – advocatus. Como se vê, a distinção objetiva entre o bacharel e o advogado, é a inscrição na OAB, que só pode ser efetivada uma vez preenchidas certas formalidades legais, constantes do Estatuto próprio. A figura do advogado existe desde os tempos mais remotos. J. M. Carvalho Santos sintetizara, com objetividade, a evolução da advocacia na antiguidade, entendendo que “A justiça social, em verdade, considerava essencial e imprescindível a defesa do acusado, que, a princípio, era feita, na expressão de DUPIN, por um parente ou um amigo, que emprestava à ignorância ou à fraqueza o apoio de sua coragem ou de seu saber. Mais tarde, observa a ser turno LABORI, as necessidades da justiça exigiram que homens especializados, versados no conhecimento das leis, viessem se colocar ao lado dos litigantes, para assisti-los na reivindicação de seus direitos. Essa a origem da profissão de advogado, que, embora conhecida entre os Egípcios e os Persas, só na Grécia mereceu os cuidados de uma verdadeira organização. Em Roma, a advocacia se restringia, de início, ao patrono: o patrono encarregava-se de defender perante a Justiça os interesses de seus clientes, aos quais devia, além disso, proteção sob todos os outros pontos de vista”. Posteriormente, ainda em Roma, os advogados agrupavam-se em sociedade, denominada “colégios”. No Brasil, somente em 18 de novembro de 1930, a profissão passou a ser, efetivamente, regulamentada, por meio do Decreto nº 19.408, que criou a Ordem dos Advogados do Brasil. Durante o Império e parte do período republicano, a profissão existia sem qualquer regulamentação. A expressão legalmente habilitado significa a inscrição na Ordem.

O ADVOGADO E A ADVOCACIA

Os jornais, de forma corriqueira e repetida, dão notícias de manifestação da Ordem dos Advogados do Brasil quanto a lesões que se praticam, quase sempre impunemente, ao Direito e a aplicação da Justiça, nos mais diversos locais do mundo. Cumpre, assim, a OAB, com o importante dever de zelar pela dignidade da Justiça e pela intangibilidade do Direito. É um gesto, neste mundo de conturbações, tão arriscado quanto heroico. E, talvez, por essa missão absorvida, a entidade de classe preocupa-se mais com o Direito, a Justiça e a Advocacia, na sua forma ideal, transferindo para o advogado, como simples pessoa, a missão incumprível de enfrentar, sozinho, todas as adversidades que sua profissão se lhe impõe diuturnamente.

O ADVOGADO E A ARTE

O condenado, Henri Cherrièrre, no livro Papillon, bem reflete o pensamento daqueles que, por desconhecimento, emitem conceitos deformados da figura do advogado: “Dentro de alguns instantes serei julgado por homicídio. Meu advogado, Raymond Hubert, veio cumprimentar-me: ‘Não há qualquer prova contra você, tenho confiança, seremos absolvidos’. Acho graça nesse “seremos”. Como se ele, Doutor Hubert, fosse perante o tribunal como acusado e, se houvesse condenação, também tivesse que sofrê-la”. Realmente, é difícil para um leigo entender que o advogado, de certa forma, também participa da solução do processo, inclusive sofrendo a condenação.

O entendimento obscuro da missão do advogado não se limita, apenas, aos mais humildes ou aos condenados. Alan Hynd, conhecido escritor americano, no seu livro “Gênios do Crime” (a biografia de três famosos advogados americanos do norte – Real Rogers, Clarence Seward Darrow we William Josep Fallon), no prefácio, afirma: “Pois se não fosse por certos tipos de advogados – os advogados do crime, em todos os sentidos – muitos malfeitores pensariam duas vezes antes de infringirem uma lei qualquer. Com a ajuda de um advogado astucioso, muito bem remunerado, orador hábil, capaz de impingir as mais mirabolantes histórias a jurados simplórios, que se defrontam com políticos profissionais e sem talento, no papel de assistentes da promotoria, o criminoso frequentemente leva a melhor e o crime permanece impune”. Esse pensamento, grosseiramente primário, eis que ninguém praticaria um delito pelo simples fato de ter um bom advogado, lastimavelmente encontra eco em considerável parte da sociedade que, em face do esquema de pressão exercido sobre esse profissional, vai dele formando um conceito equivocado e altamente desprestigiante.

Conclui-se, desses raciocínios, que o criminalista, antes de prestar um serviço público, sóbrio, juntamente com a Magistratura e o Ministério Público, pela administração da Justiça, é o responsável direito pela delinquência que, hoje, é uma indisfarçável calamidade social. E isso se diz impunemente, como se verdade fosse, como se os jornais não noticiassem, diariamente, o sequestro e o homicídio de advogados quando no cumprimento do seu dever de defesa, em regra exercido contra os fortes e os poderosos.

Como ensinara J. M. Carvalho Santos: “A missão do advogado é das mais nobres. Exige competência, dignidade, honradez e bravura moral da parte de quem se propõe a desempenhá-la. Às vezes toca às raias do sublime essa missão, quando visa a defesa dos fracos, quando é exercida gratuitamente em prol do direito de pessoas miseráveis, quando traduz a irrestrita dedicação à causa da liberdade e da democracia. Como quer que seja, é sempre nobre essa profissão, cujo exercício outra coisa não visa senão fazer triunfar o direito, a verdade e a justiça”.

O ADVOGADO E O PODER JUDICIÁRIO

Enquanto a violência e a coação ocorrem, e ocorrem com repetição estarrecedora, a Advocacia, como “expressão da defesa dos direitos humanos”, está, naturalmente, sendo atingida, mas quem sofre a rudeza do golpe, quem é desumanamente ferido pela arbitrariedade, é a pessoa do advogado em todos os sentidos. Sempre houve e, hoje mais acentuadamente há, uma tendência indisfarçável de se calar o advogado que representa, em última instância, o protesto sentido e a repulsa heroica contra toda violência. Contraditoriamente, a Magistratura e o Ministério Público não possuem a necessária independência para o protesto formal e frontal. O advogado, sim, tem condições para exercer essa faculdade, embora pague, não poucas vezes, com sacrifício próprio, o preço do seu protesto e do seu atrevimento. E ao assim proceder não está zelando, apenas, pela conservação de um direito seu, mas pela integridade do próprio Poder Judiciário. Com efeito, já foi dito em 1974 e continua atual: “Percebe-se, então, que a crise da advocacia é, em parte, o sinal de enfraquecimento do próprio Poder Judiciário. O advogado integra a administração da Justiça. Há sofrimento global. Existe uma só diferença: uns detém, ainda, a condição de apontar falhas e buscar melhorias; outros não”. (Publicação da OAB-SP, 1974, p. 2). E isso se dá por um motivo relevante: o advogado não está subordinado a qualquer hierarquia.

O ADVOGADO – DIREITO DE ACESSO A REPARTIÇÕES PÚBLICAS

A advocacia é serviço público igual aos demais prestados pelo Estado. O advogado não é mero defensor de interesses privados. Tampouco é auxiliar do Juiz. Sua atividade, como particular em colaboração com o Estado, é livre de qualquer vínculo de subordinação para com Magistrados e agentes do Ministério Público. O direito de ingresso e atendimento em repartições públicas – (...) – pode ser exercido em qualquer horário, desde que esteja presente qualquer servidor da repartição. A circunstância de se encontrar no recinto da repartição – no horário de expediente ou fora dele – basta para impor ao serventuário a obrigação de atender ao advogado. A recusa de atendimento constituirá ato ilícito. Não pode o Juiz vedar ou dificultar o atendimento de advogado, em horário reservado a expediente interno (STJ, Ac. 1ª T, DJU-I, 23.3.92, RMS-1.275-RJ, Rel. Min. Gomes de Barros).

O ADVOGADO E O CLIENTE

O eterno problema das relações advogado-cliente, na cobrança de honorários, é dos que deixam marcas mais profundas no exercício da profissão. A dificuldade, aliás, é extranacional. Por isso alguns cuidados devem ser tomados.

O advogado e o médico são os únicos profissionais liberais que contatam com o homem, sempre, em condições patológicas, anormais. O paciente, ao procurar o facultativo, comumente, é portador de uma enfermidade psicossomática. Reivindica, desesperadamente, sua cura. O médico torna-se receptáculo de um processo reivindicatório intenso. Diferente não é a posição do advogado. O cliente lhe chega às mãos sofrendo de um mal psicossocial. Nas mãos do facultativo, o paciente deposita sua saúde, sua vida, mesmo. Ao advogado, o cliente confia seu patrimônio e, não raro, sua liberdade. Está em pânico, e o profissional, queira ou não, absorve, suporta toda a carga emotiva que lhe é transferida ou, pelo menos, com ele divide. Outras atividades profissionais não exigem tanto do profissional. O relacionamento advogado-cliente também é dificultado pela dependência que sua atividade, sempre, tem com terceiros. E o fundamental, que é a sentença, foge da influência do advogado e, dependente do juiz, produz na parte e seu procurador insuportável e angustiante insegurança. Em princípio, tem o advogado que expor ao cliente o problema da morosidade judicial. Precisa tato, eis que se culpa o Poder Judiciário para justificar a demora ou a decisão incorreta, violenta-se, pois confessa a falência do órgão para o qual e em função do qual está seu ideal e sua atividade profissional (o perigo do fogo amigo). Se não é feliz nas suas explanações, assume o ônus de parecer negligente. Em face desses problemas, é comum que o profissional assimile a dramaticidade da situação do cliente e, incorporando a angústia, passe a sofrer a resultante de todos os casos postos a seus cuidados. Dizia um velho e experiente advogado: “O problema do cliente não se põe aqui (apontava para o coração), mas aqui (e apontava para a cabeça)”. No entanto, isso não é fácil e, por consequência, torna-se um candidato natural ao enfermo. Vive em torno dos problemas alheios e toda sua atividade é dirigida no sentido de solucioná-los. Problemas não se trancam em cofres nem se colocam nas gavetas dos arquivos mortos; acompanham o profissional até no convívio familiar, produzindo, muitas vezes, insuportável tensão com sérias consequências psicossomáticas. Vezes há que, em face de uma justa sentença contrária, tem o profissional que suportar incompreensões oriundas do desencanto e do desespero do seu defendido. E não raro, os honorários, que é o que de concreto fica do cliente, como dizia Couture, numa conferência no Sul, depois de resolvida a questão, sofrem inaceitáveis procrastinações, forçando o profissional a constituir advogado para ressarcir-se dos danos. Cabe, portanto, ao profissional prever essa situação e procurar prevenir-se. Fato comum, ainda a respeito dos honorários, ocorre por ocasião de acordos. As partes, sempre com a assistência direta dos procuradores, após debates e propostas recíprocas, chegam a um acordo. Então, comumente, acontece um desagradável constrangimento ao profissional. Nenhuma das partes quer acertar os honorários, e o advogado passa a sentir-se culpado pela não ultimação do acordo. E termina, violentado, cedendo e aceitando valor muito aquém do merecido. No crime, então, o problema é crucial: preso, o cliente é liberal; solto, é avaro. Criou-se uma prática altamente prejudicial e desconfortável: o chamado contrato de risco. Essa prática faz com que o advogado fique sócio do cliente. Assim o respeito entre sócios não o mesmo que pautar o respeito entre cliente e advogado. Se se é sócio, pendente do resultado, fica o advogado obrigado a suportar inúmeras indelicadezas. Por outro lado, como o advogado só receberá ao final e durante a demora do processo fica ele sem os recursos necessários para tocar a causa. Também quando termina, vem aquela polêmica sobre o valor dos honorários e também tem repercussão quando a causa termina ou pode terminar por acordo. Então: cautela é de bom proveito com esse tipo de contrato. Advogado não é investidor para correr riscos com o resultado do próprio trabalho. Quem tem de correr riscos é o cliente. O risco da demanda é do cliente. Até porque, não raro, a versão do cliente nem sempre é consistente. Outro ponto, diz respeito ao substabelecimento: clientes sem pudor, depois de muito trabalho por parte do advogado, eles aparecem com alguma desculpa para que o advogado deixe o caso para outro.

O ADVOGADO E O ADVOGADO

Falou-se do perigo que corre o advogado de incorporar o problema que aflige ao seu constituinte. Os jovens são mais sensíveis a essas influências. Por isso, é comum que o advogado noviço, unido, emocionalmente, ao seu cliente, muitas vezes não consiga distinguir bem a parte adversária do colega adverso; e, misturando as coisas, crie conflito entre os profissionais. O fato, embora compreensível, é lamentável. A luta é constante na atividade profissional, e muito mais será se além do problema trazido pelo constituinte, ainda tenha o advogado que enfrentar discórdias com os colegas. Dizem os mais experientes, repudiando essa agressividade profissional, que “os clientes passam e os colegas ficam”. De certa feita, um advogado do interior, referindo-se a esse problema, afirmava que se deve fazer da advocacia um meio de vida, não um meio de morte.

Assim é que o relacionamento entre os advogados, que aqui é tão palidamente explorado, é tema complexo e merecedor de maior estudo e reflexão. Um fato que motiva, também, desentendimentos entre colegas é a obrigação do advogado de, na defesa do seu cliente, ser compelido a atingir, de certa forma, o seu colega quando contesta os honorários. É uma situação extremamente delicada para o profissional. No entanto, existe e gera problemas. Um tema que poderia ser enfocado aqui, é que diz respeito à concorrência desleal. O conchavo com funcionários da Justiça e o aviltamento dos honorários profissionais na busca de vencer a constante concorrência, tem criado sérios dramas e só tem servido para desmotivar e desvalorizar a profissão.

Em todas as áreas de atuação, os desafios são parecidos e requerem bastante cuidados. Na área criminal, na fase do inquérito ou em juízo, o erro judiciário, o criminalista sofre pressões; na área cível, aqui, reina um deus impiedoso e sem entranhas: o dinheiro. E este soberano encarrega-se de dar o toque de sutileza necessário. Com o desenvolvimento da indústria, do comércio e dos serviços, os empreendedores passaram a perceber que não podiam prescindir de constante assistência jurídica, sob pena de irreparáveis danos. Eis que a legislação, especialmente fiscal, tributária, trabalhista, previdenciária, ambiental etc., desenvolveram-se em ritmo acelerado e descortinaram-se, assim, campos férteis para o exercício profissional.

A CARACTERÍSTICA ÉTICO-POLÍTICA ESSENCIAL

O bacharel em Direito, qualquer que venha a ser a atividade profissional que exerça, tem uma relação profunda e indelével com uma questão nuclear: a consciência jurídica. Escrevera Cesar Luiz Passold (O Advogado e a Advocacia): “Na minha concepção, consciência jurídica é a noção clara, precisa, exata, dos direitos e dos deveres que o indivíduo deve ter, assumindo-os e praticando-os consigo mesmo, com seus semelhantes e com a Sociedade. Portanto, a consciência jurídica, num primeiro momento, é a noção explícita que alguém detém a respeito de seus direitos e obrigações. Trata-se, nesta dimensão, de uma filosofia, de uma metafísica, e, sobretudo, de uma atitude ético-política. A consciência jurídica, num segundo momento, requer aquilo que denomino elemento consequente, ou seja, o fato de que ela deve implicar em prática efetiva de direitos e deveres. Trata-se, agora, de uma vivência, de uma práxis coerente com a atitude, com a noção. E é justamente a distância entre a noção e seu elemento consequente o grande problema a ser enfrentado por todos nós. É preciso enfatizar que a consciência jurídica tem uma função importantíssima no confronto entre Estado e Sociedade, porque é através dela que se tem probabilidades concretas da devida conciliação entre a criatura (o Estado) e a criadora (a Sociedade). Em todos os países a noção da consciência jurídica é fundamental, enquanto o seu elemento consequente é estratégico, mas nos subdesenvolvidos, como é o caso do Brasil, ela é essencial para a efetivação da Justiça (na sua tríplice dimensão: comutativa, distributiva e social) e para a consolidação da Democracia. Não considero uma leviandade o afirmar que a maior parte dos graves problemas nacionais, acumulados ao longo de nosso processo histórico, se deve ao fato de que, aqui, não se tem o hábito de cultivar a consciência jurídica e, em decorrência, ela não é devidamente vivenciada, praticada. Mas o leitor deve perguntar-se: quem são (ou devem ser) os detentores da consciência jurídica? A resposta é que todos os indivíduos que vivem numa sociedade deveriam deter a consciência jurídica, quer no plano conceitual – isto é, possuir a noção clara e precisa de seus direitos e deveres -, quanto no do seu elemento consequente – ou seja, no aspecto vivencial, prático. A indagação que merece ser feita agora é: quem tem o dever de ser o principal estimulador, o grande difusor e o garantidor da noção e da prática da consciência jurídica? A resposta é: indiscutivelmente o bacharel em Direito! Em todos os diversos papéis profissionais que ele pode desempenhar, o bacharel em Direito detém, sem dúvida, uma função social específica. Tal função social se consagra no seu dever inarredável de ser o estimulador, o difusor e o garantidor, qualquer que seja a possibilidade profissional que esteja exercendo, da noção e da prática da consciência jurídica. Aliás, o bacharel em Direito é o único profissional de nível superior que detém tal função social. Esta constatação aumenta imensamente a sua responsabilidade pessoal e profissional. [...] Jurista, na minha concepção, é aquele que tem noção da sua função social decorrente da condição de bacharel em Direito e, com vigor, a prática. Enfatizo: o que chancela um jurista não é o número de livros por ele publicados ou o seu renome nacional ou internacional. O que confere a um bacharel em Direito, qualquer que seja o papel social que exerça, a condição especial e honrosa de jurista é o fato de ele, muito aplicadamente, deter a noção, praticar, estimular, difundir e empenhar-se pela existência da consciência jurídica e de suas consequências no meio em que vive e em que exerce a sua profissão. Diante disso, é natural que a nossa preocupação se volte imediatamente para a maneira como deve ser desenvolvida a formação do bacharel em Direito, de tal forma que ele seja despertado, estimulado e informado sobre os direitos e deveres, estes vistos não apenas como regras constantes em dispositivos constitucionais, legais ou regulamentares, mas, e sobretudo, considerados como elementos essenciais à vida social na qual preponderam, realmente, a Justiça e a Democracia. Isto é, a que concepção fundamental deve obedecer o ensino jurídico para que possa produzir o bacharel em Direito que venha a ser realmente jurista, seja ele Advogado, Magistrado, Delegado de Polícia, Promotor de Justiça, etc.? Penso que o ponto basilar desta questão é a colocação da consciência jurídica como tema central de todo o processo de aprendizagem. Este deve desenvolver-se de forma a que ocorra uma constante realimentação entre e teoria e a prática jurídicas. É necessário um pensar crítico responsável a respeito da relação entre a teoria e a prática jurídicas. Sem isto, o curso de Direito forma “engenheiros legais”, que podem ser competentes e eficientes, mas com função social limitada. O desenvolvimento da consciência jurídica pelo acadêmico de Direito é, acima de tudo, fruto de um compartilhado ato de vontades. A primeira vontade não é do professor nem da direção da faculdade. É do aluno, porque ele é o sujeito do processo educacional. Toda a estrutura educacional só tem sentido se o aluno for o seu centro. Em consequência, a vontade predominante para que se absorva e se exercite a consciência jurídica, já durante o desenrolar do curso, deve ser a do aluno. E quais são os requisitos para o exercício desta vontade? O acadêmico de Direito tem que deter uma constituição cultural muito peculiar: ele deve constituir-se num ser pesquisador, num ser reflexivo, num ser político. Ser pesquisador significa dedicar-se com muito afinco à investigação cultural, ampliando as suas fontes bibliográficas, lendo muito, quer o direito positivado, quanto a doutrina e a jurisprudência, sem descuidar de aumentar o seu vocabulário, e não apenas o pertinente ao tecnicismo jurídico; isto tudo, sem descuidar das leituras que lhe possam fornecer uma percepção a mais completa possível da vida em Sociedade. Ser reflexivo implica em receber os conhecimentos – todos – sempre com uma atitude crítica responsável, vale dizer, perquirindo e buscando os fundamentos de ordem valoral que estejam a sustentar as informações, sem desrespeitar a ordem constituída. Ser político significa assumir, coerente e consequentemente, a postura de indivíduo que tem compromissos claros e sólidos com a Sociedade na qual está inserido, agindo no sentido de que o poder seja exercido sempre sob a égide do interesse coletivo, do bem comum. Com esta tríplice característica, o acadêmico de Direito conseguirá exercitar-se e desenvolver as capacidades da crítica inteligente e responsável, do conhecimento apurado e da noção de sua função social, equipamento com o qual ele haverá de se tornar um cidadão útil à sociedade. Enquanto for aluno, se portador da tríplice constituição, o acadêmico de Direito tem melhores condições de desempenhar-se eficazmente no correto processo de ensino/aprendizagem. Neste, professores e alunos somam o aprendizado, e não se confrontam no aprendizado. A relação entre ambos deve ser, insisto, de soma, e nela o professor exercerá o papel de coordenador do processo, na medida em que estimula o aluno e lhe abre as portas do conhecimento. Tal é, aliás, aberta a porta da aprendizagem, empenhar-se na absorção dos conhecimentos, reflexivamente, politicamente, como um meticuloso pesquisador. O resultado disto será, sem dúvida, a formação não apenas de um bacharel em Direito, mas sim de um verdadeiro jurista, isto é, do estimulador, do difusor e do garantidor da consciência jurídica do país.”.

Coincidiu a fala do autor (país) com o nosso interesse, e, neste momento, vamos lembrar Rui Barbosa: “A Pátria não é ninguém, são todos; e cada qual tem no seio dela o mesmo direito à ideia, à palavra, à associação. A Pátria não é um sistema, nem um monopólio, nem uma forma de governo: é o céu, o solo, o povo, a tradição, a consciência, o lar, o berço dos filhos e o túmulo dos antepassados, a comunhão da lei, da língua e da liberdade. Os que a servem são os que não invejam, os que não conspiram, os que não sublevam, os que não desalentam, os que não emudecem, os que não se acobardam, mas resistem, mas ensinam, mas esforçam, mas pacificam, mas discutem, mas praticam a justiça, a admiração, o entusiasmo. Porque todos os sentimentos grandes são benignos e residem originariamente no amor.”.

Do que exposto, é possível entender que se trata de moral. Moral é diferente de moralismo. Moral é prática e ação. Moralismo é apontar defeitos nos outros. O bacharel em Direito é um ser moral e pratica a moralidade. A moralidade é não provocar constrangimentos. Daqui podemos chegar na Ética.

A Ética consiste na busca, na pesquisa, no estudo do conhecimento dos meios adequados para atingir o objetivo em plena liberdade. Ética cuida da teoria, do estudo. A moral cuida da prática. Ética é epistemologia, conhecimento. Assim como a Hermenêutica é a teoria e a Interpretação é a prática. Qual o objetivo almejado pelo bacharel em Direito?

DIREITO – JUSTIÇA – FELICIDADE

“Poucas questões respeitantes à sociedade humana têm sido postas com tanta persistência e têm obtido respostas, por parte de pensadores sérios, de formas tão numerosas, variadas, estranhas e até paradoxais como a questão <O que é o direito>” (Herbert L. A. Hart). O que é direito? Uma das tarefas mais simples e, ao mesmo tempo, mais difíceis do mundo é dar uma definição do direito. Tarefas simples: todos os manuais de direito apresentam uma definição do direito e qualquer estudante ou profissional da área jurídica pode oferecer sua própria definição. Tarefa difícil: nunca houve nem haverá uma única definição do direito. [...] O direito faz parte dos conceitos controvertidos porque a sua definição está vinculada a ideias filosóficas e políticas que possuem forte carga emotiva e em relação às quais não fácil obter um acordo. O estudante do direito deve aceitar essa realidade. Direito significa sempre controvérsia. E já que as pessoas entendem o direito de várias formas é de se esperar que sobre os problemas concretos de sua aplicação haja muitas opiniões, conflitos e contestações. [...]. Estudamos dezoito definições do direito que foram dadas nos últimos vinte e quatro séculos, por vários autores” (Dimitri Dimoulis – Manual de IED). A dele: “O Direito é o conjunto de normas que objetivam regulamentar o comportamento das pessoas na sociedade. Essas normas são editadas pelas autoridades competentes e preveem, em caso de violação, a imposição de penalidades por órgãos do Estado.”. A nossa: O Direito consiste no resultado do processo cultural intelectual (histórico, contextual e social), tendo por fontes leis, sentenças, contratos, costumes, princípios, valores, analogias, mitos (dogma), ficções, presunções, símbolos, decorrentes do conhecimento, do reconhecimento (= aceitação: aceito como vinculante pelos afetados), da vontade e do poder, para atender a objetivos práticos (dirigir ações).

Da mesma forma, há dificuldades com relação às concepções de Justiça. Mesmo assim, Chaim Perelmam (Ética e Direito, São Paulo, Martins Fontes, 2002), nos dá um norte apresentando seis concepções de Justiça, dependendo do objetivo almejado. Dissera ele: “É ilusório querer enumerar todos os sentidos possíveis da noção de justiça. Vamos dar, porém, alguns exemplos deles, que constituem as concepções mais correntes da justiça, cujo caráter inconciliável veremos imediatamente:

1.     A cada qual a mesma coisa. Segundo essa concepção, todos os seres considerados devem ser tratados da mesma forma, sem levar em conta nenhuma das particularidades que os distinguem.
2.     A cada qual segundo seus méritos. Eis uma concepção da justiça que já não exige a igualdade de todos, mas um tratamento proporcional a uma qualidade intrínseca, ao mérito da pessoa humana.
3.     A cada qual segundo suas obras. Essa concepção da justiça tampouco requer um tratamento igual, mas um tratamento proporcional. Considera o resultado da ação.
4.     A cada qual segundo suas necessidades. Essa fórmula da justiça, em vez de levar em conta méritos do homem ou de sua produção, tenta sobretudo diminuir os sofrimentos que resultam da impossibilidade em que ele se encontra de satisfazer suas necessidades.
5.     A cada qual segundo sua posição. Eis uma fórmula aristocrática da justiça. Consiste ela em tratar os seres não conforme critérios intrínsecos ao indivíduo, mas conforme pertença a uma ou outra determinada categoria de seres.
6.   A cada qual segundo o que a lei lhe atribui. Esta fórmula é a paráfrase do célebre cuique suum dos romanos. Se ser justo é atribuir a cada qual o que lhe cabe, cumpre, para evitar um círculo vicioso, poder determinar o que cabe a cada homem. Se atribuirmos à expressão “o que cabe à cada homem” um sentido jurídico, chegamos à conclusão de que ser justo é conceder a cada ser o que a lei lhe atribui. Esta concepção nos permite dizer que um juiz é justo, ou seja, íntegro, quando aplica às mesmas situações as mesmas leis. Ser justo é aplicar as leis do país. Tal concepção da justiça, contrariamente a todas as precedentes, não se arvora em juiz do direito positivo, mas se contenta em aplicá-lo. É evidente que essa fórmula admite em sua aplicação tantas variantes quantas legislações diferentes houver. Cada sistema de direito admite uma justiça relativa a esse direito. O que pode ser justo numa legislação, pode não o ser numa legislação diferente: com efeito, ser justo é aplicar, ser injusto é distorcer, em sua aplicação, as regras de um determinado sistema jurídico. E. Dupréel opõe essa concepção a todas as outras. Qualifica-a de “justiça estática”, por ser baseada na manutenção da ordem estabelecida, e lhe opõe todas as outras consideradas como as formas da “justiça dinâmica”, por poderem trazer a modificação dessa ordem, das regras que a determinam. “Fator de transformação, a justiça dinâmica se mostra um instrumento do espírito reformador ou progressista, como ele se autodenomina. A justiça estática, propriamente conservadora, é fator de fixidez.”.
O maior objetivo do homem, e há consenso nisso, é alcançar a felicidade e como a felicidade implica a Justiça, que por sua vez tem como instrumento de acesso o Direito, [um acadêmico interrompe: Professor! Pois não! Podemos encerrar com o que foi dito para nós no início? E acrescentou: “Tu és eternamente responsável por quem cativas.”]. Concordo plenamente! Encerremos então com um texto “DESIDERATA”, escrito por um filósofo e advogado.
A palavra “Desiderata” vem do Latim e significa “coisas que são desejadas”. Também é o título de um famosíssimo poema, que se tornou particularmente conhecido durante os anos sessenta, junto com o movimento hippie. O texto é uma reunião de sábios conselhos que deram a volta ao mundo inteiro, pela precisão de suas ideias e pela profundidade de seu conteúdo.
Em um dado momento, surgiu todo um debate sobre a origem desse poema. Em torno do texto foi criada a lenda de que havia sido escrito por um monge anônimo e que havia sido encontrado sobre o banco de uma igreja em Baltimore, há duzentos anos. De acordo com esta versão, o poema teria sido escrito no ano de 1692.
Na verdade, tudo se tratava de um equívoco. O autor de “Desiderata” foi o filósofo e advogado Max Ehrman. Mas o texto não foi publicado em vida; só foi a público em 1948, quando sua esposa publicou seus poemas de forma póstuma.
O erro surgiu porque, por muitos anos, ‘Desiderata’ foi um poema que passou de mão em mão, como uma espécie de ato de boa vontade. Transformo-se em algo como uma proclamação; buscava-se que quem o recebesse praticasse tudo que estava escrito ali.
Muitos resolveram omitir o nome do autor, e foi assim que chegou às mãos de um pastor de Maryland, que compilou vários textos para fazer uma edição especial de Natal. Dentro destes textos estava o ‘Desiderata’ e, ao lado do nome, o presbítero anotou uma legenda: “Igreja de Saint Paul, 1692”. Ele só escreveu estes dados para identificar seu tempo e o ano de fundação do mesmo.
Alguém da congregação ficou encantado com o poema e pediu que um jornal o publicasse. Assim aconteceu, então, a popularização do erro que dizia ser um texto de 1692 que havia sido encontrado na Igreja de Saint Paul.
Seja como for, a verdade é que se trata de um lindo texto que foi traduzido para mais de 70 idiomas.
Este é o texto desse maravilhoso poema:
“Vá placidamente por entre o barulho e a pressa e lembre-se da paz que pode haver no silêncio.
Tanto quanto possível, sem sacrificar seus princípios, conviva bem com todas as pessoas.
Diga a sua verdade calma e claramente e ouça os outros, mesmo os estúpidos e ignorantes, pois eles também têm sua história. Evite as pessoas vulgares e agressivas, elas são um tormento para o espírito.
Se você se comparar aos outros, pode tornar-se vaidoso ou amargo, porque sempre existirão pessoas superiores e inferiores a você.
Usufrua de suas conquistas, assim como seus planos. Manter-se interessado em sua própria carreira, mesmo que humilde, é um bem verdadeiro na sorte incerta dos tempos.
Tenha cautela em seus negócios, pois o mundo é cheio de artifícios, mas não deixe isso te cegar à virtude que existe. Muitos lutam por ideais nobres e por toda parte a vida é cheia de heroísmo.
Seja você mesmo. Sobretudo, não finja afeições.
Não seja cínico sobre o amor, porque apesar de toda aridez e desencantamento, ele é tão perene quanto a relva.
Aceite gentilmente o conselho dos anos, renunciando com benevolência às coisas da juventude.
Alimente a força do espírito para ter proteção em um súbito infortúnio. Mas não se torture com temores imaginários. Muitos medos nascem da solidão e do cansaço.
Adote uma disciplina sadia, mas não seja exigente demais. Seja gentil consigo mesmo.
Você é filho do Universo, assim como as árvores e as estrelas. Você tem o direito de estar aqui.
E mesmo que não lhe pareça claro, o Universo, com certeza, está evoluindo como deveria.
Portanto, esteja em paz com Deus, não importa como você O conceba.
E, quaisquer que sejam as suas lutas e aspirações no ruidoso tumulto da vida, mantenha a paz em sua alma.
Apesar de todas as falsidades, maldades e sonhos desfeitos, este ainda é um belo mundo. Alegre-se. Empenhe-se em ser feliz!”











domingo, 12 de novembro de 2017

Dogmática e Zetética



IED – Aula 14/11/2017. ELEMENTOS DE DISCURSO ENQUANTO DISCUSSÃO, FUNÇÕES PRAGMÁTICAS. ZETÉTICAS E DOGMÁTICAS.

Não há nada de errado com aqueles que não gostam de Política. Simplesmente serão governados por aqueles que gostam.” (Platão). O mesmo pode ser dito com relação àqueles que gostam de estudar e àqueles que não gostam.

(Fontes: Tércio Sampaio Ferraz Jr., Introdução ao Estudo do Direito, São Paulo Atlas, 1996 e Direito, Retórica e Comunicação; José Cretella Júnior e José Cretella Neto, 1.000 Perguntas e Respostas de Introdução ao Estudo do Direito, Rio de Janeiro, ABDR, 2010)

“O estudo da disciplina Introdução ao Estudo do Direito – IED, matéria lecionada no 1º ano das Faculdades de Direito do País, é de fundamental importância para todo o restante do Curso, pois visa ao entendimento de conceitos-chave, sem os quais o estudante terá dificuldades em acompanhar as demais disciplinas. Para sermos mais exatos, diremos que não apenas os alunos dos cursos jurídicos, mas todos os profissionais do Direito precisam ter sólida base teórica a respeito desses conceitos-chave, desde os múltiplos significados da palavra “direito” até o conceito de lei, de Estado, pessoa, sujeito, crime, cidadão, contrato, casamento, adoção, alimentos e muitos outros, com os quais o jurista convive diariamente.

O enfoque moderno da disciplina Introdução ao Estudo do Direito orienta-se por uma análise crítica da Ciência do Direito. Privilegia-se, por certo, o enfoque dogmático, isto é, o estudo de cada ramo do Direito, porém efetuado por meio de reflexão zetética, a qual permite entender de que modo a dogmática jurídica cria, conhece, interpreta, altera e aplica o Direito, além de mostrar-lhe as limitações. A dogmática estuda o fenômeno jurídico, como sistema fechado, pelo método dedutivo; a zetética estuda o fenômeno jurídico, como sistema aberto, pelo método indutivo.

Zetética (do grego zetetiké = a arte de procurar; zetein = indagar, perquirir) é o método de investigação que consiste no incentivo à busca incessante de novos conhecimentos, com base em um ceticismo radical.

Dogmática (do grego dogma, dokein = doutrinar, ensinar, pelo latim dogma) é um método de investigação que consiste na explicação de fenômenos com base em pontos fundamentais e indiscutíveis de uma doutrina ou sistema.

O enfoque zetético visa a saber o que é uma coisa, colocando em dúvida as opiniões, inclusive as premissas da investigação, ou seja, tem caráter nitidamente especulativo; o enfoque dogmático releva o ato de opinar e ressalvar algumas de suas opiniões, tendo caráter diretivo explícito; parte de premissas inatacáveis. O primeiro é mais aberto, e as questões zetéticas, infinitas; o segundo é mais fechado, e as questões dogmáticas, finitas. De certo modo, no primeiro, há inovação; no segundo, não há.

O enfoque zetético também adota pontos de partida, ainda que as premissas sobre as quais se assenta sejam consideradas verdadeiras de forma precária e provisória. É o caso da Sociologia do Direito, divisão da Sociologia que parte da premissa de que o fenômeno jurídico é fenômeno social. Por exemplo: a Filosofia revela-se como um saber especulativo, desvinculado de compromisso direito e imediato com a ação, enquanto a Teologia busca orientar a ação dos seres humanos com relação a Deus, partindo da premissa de que Deus existe. O enfoque da Filosofia é zetético, pois pode por em dúvida a existência de Deus, e também se a própria questão de sua existência se reveste de algum sentido. O enfoque da Teologia é dogmático, pois não questiona a existência de Deus nem o sentido de se perquirir sobre sua existência. Se for Teologia de uma religião específica, irá considerar determinado livro como sagrado (Bíblia, Alcorão), funcionando como fonte importante de conhecimento.

No estudo do fenômeno jurídico emprega-se tanto o enfoque zetético quanto o dogmático, conforme a ciência que o tome por objeto: algumas delas empregam o primeiro método, outras, o segundo.

Algumas disciplinas que tem por objeto o estudo do fenômeno jurídico e empregam o método zetético são aquelas que investigam o Direito no âmbito de disciplinas gerais, tais como a Sociologia, a Filosofia, a História e a Psicologia, campos do conhecimento que tem, cada qual, como subdivisão, espaços destinados à investigação jurídica. Trata-se, respectivamente, da Sociologia Jurídica, da Filosofia do Direito, da História do Direito e da Psicologia Forense.

Algumas das ciências que tem por objeto o estudo do fenômeno jurídico e empregam o método dogmático são a Criminologia, a Penalogia e a Teoria da Legislação.

Quanto aos limites da investigação a zetética jurídica é classificada em zetética empírica e zetética analítica. Zetética jurídica empírica é aquela realizada dentro dos limites da experiência. Ex. investigação sobre a Constituição de um país com vistas à sua realidade social, política e econômica. Zetética jurídica analítica é aquela realizada de modo a ultrapassar os limites da experiência, chegando ao nível formal da lógica ou da metafísica. Ex. investigação sobre a Constituição de um país com vistas a determinar seus pressupostos lógicos, ou a avaliar seu papel como norma fundamental naquele ordenamento jurídico. Quanto à aplicação técnica dos resultados da investigação, a zetética jurídica empírica é classificada em zetética jurídica empírica pura e zetética jurídica empírica aplicada. Zetética jurídica empírica pura é aquela realizada com finalidade meramente especulativa, desvinculada de qualquer aplicação. Utilizam esse método a Sociologia Jurídica, a Psicologia Jurídica e a Economia Política, dentre outras disciplinas. Zetética jurídica empírica aplicada é aquela realizada com o sentido de conhecer determinado objeto com a finalidade de mostrar como atua. Ex. estudo das constituições com o objetivo de aplicar técnicas de solução jurídica de conflitos intersubjetivos. Utilizam esse método a Psicologia Forense, a Medicina Legal e a Criminologia, dentre outras disciplinas. Quando à aplicação técnica dos resultados da investigação, também a zetética jurídica analítica é classificada em zetética jurídica analítica pura e zetética jurídica analítica aplicada. Zetética jurídica analítica pura é o estudo dos pressupostos últimos do fenômeno jurídico, incluindo a crítica dos fundamentos formais e materiais do objeto estudado. Utilizam esse método, dentre outras disciplinas, a Filosofia do Direito, a Lógica Formal das Normas e a Metodologia Jurídica. Zetética analítica aplicada é o estudo da instrumentalidade dos pressupostos últimos do fenômeno jurídico, ou seja, de seu funcionamento e aplicação à realidade. Utilizam esse método, dentre outras disciplinas, a Teoria Geral do Direito e a Lógica do Raciocínio Jurídico. Algumas das disciplinas que tem por objeto o estudo do fenômeno jurídico e empregam o método dogmático são aquelas que tratam do fenômeno jurídico dentro de limites arbitrários, no sentido de que estes limites resultam de uma decisão a respeito das premissas que servem de base, e que são determinadas por meio do vínculo com o objeto. Ex. o Direito Civil, o Direito Empresarial, o Direito Administrativo e o Direito Internacional, dentre outras. As disciplinas que empregam o método dogmático jurídico obedecem ao princípio da proibição da não-negação (ou princípio da inegabilidade dos pontos de partida). Esse princípio determina que os pontos de partida da séries argumentativas devem ser adotados como absolutos e imutáveis, isto é, não sujeitos a questionamento. Ex. o princípio constitucional da legalidade, que impõe a todos, na sociedade, comportamento segundo os ditames da lei. O jurista, do ponto de vista dogmático, adota postura estritamente legalista, na medida em que os problemas que enfrenta devem ser resolvidos a partir da lei e conforme o ordenamento jurídico em vigor; do ponto de vista zetético, levará em conta os fatores sociais e econômicos que tornam efetivo o Direito vigente em determinada comunidade. Predomina o enfoque dogmático, por diversas razões, dentre elas: a) a Ciência do Direito é estudada, nas Faculdades, como uma produção técnica, formalista, destinada a atender às necessidades práticas do desempenho das diversas funções profissionais, tais como a do advogado, a do promotor, a do juiz; b) inexiste sociedade sem dogmas, e seria impossível a organização social se a qualquer instante os dogmas fossem questionados, sem que se fixassem aqueles que devem regular o comportamento de determinado grupo; c) enfoque zetético, embora de grande importância para a compreensão do fenômeno jurídico, reveste-se de elevado grau de abstração teórica, ao qual bem menos cultores do Direito se dedicam, dado que o mundo moderno privilegia o aspecto prático das questões jurídicas.” (JCJeJCN).

“Uma introdução ao estudo do direito é uma análise zetética de como a dogmática jurídica conhece, interpreta e aplica o direito, mostrando-lhes as limitações.” (TSFJ).

 Isso tudo aliado ao uso da linguagem: instrumento vital.

“Podemos reconhecer, inicialmente, numa discussão, três componentes fundamentais, que denominaremos orador, ouvinte e objeto da discussão. De um modo geral e abstrato, o orador é aquele que abre a discussão, aquele que propõe a primeira asserção. Sob o ponto de vista do dever de prova, o orador é aquele cuja ação linguística se apresenta com pretensão de autoridade. Esta repousa na compreensibilidade da ação, ou seja, na possibilidade de ser ela apreendida e repetida. Uma ação não compreensível ressente-se de autoridade, o que pode ser medido no sucesso ou no fracasso da aprendizagem por parte do ouvinte. O segundo componente da discussão é o ouvinte. Este pode ser entendido como aquele ao qual se dirige a ação linguística do orador. O terceiro componente da discussão é o objeto. O objeto da discussão é aquilo que se diz, ou seja, uma ação linguística que deve ser compreendida. Envolve, portanto, em termos de reflexividade, objetivos e fundamentos, bem como a sua justificação. O processo reflexivo, aliás, parece, conduzir-nos a uma indeterminabilidade do objeto da discussão, na medida em que despontaria aqui o problema do regresso ao infinito (o porque do porque). Dada a ocorrência de todo discurso numa situação comunicativa dominada pelo dever de prova, o objeto da discussão pode ser determinado como questão. As questões, tendo em vista a reflexividade da discussão, variam em complexidade, conforme elas se componham de uma ou várias ações linguísticas, constituindo uma unidade ou desdobrando-se em uma ou mais alternativas. Distinguem-se quanto à complexidade (numérica), à qualidade (o que é determinado pela reação do ouvinte à ação linguística do orador. Esta reação pode ser ativa no sentido de perguntar, de não sentir-se seguro da autoridade de que goza, em princípio, a ação linguística do orador) ou à função estimativa (distinção entre diferentes modos discursivos). Nesta funda Aristóteles os gêneros retóricos (judiciário, deliberativo, demonstrativo).