domingo, 17 de setembro de 2017

Discurso Semiótico e Pensamento Lógico

     "Os limites da minha linguagem denotam os limites do meu mundo.” ( Ludwig Wittgenstein).
     Assim, Alaôr Caffé Alves escrevera em (LÓGICA - Pensamento Formal e Argumentação), o texto sob o título acima, que vale a pena transcrever tendo em vista a importância aos profissionais do Direito: "Para adquirir o saber necessita o homem de um instrumento especial que é a razão. [...]O estudo da razão, de modo mais estrito, do ponto de vista da forma do pensamento e de seu uso no conhecimento, ou como meio de chegar-se à demonstração da verdade, é o que se chama Lógica. Seu objeto é o pensamento lógico. [...] Antes de continuarmos o exame da questão da abstração e da generalização de forma mais singular, cumpre abrir um parêntese para passar rapidamente sobre a questão do discurso semiótico no que respeita às suas dimensões sintáticas, semânticas e pragmáticas. A dimensão semântica implica a construção de frases cujas palavras tenham alguma correspondência com o mundo e principalmente que atendam às regras de uso dentro de determinada comunidade linguística. Por isso, se dissermos "algimar tu si bonta" nada significamos, pois é expressão meramente sonora sem nenhum significado semântico, uma vez que não corresponde a nada do mundo e não observa nenhuma regra de uso de alguma comunidade linguística (suponho). É uma expressão ininteligível, que não pode ser verificada na realidade; não pode comportar valor de verdade, isto é, não pode ser nem verdadeira, nem falsa.
     Entretanto, para se ter o sentido de uma frase é preciso ir mais além de seu conteúdo semântico; é preciso buscar seus nexos sintáticos. Cumpre sublinhar o seguinte: para que um enunciado (interpretação) adequado, isto é, não basta a relação de correspondência entre os nomes que o compõem e a realidade a que se referem ou a observância das regras de uso dos respectivos vocábulos; é necessário que a relação sintática do enunciado também obedeça às regras de construção apropriadas, de conformidade com o código da língua na qual o expressamos. Exemplo disto é a distorção do enunciado "o direito é conduta normatizada coercitivamente" na seguinte expressão: "coercitivamente direito normada é conduta o" (!!!). Note-se que as palavras são as mesmas e são semanticamente identificáveis, mas não há, conforme as regras da língua, ordem sintática entre elas, o que determina também um sem-sentido, isto é, um sem-sentido sintático (além do possível sem-sentido semântico, como visto acima).
     Naturalmente um sem-sentido não pode ser candidato a exprimir a realidade, ou seja, a verdade (ou a falsidade), visto que é ininteligível precisamente em razão da própria estrutura do enunciado, que nada diz, e não em razão do mero desconhecimento da realidade mesma. Deste modo, o que não tem sentido não pode pretender ser verdadeiro. Toda verdade pressupõe um sentido (significado). Antes que possamos designar ou denotar alguma coisa é preciso compreendê-la.
     O significado não é a verdade, mas é a condição para um pensamento verdadeiro. Primeiro, há que se entender o que se diz no discurso, para depois verificar-se se o que se entende está ou não correspondendo a alguma realidade (verdade). Por essa razão, é possível falar-se coerentemente e longamente sobre determinado assunto, sem que com isso se possa dizer que ele corresponde a alguma realidade. O exemplo mais expressivo dessa questão é o do texto de um romance ou de uma novela policial, criados imaginariamente, sem correspondência alguma com o mundo real. Isto quer dizer que podemos dizer expressões verbais com sentido sem que elas sejam verdadeiras, mas não podemos dizer expressões verbais verdadeiras sem que tenham algum sentido. Vale dizer que o sentido e a verdade nem sempre coincidem. Mas, o sentido é a condição de possibilidade da verdade. Sem sentido não há verdade.
     É por isso que um enunciado, ao observar, adequadamente as regras semânticas e sintáticas, tem a possibilidade de ser verdadeiro ou falso, ou seja, pode ter um valor de verdade. E ele só pode ser verdadeiro se puder, em outra situação, ser também falso; ou que se possa pensar (imaginar) uma situação que descreva algo do mundo oposto ao que o enunciado diz. Se o sentido de uma expressão verbal (enunciado) coincidisse sempre com a verdade, não seria possível mentir, visto que tudo o que falássemos com sentido seria necessariamente verdadeiro. Alguns políticos teriam que ficar mudos!
     Por outro lado, há uma função (dimensão) pragmática no processo semiótico de atribuição de sentido a um determinado enunciado. A função pragmática, ou seja, a relação de sentido da frase com o seu usuário, deve ser adequadamente compreendida, conforme as regras de uso da comunidade linguística, pelo ouvinte ou a quem ela é endereçada. Neste caso, o enunciado e seu significado sintático-semântico passa a ser um instrumento de ação (a fala e seu propósito) do sujeito emissor. É possível, em determinadas situações, que o receptor da mensagem compreenda o significado lógico-semântico do enunciado, mas não compreenda a intenção do emitente, isto é, o seu lado pragmático. Por exemplo, à mesa dizemos a uma pessoa: "veja o sal, por favor". E a pessoa diz "pois não, eu estou vendo" (!!!). Neste caso, é óbvio que a pessoa não entendeu a mensagem, na circunstância contextual dada.
     Observa-se que as dimensões semântica e pragmática do discurso referem-se, respectivamente, à relação das palavras (signos) com a realidade a que se referem, buscando-se seu significado material (conteúdo significativo), e à relação das palavras com seus usuários, buscando-se sua utilidade ou seu sentido pragmático. A linguagem, nestas dimensões, como semântica e pragmática do discurso, não é objeto específico de estudo da Lógica Formal. Isto precisamente porque, naquelas hipóteses, ela está vinculada ao mundo da realidade e da experiência circunstanciadas daqueles que praticam o discurso. Esta é uma questão importante para avaliar, por exemplo, o discurso jurídico, uma vez que este discurso deve se ajustar, para ter eficácia e eficiência, às circunstâncias dos fatos ou das pretensões em litígio. A Teoria da Argumentação, como teoria do discurso teórico, é que dá conta do discurso ético. Entretanto, como iremos ver, essa teoria do discurso prático, embora se refira à vontade (decisão) dos agentes envolvidos, não prescinde da estrutura formal do pensamento, destacando a importância da Lógica Formal para o entendimento dessa teoria e para as práticas discursivas do mundo moral, dentre as quais encontra-se o direito.
     À Lógica Formal interessa a dimensão sintática, isto é, aquela que diz respeito à relação do signo com outros signos, no que respeita a sua posição no discurso, como sujeito ou predicado, como membros de enunciados complexos alternativos ou conjuntivos, como antecedentes e consequentes nos enunciados hipotéticos (condicionais) etc..
     É preciso tomar cuidado em não entender cada dimensão acima referida como algo autárquico, como se fosse possível uma dimensão separada da outra. Na verdade, um ato de fala pressupõe sempre, de modo integrado e orgânico, as três dimensões, a sintaxe, a semântica e a pragmática, que só podem ser destacadas de forma analítica, de forma abstrata, para efeito de estudos e pesquisas.".
     É como se diz: 26 letras e infinitas histórias. Assim espero ter trazido algo que possa contribuir aos que se dedicam a realizar ações construtivas fazendo uso da linguagem. É estes passos apontados são fundamentais para o êxito na transmissão da mensagem almejada.

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