quinta-feira, 31 de maio de 2018

IED - 2018.1 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - DL- 4657/42, art. 3º)



O Direito não é pura teoria, mas uma força viva. Todos os direitos da humanidade foram conseguidos na luta. O Direito é um trabalho incessante, não somente dos poderes públicos, mas da nação inteira” (Ihering – A luta pelo direito). Perfeito: o direito é uma ciência social aplicada.
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 Dispõe o Decreto-Lei nº 4.657, de 04/09/1942, art. 3º que: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.”.
Das palavras de André de Carvalho Ramos e Erik Frederico Gramstrup (Comentários à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, São Paulo, Saraiva, 2016, p. 40/41), tem-se que:
“O art. 3º da LINDB trata da alegação de desconhecimento da lei, tida como incabível. Trata-se de uma ficção, mais que presunção de conhecimento geral da lei. Sabe-se bem que, ante a complexidade do sistema jurídico, nem mesmo especialistas e profissionais estão em condições de apreendê-lo em toda sua riqueza e detalhe. Por isso mesmo se cuida de ficção, mantida como pressuposto necessário ao funcionamento do Direito. Caso fosse possível ao súdito da norma escusar-se, alegando que não a conhece, solapada estaria a obrigatoriedade que distingue o Direito em face de outros complexos normativos, tais como os de origem religiosa, moral e de cortesia. A razão da ficção de conhecimento generalizado da lei serve a propósitos de ordem prática, a possibilitar a organização da vida social pelo padrão do Direito. De onde o brocardo antigo: ignorantia legis neminen excusat.
Outras justificativas podem ser acrescentadas, sem a importância da necessidade já mencionada. O fato é que, mesmo sem conhecer a lei em toda minudência, os membros de uma coletividade são capazes de apreender seus princípios e valores básicos. Nas situações ordinárias da vida, é o que basta para conduzir-se sem violação da lei. Caso o sujeito em questão exerça atividade que requeira conhecimento especializado, será razoável exigir que adquira igualmente o conhecimento das normas setoriais aplicáveis àquela atividade; assim, por exemplo, com os exercentes de profissões regulamentadas, com os que exercem atividade empresária e com os que contratam com o Poder Público. Outro exemplo: é exigível que uma pessoa jurídica operadora de engenharia genética conheça as normas de biossegurança. Tudo isso é dito, porém, sem perder de vista que a razão própria e principal da pressuposição de que a lei é conhecida por todos atende a uma necessidade vital do próprio Direito.
Caio Mário da Silva Pereira sustenta que tanto a teoria da pressuposição quanto da ficção é frágil. In verbis: “os juristas modernos  preferiam encarar a realidade e focalizar o problema à luz da verdade objetiva. A lei é obrigatória, a lei tem de ser obedecida, não por motivo de um conhecimento presumido ou ficto, mas para que seja possível a convivência social. A lei é obrigatória por uma razão de interesse da própria vida social organizada. Quando a Lei de Introdução ao Código Civil declara que ninguém se escusa de cumprir a lei, sob a alegação de que não a conhece, está pura e simplesmente proclamando o princípio de que ela é obrigatória para todos, ainda para aqueles que efetivamente a ignoram.
Apesar de acompanharmos o autor quanto à asserção de que a obrigatoriedade da lei impõe-se pela necessidade de harmonia na convivência social, ela apenas conseguiu dar o motivo pelo qual se estabeleceu a ficção de seu conhecimento geral, uma vez publicada. [...]”.
H. Lévy-Bruhl, por sua vez, que trata o direito pelo viés sociológico, no ponto, escrevera: “Os homens têm necessidade de saber como se comportar uns em relação aos outros, mas como saberão, se as regras imperativas a que eles devem ser submetidos variam de um momento para outro? Sem dúvida eles têm a intuição de que essas regras não lhes são estranhas, mas emanam deles próprios – e é essa, aliás, a razão profunda do adágio, segundo o qual – “presume-se que ninguém ignora a lei”. Mas este sentimento geral e vago não basta para guiar os homens no seu comportamento cotidiano. As regras de direito devem ter um mínimo de precisão e de rigidez indispensável à segurança das relações sociais. Elas o adquirem pelo fato de se expressarem em palavras e, nas sociedades modernas, através de fórmula escrita. Mas, daí surge um inevitável conflito entre o caráter estático das normas e o dinamismo da vida. E este conflito dá ao direito, que parece ao profano tão frio e austero, um aspecto dramático e, algumas vezes, até mesmo patético. É apaixonante acompanhar o esforço dos homens para alcançar a justiça, através de fórmulas que, por definição, não poderão realizar plenamente.”

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