quarta-feira, 18 de setembro de 2013

O Devido Processo Legal

     Claudia de Lima Marques ao prefaciar o livro de Ricardo Luis Lorenzetti (Teoria da Decisão Judicial, 2ª edição revista, Revista dos Tribunais) anotara que: "A experiência jurídica não se esgota na lei. Cada vez mais, a exata apreensão sobre o que é o direito depende de uma profunda compreensão da jusrisprudência (...) e da doutrina (...), representativa da elaboração científica daquilo que é jurídico. No cerne do problema está o modo como se dá a decisão jurídica. Ou seja, como se realiza a decisão sobre o que é ou sobre o que deverá se tornar direito, tarefa esta que respeita não apenas ao juiz, mas também ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo.". 

     Anotara, ainda, que: "Sempre renovador, o autor inicialmente destaca as tensões que se produzem em face do apego excessivo à justiça formal, ou seja, tal qual se apresenta a partir da lei, e a justiça material, entendida como as exigências de solução adequada do caso concreto.".

     Gregório Robles (O Direito como Texto, Manole, 2005, p. 3), ao referir-se às decisões judiciais, com ênfase na teoria comunicacional do direito, anotara que: "Os atos de fala capazes de gerar texto novo são as decisões jurídicas. O direito se produz pela força da decisão. Sem decisão não há norma nem instituição, não há vida jurídica. Portanto, a decisão, frequentemente menosprezada pela teoria do direito, deve ocupar o lugar que lhe cabe: nada menos que o de criar o texto jurídico. A decisão é o elemento dinâmico do direito.".

     Giorgio Agamben (Estado de Exceção, Boitempo, 2004, p. 61/63), expressara que: "O conceito de aplicação é certamente uma das categorias mais problemáticas da teoria jurídica, e não apenas dela. A questão  foi mal colocada devido à referência à doutrina kantiana do juízo enquanto faculdade de pensar o particular como contido no geral. A aplicação de uma norma seria, assim, um caso de juízo determinante, em que o geral (a regra) é dado e trata-se de lhe subsumir o caso particular (no juízo reflexivo) , em contrapartida, o particular é dado e trata-se de encontrar a regra geral). Ainda que Kant estivesse, de fato, perfeitamente consciente do caráter aporético do problema e da dificuldade de decidir concretamente entre os dois tipos de juízo (sua doutrina do exemplo como caso de uma regra não é possível enunciar é a prova disso), o equívoco, a qui, é que a relação entre caso e norma apresenta-se como uma operação meramente lógica.
     Mais uma vez, a analogia com a linguagem é esclarecedora: na relação entre o geral e o particular (mais ainda no caso da aplicação de uma norma jurídica) não está em questão apenas uma subsunção lógica, mas antes de tudo a passagem de uma proposição geral dotada de um referente puramente virtual à referência concreta a um segmento de realidade (isto é, nada menos que o problema da relação atual entre linguagem e mundo). Essa passagem da langue à parole, ou do semiótico ao semântico, não é de modo algum uma operação lógica, mas implica sempre uma atividade prática, ou seja, a assunção da langue por parte de um ou de vários sujeitos falantes e a aplicação do dispositivo complexo que Benveniste definiu como função enunciativa e que, com frequência, os lógicos tendem a subestimar. No caso da norma jurídica, a referência ao caso concreto supõe um 'processo' que envolve sempre uma pluralidade de sujeitos e culmina, em última instância, na emissão de uma sentença, ou seja, de um enunciado cuja referência operativa à realidade é garantida pelos poderes institucionais.
      Uma colocação correta do problema da aplicação exige, portanto, que ela seja preliminarmente transferida do âmbito lógico para o âmbito da práxis. Como mostrou Gadamer (1960, p. 360, 395), não só toda interpretação linguística é sempre, na realidade, uma aplicação que exige uma operação eficaz (que a tradição da hermenêutica teológica resumiu na fórmula colocada em epígrafe por Johann A. Bengel em sua edição do Novo Testamento: te totum applica ad textum, rem totam applica ad te);mas, no caso do direito, é perfeitamente evidente - e Schmitt estava em situação privilegiada ao teorizar tal evidência - que a aplicação de uma norma não está de modo algum contida nela e nem pode ser dela deduzida, pois, de outro modo, não haveria necessidade de se criar o imponente edifício do direito processual. Como entre a linguagem e o mundo, também entre a norma e sua aplicação não há nenhuma relação interna que permita fazer decorrer diretamente uma da outra.".

     Assim, diante dessas abordagens, clara está a implicação entre o direito material (a coisa) o direito processual (o como se dá a coisa), a linguagem (como veículo de expressão das idéias que se tem da coisa e da forma como se dá a coisa a alguém por direito).e a sentença ou decisão. Eis, então, o que se pode dizer :devido processo legal, que é entregar a coisa devida na forma devida. 

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