sexta-feira, 22 de maio de 2015

A Liberdade Moral

     Uma certa diferença entre o Acadêmico e Jurista consiste em que o Acadêmico é livre e desenvolve a criatividade e o Jurista não é livre no mesmo sentido que aquele, cuja criatividade está limitada. Por liberdade, neste contexto, quero dizer que o Jurista está sob o império da dogmática e o Acadêmico não. Ao Acadêmico é possível atribuir aquilo que costuma denominar liberdade de cátedra. O Jurista está circunscrito aos círculos da ciência, das normas técnicas. Ao Acadêmico é atribuído a chamada moralidade crítica; ao Jurista aquilo que é chamado de moralidade legalizada ou positivada.
     Assim é que, sob esse título, José Renato Nalini (Ética Geral e Profissional, 2ª edição, São Paulo, RT, 1999, p. 62/63), em boa página, descrevera: "Se a liberdade existe, a conduta humana tem significado moral pleno. Se não existe, a pessoa não pode responder por seu comportamento e nem pode, a rigor, ser chamada pessoa.
     A liberdade moral não se confunde com a liberdade jurídica. Esta é faculdade puramente normativa. A liberdade jurídica é mais um âmbito espacial de atividade exterior, que a lei limita e protege. Já a liberdade moral é atributo real da vontade. "A jurídica termina onde o dever principia; a moral é pensada como um poder capaz de traspassar o linde do permitido." (Eduardo Garcia Máynez). Nem se confunda com a liberdade de ação. Esta é mero atributo da decisão. Aquele é capaz de decidir.
     A liberdade humana revela-se, então, como função ontológica da posição que o homem ocupa ante dois tipos de determinação. Na qualidade de ente natural, acha-se casualmente determinado por suas tendências, afetos e inclinações. Como pessoa, é portador de outra determinação, oriunda do reino ideal dos valores. Esta determinação lhe permite eleger finalidades, optar por meios e colocá-los em ação para chegar àquelas.
     Entre causalidade e liberdade inexiste oposição. A liberdade está radicada na autonomia dos princípios. A lei moral é a autolegislação da razão prática dizia Kant. Se o homem se submete às leis que de sua razão promanam, evidente sua liberdade. Há um aspecto falho: a vontade pode dar a si mesma suas normas, mas não se vê forçada a cumpri-las. A pessoa não está inevitavelmente vinculada à exigência ética. Isso conduz às aporias da liberdade moral, examinadas por Hartmann, que conclui ser indemonstrável a liberdade da vontade. É uma questão metafísica, insuscetível de ser demonstrada, ou de ser refutada. Só pode ser discutida.
     Em favor da existência de uma vontade livre, existe a consciência da autodeterminação. Há uma convicção individual de que, diante de determinada situação, a pessoa pode escolher entre fazer e deixar de fazer. A decisão, no caso concreto, depende de cada um.
     É verdade que da consciência da autodeterminação não se infere a autodeterminação da consciência. Mas também não se pode concluir em sentido contrário. Se não existisse liberdade humana, somente se poderia adotar o ceticismo ético e a negação da moralidade. Mas há outro indício de que existe liberdade moral: a existência da responsabilidade.
     A responsabilidade não é é só aparência ou fenômeno. É fato real da vida ética. E quase sempre acompanhada da consciência de culpa. É consequência da ação, filha da violação e testemunho de existência da liberdade. A culpa, diz Hartmann, "irrompe como uma fatalidade na vida humana. O sujeito não pode livrar-se dela. Aparece de súbito, julgadora, negativa, dominante. E o homem não experimenta essa irrupção como algo estranho. Em seu próprio ser há uma instância que o delata. O que na responsabilidade se encontrava já preparado, a situação interna do tribunal ante o qual o indivíduo comparece, encontra na consciência da culpa sua forma mais drástica, sua realidade mais convincente.". 
     Diante dessas afirmativas é possível ter um norte diante do chamado dolo. É que o direito trabalha com esse conceito, a pergunta é: é possível determinar, pela técnica jurídica, a existência ou não do dolo? E a culpa aí tratada é mesma culpa jurídica? 
     Por fim, com o suposta permissão acadêmica, posso interpretar fazer minha observação, que em nada compromete o teor do texto, com relação ao primeiro parágrafo do texto do autor. Interpreto o parágrafo assim: "Se a liberdade existe", eu escreveria: Se a liberdade é; "Se não existe"; eu escreveria: Se não é. Trata-se apenas de uma questão de semântica. É que a palavra existe ou existência, implica matéria, corpo, forma, movimento, lugar no espaço. E o verbo é trata de um estado, uma ideia. Daí a diferença entre essência e existência, cuja pergunta frequente: Deus existe? Respondo: não. Deus é, cuja resposta vem da pergunta feita por Moisés: quem fala? A resposta obtida foi: Sou o que Sou.

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