segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Concepções de Justiça



                                                 CONCEPÇÕES DE JUSTIÇA
(ÉTICA E DIREITO, Chaim Perelman, tradução Maria Ermantina Galvão, São Paulo, Martins Fontes, 2002).
“É ilusório querer enumerar todos os sentidos possíveis da noção de justiça. Vamos dar, porém, alguns exemplos deles, que constituem as concepções mais correntes da justiça, cujo caráter inconciliável veremos imediatamente:
1.       A cada qual a mesma coisa. Segundo essa concepção, todos os seres considerados devem ser tratados da mesma forma, sem levar em conta nenhuma das particularidades que os distinguem.
2.       A cada qual segundo seus méritos. Eis uma concepção da justiça que já não exige a igualdade de todos, mas um tratamento proporcional a uma qualidade intrínseca, ao mérito da pessoa humana.
3.       A cada qual segundo suas obras. Essa concepção da justiça tampouco requer um tratamento igual, mas um tratamento proporcional. Considera o resultado da ação.
4.       A cada qual segundo suas necessidades. Essa fórmula da justiça, em vez de levar em conta méritos do homem ou de sua produção, tenta sobretudo diminuir os sofrimentos que resultam da impossibilidade em que ele se encontra de satisfazer suas necessidades.
5.       A cada qual segundo sua posição. Eis uma fórmula aristocrática da justiça. Consiste ela em tratar os seres não conforme critérios intrínsecos ao indivíduo, mas conforme pertença a uma ou outra determinada categoria de seres.
6.       A cada qual segundo o que a lei lhe atribui. Esta fórmula é a paráfrase do célebre cuique suum dos romanos. Se ser justo é atribuir a cada qual o que lhe cabe, cumpre, para evitar um círculo vicioso, poder determinar o que cabe a cada homem. Se atribuirmos à expressão “o que cabe à cada homem” um sentido jurídico, chegamos à conclusão de que ser justo é conceder a cada ser o que a lei lhe atribui. Esta concepção nos permite dizer que um juiz é justo, ou seja, íntegro, quando aplica às mesmas situações as mesmas leis. Ser justo é aplicar as leis do país. Tal concepção da justiça, contrariamente a todas as precedentes, não se arvora em juiz do direito positivo, mas se contenta em aplicá-lo. É evidente que essa fórmula admite em sua aplicação tantas variantes quantas legislações diferentes houver. Cada sistema de direito admite uma justiça relativa a esse direito. O que pode ser justo numa legislação, pode não o ser numa legislação diferente: com efeito, ser justo é aplicar, ser injusto é distorcer, em sua aplicação, as regras de um determinado sistema jurídico. E. Dupréel opõe essa concepção a todas as outras. Qualifica-a de “justiça estática”, por ser baseada na manutenção da ordem estabelecida, e lhe opõe todas as outras consideradas como as formas da “justiça dinâmica”, por poderem trazer a modificação dessa ordem, das regras que a determinam. “Fator de transformação, a justiça dinâmica se mostra um instrumento do espírito reformador ou progressista, como ele se autodenomina. A justiça estática, propriamente conservadora, é fator de fixidez.”.

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