sábado, 30 de janeiro de 2016

Hermenêutica e Interpretação; Ética e Moral

     A Professora Karen Katafiasz escreveu (Terapia do professor) que: "A maior das realizações é passar a vida fazendo o que importa. O ensino é importante.". Sendo assim, ao estudioso do Direito - e o professor não deixa de ser, antes de tudo, um estudioso - cabe considerar que a plataforma em que ele assenta é a liberdade e o justo. Daí que o professor orienta, não prescreve comportamentos.Neste domínio temos quatro conceitos polêmicos: hermenêutica, interpretação, ética e moral. Seguindo as lições do professor José Afonso da Silva (Teoria do Conhecimento Constitucional), temos que: Hermenêutica é a arte do entendimento; a hermenêutica constitui uma teoria das ciências do espírito; é a teoria das regras que presidem (...) à interpretação de um texto; a hermenêutica propõe (...) um modelo processual de interpretação; a hermenêutica é o estudo da compreensão, é essencialmente a tarefa de compreender textos. "Vê-se por essas considerações que a hermenêutica é sempre referida à interpretação, uma teoria destinada a construir os fundamentos da interpretação. Cabe a ela elaborar as regras, princípios ou cânones que presidem o fazer interpretativo. [...] Em síntese, a hermenêutica é uma filosofia da compreensão, do entendimento, da interpretação, enfim. Ela é um fazer especulativo e reflexivo sobre as condições especiais do saber; é parte teórica de como chegar-se ao significado e ao sentido de um texto; enquanto a interpretação é a parte prática e operativa: "é a forma explícita da compreensão". "[...] fala-se em 'hermenêutica jurídica' distinguindo-a, assim mesmo, da 'interpretação jurídica'. Para isso, vamos recorrer a dois brasileiros: Carlos Maximiliano, hermeneuta e constitucionalista, e Vicente Rao, civilista aberto aos conceitos fundamentais do Direito. O primeiro conceitua a hermenêutica jurídica como "o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito", enquanto a interpretação consiste em 'descobrir e fixar o sentido verdadeiro de regras positivas; e logo depois, o respectivo alcance, a sua extensão'. Em suma, a hermenêutica é a sistematização das regras que a interpretação aplica para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito.Uma é sistematização, a outra é a aplicação, a execução, do que foi sistematizado.Vicente Rao torna isso bastante claro: 'A hermenêutica tem por objetivo investigar e coordenar por modo sistemático os princípios científicos e leis decorrentes, que disciplinam a apuração do conteúdo, do sentido e dos fins das normas jurídicas e a restauração do conceito orgânico do Direito, para o efeito de sua aplicação; a interpretação, por meio de regras e processos especiais, procura realizar, praticamente, estes princípios e estas leis científicas.". Agora vamos à Ética e à Moral. Júlio Cesar ao responder a indagação - Ética e Moral: qual a diferença? - deixou assentado: "Infelizmente, a etimologia não ajuda a diferenciar "ética" de "moral". Simplesmente a palavra grega ethos significa morada ou costume. A palavra latina equivalente émos, moris, que também significa morada, costume. Qualquer diferenciação entre ética e moral veio, portanto, do uso dessas palavras. No âmbito filosófico, existe o costume (ethos) de definir bem os conceitos para melhor compreensão. Comicamente, esse costume também se aplica a esses termos relativos ao costume: moral significa um conjunto de normas e valores aceitos por um indivíduo ou grupo como corretos (ou seja, os deveres que nos impomos por considerá-los o certo a ser feito). Ética seria o estudo filosófico da moral, a busca pela fundamentação da moral, definir os critérios para decidir entre o certo e o errado. Difícil entender? Talvez alguns exemplos nos ajudem.Um pessoa que tenha pedido um livro emprestado a seu colega, depois de um tempo, vendo que seu colega não cobrou a devolução, decide ficar com o livro para si, ou vendê-lo ou dar a outra pessoa. Qualquer dessas ações seria considerada moralmente má para uma pessoa religiosa (pois fere o mandamento de não roubar), para uma pessoa que afirme o direito de propriedade privada, para alguém que entenda que violar uma lei (roubo é um crime previsto em lei) é sempre ruim ou para uma pessoa que pense que prejudicar alguém não está correto. Percebemos pessoas diferentes condenando o roubo por motivos diferentes. Cada pessoa ou grupo tem suas noções de certo e errado. Umas fundamentam-se na religião, outras no direito, outras nas leis e convenções, outras na regra de ouro. Temos, portanto uma gama variada de "morais", cada qual se fundamenta em noções diferentes de certo ou errado. O filósofo que reflete sobre esse tema poderia levantar uma série de objeções a cada um dos critérios anteriores: se uma ação é boa porque Deus manda, então se Deus mandasse roubar seria justo fazê-lo? Qual a fundamentação racional para considerarmos a propriedade privada um direito inalienável? Será que todas as leis são justas? Em caso contrário, agir contra a lei não seria justo? A ética procura entender se existem razões válidas para definir algo como certo ou errado, se a religiosidade é um bom critério para definir o bem, se observância da lei garante uma ação moralmente boa e evita o mal, se podemos falar em direitos (e valores) universais. Como podemos notar, a ética é uma reflexão sobre a ação moral, sobre o que torna uma ação boa ou má. Por essa razão, muitos chamam a Ética de Filosofia Moral. Seria uma tentação dizer nesse momento que enquanto falamos de várias "morais" só podemos falar em Ética no singular. Isso seria uma meia verdade: vários pensadores trataram da Ética em perspectivas diferentes (há portanto, muitas perspectivas éticas). Mas não seria falso afirmar que cada um dos sistemas éticos que já se teve notícia tentou abarcar a totalidade da ação moral. Tentou ser uma teoria geral da moral. Para desespero de todos aqueles que esperam do filósofo que fale de ética como alguém que "revela" os novos mandamentos (deveres) que devem ser observados nos tempos atuais, ele só pode levantar critérios racionais para ação moral (ou mostrar que certas regras não têm bons critérios). Nenhum filósofo se disporia a pensar no lugar dos outros e afirmar categoricamente o que deve ou não ser feito. Essa é uma tarefa para seres pensantes, que os filósofos esperam ainda existir por aí.". Uma advertência: o estudioso do Direito sabe a diferença do conceito de furto e roubo. É! O leitor mais apressado e menos atento deve estar intrigado porque: hermenêutica e interpretação, ética e moral, juntos? Explicamos: há consenso de que Ética é epistemologia; conhecimento, é a teoria da moral. A moral trata da ação, o executar, o fazer. São conceitos implicados e mesmo assim não se confundem. Um conceito de Ética possível: Ética é o estudo, a busca, a pesquisa dos meios dos conhecimentos adequados para atingir a meta almejada (a ação) em plena liberdade. Assim, com mais calma e pensamento mais aprofundado, é possível perceber que de certo modo tudo o que se disse sobre hermenêutica e interpretação, pode ser aplicado com relação à ética e a moral: Uma é ciência, outra ação; uma é teoria, outra prática. Assim ficam mais claros esses conceitos.

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