sexta-feira, 18 de julho de 2014

Implicações Práticas da Ética

     John Mitchell Finnis, em (Fundamentos de Ética, Rio de Janeiro, Elsevier, 2012, p. 4/5), adverte que: "ao fazer Ética, a pessoa está em busca da verdade. O que a pessoa gostaria de saber, ou, ao menos, ter mais clareza sobre, é a verdade sobre a questão, sobre o bem, sobre o valor da ação humana, i.e., a forma de viver de alguém enquanto constituída e moldada de acordo com suas escolhas. E, na Ética, no sentido pleno e próprio identificado por Aristóteles, escolher-se buscar a verdade, não apenas "em si mesma" nem simplesmente para se tornar uma pessoa que conhece a verdade sobre determinada matéria, mas (principalmente) para que as escolhas de alguém, suas ações e sua forma de vida completa sejam boas e valham a pena (sendo ainda, por ele, desse modo conhecidas). Dentre as escolhas de uma pessoa, está aquela referente ao engajamento na atividade de busca pelo ético. Seria irracional afirmar que essa escolha não é boa nem valeria a pena, já que, assim como qualquer outra afirmação, ela exigiria justificação, e a identificação de razões que amparassem essa afirmação seria, ela própria, uma instância dessa mesma atividade que teria sido afirmada como não valiosa.
     A alegação de que a Ética não vale a pena ou é carente de embasamento (e, por isso, sequer merece ser considerada) ou é autorrefutatória. (O que acabo de afirmar, por óbvio, não leva a conclusão de que não seja, algumas vezes, inapropriado engajar-se em uma reflexão ética; como veremos, a razoabilidade prática exige mais da escolha de alguém do que simplesmente fazer com que essa escolha esteja orientada para algum bem genuíno, por mais básico que seja).
     Assim, engajar-se em uma investigação ética (em um momento apropriado) significa já ter tido sucesso, em alguma medida, no que se refere à realização da intenção fundamental da pessoa: a sua ação já está participando de um bem que é inegável. Quando uma pessoa envolvida com a Ética realiza uma ação, ela já atinge, parcialmente, aquilo que esperava conseguir realizar ao fim de seu questionamento e da sua reflexão. Dito de modo mais claro, ao escolher fazer ética, a pessoa já realizou uma escolha do mesmo tipo que desejaria ser capaz de fazer ao final do possivelmente longo e árduo programa em que ingressou ao fazer aquela escolha.
     Além disso, a Ética, o seu objeto e as condições nas quais este objeto pode ser alcançado fazem parte, propriamente, da matéria envolvida com a investigação e a reflexão éticas. A Ética é genuinamente reflexiva. Ela pode ampliar a sua compreensão sobre o pleno bem humano ao atentar para o tipo de bem que leva alguém a iniciar um empreendimento ético. Ela pode refutar algumas alegações éticas ou "metaéticas" ao demonstrar que elas refutam-se a si mesmas, já que ela está, explicitamente, consciente do comprometimento intelectual que alguém faz ao assumir qualquer pretensão racional.
     Ela também pode ir do estudo das formas de bem até o estudo acerca das condições nas quais esses bens podem ser razoavelmente perseguidos. Isso porque, se alguém está realizando Ética com consciência do que está fazendo, esta pessoa ira refletir acerca das condições sob as quais os bens diretamente relevantes na investigação ética devem ser (apropriadamente) perseguidos. A pessoa ira observar, ademais, que essas condições  relacionam-se não apenas com uma compreensão acerca da apropriada e inapropriada ocasião para engajar-se no estudo ético (ou qualquer outro), mas também uma compreensão sobre as virtudes humanas exigidas para qualquer tarefa intelectual bem-sucedida: sinceridade, uma mente aberta, coragem para mantar a mente aberta quando diante de pressões e compulsões internas e externas, autodisciplina, entre outras virtudes presentes em um catálogo de aspectos desejáveis do caráter humano.
     Por fim, considerando-se que as verdades que serão discernidas e clarificadas ao se realizar Ética representam tudo aquilo pelo qual alguém está mais profundamente interessado, a pessoa poderá ver-se confrontada pela escolha entre a felicidade para com a verdade (mesmo quando se dê conta de que ela irá desapontar as esperanças e desejos de outrem) e a preferência por outros desejos e a sua satisfação...; e a experiência de se confrontar com essas alternativas abertas, e escolher (digamos) a fidelidade para com a verdade, pode representar um exemplo paradigma de escolha livre e de como nossa liberdade de escolha persiste como uma virtude (ou um vício) e, assim, acaba constituindo a pessoa particular que, de fato, nos tornamos.". Pois bem, sendo assim, no filme "Palavras", há uma passagem que expressa: "Todos nós fazemos escolhas. O difícil é conviver com elas. E ninguém pode nos ajudar." De modo que, voltando ao início do texto, podemos entender o que quer significar a expressão que, ao fazer Ética, a pessoa está em busca da verdade. É que, às vezes, essa verdade buscada, pode não ser a querida.

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