sexta-feira, 27 de junho de 2014

Cultura Universal, Popular e de Massas

     A cultura (isto é, a herança social) dos seres humanos é um desenvolvimento de certas tendências evidentes na evolução vertebrada, especialmente a mamífera. Não precisamos invocar, para explicá-la, nenhum elemento sobrenatural. Podemos contentar-nos com dizer que a herança social do homem difere da do animal pelo seu conteúdo incomparavelmente mais rico e pela tendência a enriquecer-se progressivamente. Ela é conhecida em diversos sentidos e dois deles se devem destacar: um popular e outro antropológico. Numerosos são os conceitos sobre cultura. É preciso, no entanto, não confundir essa herança social com a herança biológica. Uma das funções da cultura é permitir-nos viver nossas fantasias, de identificação. Sentimo-nos visados pela cultura, seja ela superior, seja inferior, quando ela interage com nossa própria estrutura imaginária. Com descrevera Freud, "o poeta nos permite desfrutar nossas próprias fantasias, sem censura e sem pudor".  Diante disso, fala-se em cultura popular. Essa expressão pode prestar-se a equívocos. Não significa a intenção de popularizar os grandes modelos culturais; significa, isto sim: primeiro, descobrir, valorizar e desenvolver as criações espontâneas do povo, principalmente no que tange às artes e ao folclore em geral; segundo, democratizar a cultura, no sentido de elevar o povo a um nível de desenvolvimento no qual lhe seja possível participar cada vez mais dos valores da cultura. Com efeito, descreve Sérgio Paulo Rouanet (As Razões do Iluminismo, São Paulo, Cia. das Letras, 1987, p.127), que: "Todos preferem uma cultura autêntica a uma cultura alienada, mas a cultura autêntica pode ser estrangeira, e a cultura brasileira pode ser alienada. Se a cultura é verdadeiramente universal, ela é ipso facto brasileira: Mozart é tão relevante para o Brasil como se tivesse nascido na ilha de Marajó e Sílvio Santos é tão irrelevante como se tivesse nascido em Reikjavik [...] A cultura de massa americana é combatida por ser americana, e não por ser cultura de massa. Inversamente, a cultura de massas brasileira é apoiada pelo mero fato de ser brasileira, por mais alienante que seja. Ora, não me parece que a série infantil He-Man se tornasse menos monstruosa se o herói fosse robusto gaúcho dos pampas, ou falasse com um simático sotaque nordestino. A inteligência não tem pátria, mas a debilidade mental deveria ter: é ela, e não a inteligência, que deve ser considerada estrangeira, mesmo que que suas credenciais de brasilidade sejam indiscutíveis.". Enfim, são essas observações importantes no sentido de preservar a nossa cultura popular sem congelamento, porque cultura é dinâmica; também, sem incorporar de modo acrítico qualquer novidade por bem colorida que seja.

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