sexta-feira, 23 de maio de 2014

Democracia, Tempo, Determinismo, Natureza e Ciência

     Muitos países ocidentais têm que a Democracia é a melhor forma de governo. Isso parece se impor como dado de uma espécie de conhecimento cultural próximo ao senso comum. Todavia, adverte Jacques Rancière, em diversos trabalhos, como, começando por Platão e até pouco tempo atrás, que a Democracia foi associada ao governo da "plebe" ou "gentalha" e que ela foi assim considerada por séculos como o ato de deixar as decisões de governo em mãos da massa sem educação, o que não deixa de ser uma forma de visão pejorativa, infelizmente, reinante em diversos domínios dos saberes.

      Inobstante, há, por outro lado, esquemas mentais mais lúcidos. Assim é que, colhe-se, por paralelo, numa visão profunda de Ilya Prigogine (O fim das certezas: tempo, caos e as leis da natureza - São Paulo: Editora Unesp, 1996, p.14/15), a descrição: "A questão do tempo e do determinismo não se limite às ciências, mas está no centro do pensamento ocidental desde a origem do que chamamos de racionalidade e que situamos na época pré-socrática. Como conceber a criatividade humana ou como pensar a ética num mundo determinista? Essa questão traduz uma tensão profunda no interior de nossa tradição, que se pretende, ao mesmo tempo, promotora de um saber objetivo e afirmação do ideal humanista de responsabilidade e de liberdade. A democracia e as ciências modernas são ambas herdeiras da mesma história, mas essa história levaria a uma contradição se as ciências fizessem triunfar uma concepção determinista da natureza, ao passo que a democracia encarna o ideal de uma sociedade livre. Considerarmo-nos estrangeiros à natureza implica um dualismo estranho à aventura das ciências, bem como à paixão de inteligibilidade própria do mundo ocidental. Esta paixão consiste, segundo Richard Tarnas, em "reencontrar sua unidade com as raízes de seu ser". Pensamos situar-nos hoje num ponto crucial dessa aventura, no ponto de partida de uma nova racionalidade que não mais identifica ciência e certeza, probabilidade e ignorância. [...] Toda inovação conceitual exige uma justificação precisa e deve delimitar as situações em que permite predições novas. [...] Embora este livro seja fruto de décadas de trabalho, estamos apenas no início deste capítulo da história de nosso diálogo com a natureza. Mas o tempo de vida de cada um de nós é limitado, e decidi apresentar os resultados como eles existem hoje. Não é à visita de um museu de arqueologia que o leitor está convidado, mas sim a uma excursão por uma ciência em evolução.".

     Pois bem, disso tudo fica a inferência de que tudo está interligado: natureza, forma de governo, política, direito, tempo, movimento, espaço, etc.  E assim, a solução da crise, pela qual estamos atravessando, passa por uma nova forma de visão a considerar de que há interligação de tudo em tudo, necessariamente, ou seja: não há setores estanques, ainda que, para fins didáticos, seja oportuno algumas divisões momentâneas.

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