sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Noções de Justiça

     A análise lógica da noção de justiça parece constituir uma verdadeira aposta. Mesmo assim, há consenso, entre os que debatem o tema,  que o elemento essencial, em todas as noções, justo é tratar todos de forma igual. A igualdade seria a característica essencial. Essa seria a única que se deva levar em conta na administração da justiça. Desde Platão a Aristóteles, passando por Santo Tomás, até os juristas, moralistas e filósofos contemporâneos, todos estão de acordo com esse ponto. E Aristóteles já observara que é necessário existir certa semelhança entre os que seres aos quais se se aplica a justiça. Refletir sobre todas as noções revela-se um trabalho inócuo, mesmo assim, é lícito e possível relacionar, pelo menos, seis noções e sobre elas refletir, quais sejam: lª) À cada qual a mesma coisa; 2ª) À cada qual segundo seus méritos; 3ª) À cada qual segundo suas obras; 4ª) À cada qual segundo suas necessidades; 5ª) À Cada qual segundo sua posição; 6ª) À cada qual segundo o que a lei lhe atribui. Esta última fórmula é a paráfrase do célebre cuique suum dos romanos. Neste caso, ser justo é aplicar as leis do país. Aqui entra a questão da justiça formal e a justiça concreta. Dupréel opõe essa noção a todas as outras; qualifica-a de "justiça estática", por ser baseada na manutenção da ordem estabelecida e lhe opõe todas as outras consideradas como as formas da "justiça dinâmica", por poderem trazer a modificação dessa ordem, das regras que a determinam. Fator de transformação, a justiça dinâmica se mostra um instrumento do espírito reformador ou progressista em que a justiça estática é fator de fixidez - conservadora. Pois bem: "A lª turma do STJ (REsp. 1412704) reformou acordão do TRF da 5ª região que admitiu o acesso de crianças menores de seis anos de idade ao ensino fundamental de Pernambuco. De acordo com o colegiado, o corte etário estabelecido pelo Conselho Nacional de Educação - de 6 anos completos até 31 de março do correspondente ano letivo - não incorre em contexto de ilegalidade, encontrando respaldo nos arts. 29 e 32 da lei 9.394/96. [...] Para o ministro relator, a simples leitura do dispositivo mostra que não há ilegalidade nas resoluções do CNE que impedem o acesso de crianças abaixo desse limite ao ensino fundamental." (Migalhas, 3.562, de 23/02/15). A decisão reformada que admitiu a matrícula de menores de seis anos, acatou a comprovação de capacidade intelectual por meio de avaliação psicopedagógica (prova técnica da realidade). Eis aqui um exemplo de justiça abstrata em oposição à justiça concreta. Sabe-se que a fórmula de aferir a idade, mais razoável, é a mesma em que se mede temperatura, ou seja: 20º não é o dobro de 10°. Essa aferição é adequada se feita por escala. No caso, prestigiou-se a abstração da regra em detrimento da situação concreta. A criança terá sido, de certa forma, prejudicada sem benefícios ao poder público de outro lado. A decisão não considerou a razoabilidade constitucional, a qual exige, na aplicação da regra: "A simples existência de lei não se afigura suficiente para legitimar a intervenção no âmbito dos direitos e liberdades individuais. Faz-se mister, ainda, que as restrições sejam proporcionais, isto é, que sejam "adequadas e justificadas pelo interesse público" e atendam "ao critério de razoabilidade. Em outros termos, tendo em vista a observância do princípio da proporcionalidade, cabe analisar não só a legitimidade dos objetivos perseguidos pelo legislador, mas também a adequação dos meios empregados, a necessidade de sua utilização, bem como a razoabilidade, isto é a ponderação entre a restrição a ser imposta aos cidadãos e os objetivos pretendidos." (STF, Representação 930, Min. Rodrigues Alckmin, in DJ de 2/9/77 e "Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos", Gilmar Ferreira Mendes, São Paulo,1990, p. 48 s.). Vem daí que a generalidade e a abstração constituem apanágio da lei. Esses atributos concorrem para uma maior inteligibilidade da lei, facilitando a sua aplicação a uma universalidade de situações ou de pessoas concretas, donde a simples leitura do dispositivo, como ficou assentado, não atende ao objetivo pretendido.

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