domingo, 21 de fevereiro de 2016

A Sentença. A Liberdade. O Cérebro

     Ricardo Luis Lorenzetti escreveu (Teoria da Decisão Judicial, RT, 2009), que: 1º) "A experiência jurídica não se esgota na lei."; 2º) "A paixão pelo direito leva-se por toda a vida."; 3º) "Chegando aos quarenta anos escrevi um livro de problemas e formulação de perguntas corretas (Fundamentos do direito privado). Agora, chegando aos cinquenta anos, me atrevo a formular as possíveis respostas, ampliando o campo de visão para mais além dos temas jusprivatistas, ainda que sem abandoná-los totalmente. Em nossa cultura jurídica não é o habitual, já que se estudam a lei e a jurisprudência de maneira estática, é dizer, como uma descrição do sistema de direito. Essa atitude é diferente daquela de quem compreende que o direito é uma ferramenta para resolver problemas, e, portanto, descreve os conflitos e os modos de resolvê-los. Implica em conceber o direito como um discurso jurídico que é parte da razão prática."; 4º) "A ideia, então, é discutir o modo como se raciocina juridicamente, em vez de se dar uma definição para cada problema.". John R. Searle, em conferências proferidas em Paris, no início de 2001, a convite da Universidade Pris-Sorbone e da Unité de Formation et de Recherche, dentro das atribuições do seminário da equipe de recepção, de filosofia e sociologia - "Racionalidades contemporâneas" -, por iniciativa de Pascal Engel, das quais resultou (Liberdade e Nurobiologia), explicou: 1º) "[...] a peculiaridade da filosofia: para resolver um problema, é preciso inicialmente resolver uma série de outros problemas."; 2º) "Mostrei que a solução filosófica do problema tradicional da relação entre mente e corpo consiste em destacar que todos os nossos estados conscientes são características superiores ou sistêmicas do cérebro, embora sejam, ao mesmo tempo, causados pelos microprocessos inferiores que se produzem no cérebro. No plano do sistema, temos a consciência, a intencionalidade, as decisões e as intenções. No plano micro, temos os neurônios, as sinapses e os neurotransmissores."; 3º) "É preciso um exemplo para explorar as diversas hipóteses. Tomemos o exemplo célebre do julgamento de Páris. Ele foi intimado por três belas deusas, Hera, Afrodite e Atenas, para deliberar e decidir qual, entre as três, receberia a maçã de ouro que os deuses destinavam à mais bela. Páris não determina seu julgamento pela beleza das deusas, mas em função das recompensas que cada uma prometia. Afrodite prometeu-lhe que ele possuiria a mais bela mulher do mundo; Atenas assegurava-lhe que conduziria os troianos à vitória contra os gregos; e Hera ofereceu-lhe ser rei da Europa e da Ásia. O importante aqui é que a decisão decorra de uma deliberação. Páris não reagiu espontaneamente. Suponhamos igualmente que ele tenha operado no espaço que constitui o intervalo: ele tem consciência de uma série de escolhas que lhe são oferecidas e sua decisão não é movida nem pelo desejo, nem pela cólera, e tampouco pela obsessão. Após deliberação, ele toma uma decisão racional. Arthur Schopenhauer (O Livre Arbítrio, Ediouro, sem data), anotou: 1º) "O universo concebido como ilusão, como fenômeno cerebral, não sendo verdadeiramente real tudo o que percebemos; a vida humana tomada como uma simples repetição; o progresso tido como equívoco; a individualidade acoimada de fatuidade; a criação apresentada como vulgar miragem; o futuro como sentido vago; o tempo como fantasma; os fastos da história como eterna mesmice; o caráter como imutável; a vontade cega. alógica, inconsciente... Seria possível assentar em bases desse jaez, com a renúncia de todo querer e a extirpação da vontade individual um sistema filosófico? Schopenhauer demonstrou essa possibilidade."; 2º) "Com efeito, existe outra verdade de fato atestada pela consciência, da qual até aqui deliberadamente não me ocupei, a fim de não interromper o curso do que tratamos. Esta verdade consiste no sentimento perfeitamente claro e seguro de nossa responsabilidade moral, da imputação e nós mesmos dos nossos próprios atos; tal sentimento repousa nesta indefectível convicção de que nós mesmos somos os autores das nossas ações. Por esta íntima convicção. a ninguém vem à lembrança, nem mesmo a quem esteja perfeitamente persuadido da necessidade da concatenação de nossas ações, alegar esta necessidade em abono de qualquer transvio, deitando a culpa sobre os motivos que o induziram a agir, se bem seja acertado que, uma vez aqueles presentes em campo, a sua ação deveria produzir-se de modo inevitável."; 3º) "Já havíamos visto como toda ação humana é produto de dois fatores: o caráter individual e o motivo. Isto, todavia, não significa que ela seja um meio termo, localizado entre o motivo e o caráter; antes, ela satisfaz plenamente tanto um como outro, fundamentando-se, em toda a sua possibilidade, sobre ambos ao mesmo tempo; porque, convenhamos, é necessário que a causa ativa possa agir sobre tal caráter, e que esse caráter seja determinado por aquela causa enunciada."; 4º) "Toda coisa age de acordo com a própria natureza; e sua natureza se manifesta precisamente por meio das suas extrinsecações ativas, debaixo do impulso dos motivos."; 5º) "Todo homem apenas faz o que deseja e, portanto, age sempre de modo necessário.". Segundo John R. Searle: "O problema do livre-arbítrio consiste em indagar se os processos conscientes do pensamento que se produzem no cérebro - os processos que constituem nossas experiências do livre-arbítrio - são realizados no âmago de um sistema neurobiológico que é totalmente determinista.". Disso tudo é possível imaginar que a questão lançada ainda está longe de conclusão. Assim, temos, pelo CPC-1973, art. 162, § 1º, que: "Sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa.". Já o CPC-2015, optou por não conceituar sentença. Um coisa parece certa: a sentença é um ato extremamente complexo, que passa por inúmeras variantes até ser concluída, onde a racionalidade e a liberdade formam a plataforma para a própria elaboração. Talvez por essas e outras é que ela dificilmente consegue agradar a todos. Via de regra, acaba por desagradar a todos por várias perspectivas consideradas. De qualquer forma é uma tarefa que cabe aos estudiosos se ocupar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário